Os homens das verdadeiras barbas brancas
Ser um Pai Natal a sério no Inverno implica começar os preparativos no Verão. Logo em Julho, Severino Moreira arruma a máquina de barbear e começa a cuidar dos pelos que originarão umas longas e fofas barbas brancas.
"Tenho sempre muito cuidado, lavo-a todos os dias e perfumo-a com óleo para bebés", explicou à Agência Lusa.
Este Pai Natal, de 53 anos, senta-se diariamente (entre os dias 17 de Novembro e 24 de Dezembro) seis horas na grande poltrona vermelha da "Casa do Pai Natal" do centro comercial Colombo, em Lisboa Reformado prematuramente, há já uma década que veste o fato vermelho e branco e atende os pedidos das crianças em vários estabelecimentos comerciais.
Pais e filhos fazem fila para tirar a tão aguardada fotografia e pedir os presentes ao senhor barrigudo que a tradição diz vir da fria Lapónia (Finlândia).
A Joana Rita, de sete anos, aguarda ansiosa pela sua vez de tirar a fotografia com o Pai Natal. É a segunda vez, este ano, que espera na fila para pedir uma máquina de fazer pipocas.
Depois de uns cinco minutos sentada ao colo de Severino, sai satisfeita com a conversa. "Disse-me para esperar pela noite mágica", conta, com um sorriso.
"Para se ser Pai Natal é preciso desempenhar a função com gosto, um verdadeiro Pai Natal não se limita a sorrir para a fotografia, fala com as crianças, ouve-as", explica Severino Moreira.
Nos dias de maior azáfama chega a tirar cerca de um milhar de fotografias, o que significa que passaram pelo seu colo à volta de 1.000 crianças em apenas seis horas.
Um osso do ofício são os puxões frequentes a que os miúdos não resistem para se certificarem que as barbas são verdadeiras.
Mas se um Pai Natal ri a maior parte do tempo, Severino também já chorou no seu papel com alguns pedidos inesperados que lhe fizeram.
"Lembro-me que uma criança me disse que não queria presente nenhum no Natal, apenas que levasse ao pai, que falecera, um beijinho" afirma, recordando também uma outra que lhe pediu um medicamento para o pai não dizer tantas asneiras.
O Daniel, a Margarida, a Ana Isabel e a Beatriz, que acabam de entregar a Severino um desenho feito num dos ateliers que circundam a "Casa do Pai Natal", já fizeram a sua lista de presentes e asseguram que os merecem: "Portámo-nos muito bem este ano", garantem em coro.
Uma trotinete, uma televisão, uns ténis "com rodinhas", um jogo para o Game Boy são alguns dos presentes encomendados. O Daniel, de oito anos, pediu também "um pouco de juízo".
Quando questionados sobre as actividades do Pai Natal durante o resto do ano, a resposta das crianças é peremptória: "Esta época é muito atarefada e portanto o resto do ano aproveita para descansar e fazer os presentes para o ano seguinte".
Depois da quadra natalícia, quando retira a pesada barriga artificial, a única coisa que é falsa na indumentária, Severino Moreira dedica-se ao teatro amador, a pequenas participações em televisão e faz campanhas publicitárias, tendo já desempenhado o famoso "capitão iglo".
Antes de cortar a barba, no dia 24 de Dezembro à noite, depois de jantar, Severino cumpre o ritual de percorrer o bairro onde reside para entregar presentes às crianças da vizinhança.
"Faço-o com muito gosto, a alegria das crianças quando me vêem não tem preço", concluiu.
Outro Pai Natal que leva muito a sério o papel de divertir os mais pequenos é Fernando Montenegro, 73 anos, que veste a pesada indumentária de veludo vermelha e branca há 12.
Habituado a lides natalícias desde a infância dos filhos, começa por ajeitar pequenos livros e encher a cesta que tem ao lado da sua poltrona, no El Corte Inglês de Lisboa, de rebuçados para as crianças que o visitam.
Na oficina do Pai Natal desarrumada pelos quatro duendes que com ele coabitam diariamente, abundam dezenas de cartas.
"Olá meu querido Pai Natal! Espero que tu tenhas achado que eu me tenha portado bem este ano. Na escola espero passar de ano e para o natal quero um Consola Nintendo e muitas mais coisas que não cabem aqui", escreveu a Bruna de nove anos.
Para Fernando Montenegro, as crianças são muito mais desenvolvidas do que há uma década atrás: "Pedem-me coisas que nem sei o que são", explica.
Habituado a representar, ficou sem palavras quando uma criança lhe perguntou porque é que ele não dava presentes a todas as crianças.
"Embaraçado, respondi que se extraviavam e algumas não cabiam no correio".
Também no seu caso, a barba faz a diferença. Mas começa a prepará-la mais cedo que o seu colega Severino. "A partir de Março deixo-a crescer, e lavo-a com champoo", sublinha.
São as barbas de um ofício onde os pelos fazem a diferença e é preciso saber esperar, como faz quem acredita no Pai Natal.
ZSP/AMN.
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