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Os desafios da saúde mental na juventude: "Sentia-me perdida. Acabei por me isolar e ter pensamentos negativos"
Aos 15 anos, Manuela Reis começou a sentir-se perdida, sem rumo e acabou por se isolar. Foi a família que percebeu que algo não estava bem. Foi então diagnosticada com depressão. Uns anos mais tarde, enfrentou um burnout. Agora, aos 21 anos e a trabalhar na sua paixão, a maquilhagem, partilha nas redes sociais a caminhada que tem feito na luta por uma melhor saúde mental.
Quando é que sentiste que não estavas bem?
Nessa altura decidiste procurar ajuda, falar com alguém sobre o que sentias?
Que idade tinhas na altura?
Nessa altura houve medicação?
Apesar de teres melhorado, já voltaste a ter momentos mais em baixo?
Como te sentias nessa altura? Como foi perceber o que estava a acontecer e lidar com o diagnóstico de burnout?
Quando começaste a ter os primeiros sintomas, aos 15 anos, houve quem achasse que era “coisa da adolescência”?
Agora usas as redes sociais para promover o teu trabalho como maquilhadora, mas não só. Também falas sobre saúde mental. Como é que isso acontece?
Esses vlogs foram ótimos para mim, porque consigo realmente ver a minha evolução. Mas acabaram por chegar a muita gente, a pessoas que estavam a passar por situações parecidas. Comentávamos, falávamos e, de alguma forma, fomos apoio uns dos outros. Para mim foi incrível, porque, mesmo não tendo tido muita visibilidade, sinto que chegaram às pessoas certas.
Desde pequenina que sempre senti que era uma pessoa mais ansiosa. Comecei a sentir esta questão da saúde mental mais na altura da pandemia. Foi uma fase bastante complicada para mim, porque ficámos fechados em casa e eu estava no secundário. Foi um acumulado de situações: a pandemia, o facto de não saber que curso queria seguir, acabar por escolher o errado e não ter capacidade para sair de lá. Depois, tive também um relacionamento tóxico, que não ajudou em nada. Sentia-me um bocado perdida e, apesar de ter muito apoio dos meus pais, sentia que ninguém me entendia. Acabei por me isolar e ter pensamentos negativos. Não sabia o que queria da minha vida, sentia-me insegura, não sabia o que pensar nem como agir. Foi uma altura de muitas indecisões e incertezas. Não foi uma fase fácil.
No início fechei-me muito, porque nunca fui uma pessoa de chamar atenção e achava que ao falar sobre isso com alguém, podiam pensar que eu queria fazê-lo. Então, nos primeiros tempos, isolei-me. Mas a minha mãe começou a perceber e senti que tinha de falar com ela. Desde o início, ela quis ajudar-me e fomos à procura de uma psicóloga. A partir daí comecei a ser acompanhada e as coisas começaram a melhorar um bocadinho.
Tinha 15 anos.
E como foi começar a ir à psicóloga? Sentiste que ajudou?
Como eu era menor de idade, a psicóloga falou comigo e também com a minha mãe, para tentar perceber de onde vinham as coisas. Ela foi uma grande ajuda, porque eu falava com ela sobre tudo. Diagnosticou-me com indícios de depressão e explicou que há pessoas que já nascem com uma tendência mais negativa, mais ansiosa ou mais depressiva e que eu era um desses casos. Por eu ser menor, ela não quis diagnosticar uma depressão severa, mas disse à minha mãe que eu sofria de ansiedade e que, se não fosse acompanhada, poderia evoluir para algo mais grave.
Sim. Fui medicada, não só para conseguir dormir à noite, porque eu não conseguia, mas também para ter energia durante o dia, porque sentia que não era capaz de me levantar da cama. Não queria fazer nada. Apesar de eu não ser fã de tomar medicação, foi essencial naquele momento.
Sim. Depois desse momento, o meu relacionamento acabou, o que foi ótimo para mim, mas passado algum tempo o secundário terminou e comecei a procurar trabalho. Decidi não ir para a faculdade, porque foi aí que percebi que queria ser maquilhadora. Comecei a trabalhar para conseguir sustentar-me e investir no meu curso e no meu kit de maquilhagem. Foi aí que a ansiedade voltou a aparecer. Trabalhei em algumas lojas e depois entrei numa empresa de maquilhagem, onde maquilhávamos a tempo inteiro. Evoluí muito como profissional, mas saí de lá com um burnout, porque passei por muitas situações complicadas.
Comecei a notar alguns sintomas que já tinha tido antes. Voltei a não querer levantar-me da cama, saía de casa em cima da hora e, muitas vezes, chegava atrasada porque não tinha vontade. Houve dias em que estava na paragem do autocarro e pensava se devia ou não apanhar o autocarro para ir trabalhar. Chegava ao trabalho e chorava porque não queria estar ali. Voltei a ter muitos sintomas daquilo que já tinha vivido.
Quando isso começou a acontecer, uma das minhas amigas mais próximas disse-me: “Manuela, tens de procurar ajuda.” A minha família também insistiu. Acabei por ligar para a Saúde 24, porque o meu centro de saúde estava cheio e não havia espaço para consultas de psicologia. A Saúde 24 indicou-me o Instituto Português do Desporto e Juventude, e foi incrível, porque até aos 30 anos eles têm consultas gratuitas de psicologia. Voltei a tomar medicação, fui diagnosticada pela minha médica de família e ajudou-me a encontrar a psicóloga que me acompanha até hoje.
Sim. Foi muito difícil, porque, embora a minha família sempre tenha sido compreensiva, as pessoas à volta diziam muito “isso passa com o tempo”, “é normal”, “os adolescentes são assim”, “vai acontecer a toda a gente”. Era algo muito desvalorizado pelas pessoas e sinto que, até hoje, ainda é assim.
Comecei a fazer vídeos na altura em que estava de baixa psicológica, uma espécie de vlogs (vídeos em forma de diário). Inicialmente, a ideia não era chegar a alguém, mas sim registar a minha evolução: ver como eu estava e como estou hoje. Comecei, portanto, a gravar esses vídeos para, um dia, poder olhar para trás e perceber o meu progresso.