Padre pelo sim está "possuído pelo diabo", dizem populares

Populares das paróquias de Lordosa e Ribafeita, concelho de Viseu, dividem-se nas opiniões sobre a atitude do padre Manuel Costa Pinto, que assumiu que votará "sim" no domingo, com os mais radicais a consider arem que está "possuído pelo diabo".

Agência LUSA /

Na quarta-feira, o padre - que não tem paróquia atribuída mas realiza m issas quando lhe pedem, nomeadamente em Lordosa e Ribafeita - justificou o voto no "sim" com a necessidade de acabar com a humilhação das mulheres em tribunal e o "verdadeiro infanticídio" a que obriga a lei actual.

"Mas que anda esse homem a fazer na Igreja? Só pode ter expulsado o Esp írito Santo e admitido o diabo para chegar a esse ponto", disse à Agência Lusa, visivelmente revoltado, Domingos Alexandre, de 70 anos, que costuma assistir à m issa do padre em Ribafeita.

Domingos Alexandre admite que a Igreja deve ser tolerante e perdoar, ma s considera que "há pecados que não têm perdão e o que ele disse foi horrível".

"É um segundo rei Heródes, é um matador de inocentes. E ainda por cima é um homem da Igreja", frisou, dizendo-se surpreendido com esta posição do padre , a quem nunca teve "nada a apontar" até hoje, quando tomou conhecimento das sua s posições.

Por isso, não hesita em defender que "deve ser expulso da Igreja".

As polémicas afirmações do padre, que já chegou a estar suspenso 17 ano s por ter defendido o casamento dos padres, numa obra que escreveu no início da década de 70, foram o assunto da tarde de um grupo de mulheres frequentadoras da Igreja.

Maria Ester Boloto, de 73 anos, considera que "o padre Manuel deve esta r possuído pelo diabo" e, por isso, não o quer mais na paróquia de Ribafeita, "u ma terra muito religiosa, a terra da Madre Rita Amada de Jesus (beata)", cuja me dalha traz ao peito numa corrente.

"Quem for religioso tem de o ser até ao fim. Ele está a dar maus exempl os, devia era dizer que apelássemos ao `não`. Na Alemanha, onde o aborto foi leg alizado já não há crianças, só pretos. Querem que Portugal fique igual?", questi onou.

Maria Ester Boloto disse que as pessoas com quem falou durante a tarde "estavam muito revoltadas", porque "não contavam que ele dissesse uma coisa dest as".

Em Lordosa, os populares mostraram reacções mais moderadas em relação à s declarações feitas pelo padre, até porque ele já tinha assumido a sua posição durante uma missa na paróquia, há algumas semanas.

"Fiz mal, sei que foi um erro ter dito que votava `sim` durante uma mis sa. Mas estava a falar da misericórdia de Deus, em Jesus ter perdoado mesmo a mu lher adúltera e saiu-me, espontaneamente", contou hoje à Lusa o padre Manuel Cos ta Pinto.

Referiu que, logo nesse dia, houve pessoas que se manifestaram na sacri stia, nomeadamente um homem que comentou "isto não é próprio de um padre" e, dep ois disso, já algumas mulheres lhe disseram que iam rezar por ele.

"Eu estava na missa em que ele disse isso e não fiquei chocado, mas vi logo que muita gente que ia reclamar", disse Arlindo Duarte, de 61 anos.

Defende que "os padres também devem ter opinião e depois cada católico vota como quiser".

"Só disse que ele votava `sim`. Não disse para toda a gente votar como ele. Disse aquilo que lhe estava na ideia, porque é muito espontâneo", considero u.

Arlindo Duarte, que ainda não decidiu o que votar no próximo domingo, lembrou que "mesmo a Igreja não é unânime" nesta questão e que "há muita gente d a Igreja que vai votar `sim`, só que não tem coragem para o admitir, e nem preci sa, porque o voto é secreto".

"Este padre teve coragem. Quanto aos outros, que defendem a excomunhão de quem votar `Sim`, não vivem neste mundo", acrescentou.

Fernanda Ferreira, de 40 anos, e que já está decidida pelo "Não", tamb ém considera que "foi um homem corajoso", mas "se calhar, enquanto padre, não de via ter dito o que disse".

"Ele como padre é muito aberto connosco, tem umas ideias mais evoluída s que outros que eu acho que os padres podem defender. Mas há limites", sublinho u.

Depois de um dia recheado de telefonemas, e de telemóvel pendurado ao pescoço, o padre Manuel Costa Pinto mantém a posição assumida na missa de Lordos a e reafirmada quarta-feira, numa conferência do Movimento Distrital pelo Sim.

Natural de Castro Daire, Manuel Costa Pinto deu aulas em Bragança, ond e foi ordenado em 1964, pelo bispo D. Abílio Vaz das Neves, já falecido.

Foi capelão militar na Guiné-Bissau durante dois anos e, de regresso a Portugal, foi viver para Lisboa com a irmã, onde auxiliava o padre de Santos-o- Velho.

Foi nessa altura que, na sequência de uma encíclica do Papa Paulo VI s obre o celibato, Manuel Costa Pinto escreveu a obra "O casamento dos padres", qu e foi apreendido pela PIDE e levou à sua suspensão.

Impulsionado por um colega, acabou por pedir a entrada na Diocese de L amego (à qual pertence Castro Daire, sua terra natal), desvinculando-se da de Br agança, há cerca de 20 anos.

"Nunca gostei da forma como habitualmente se faz sacerdócio numa paróq uia, pedindo dinheiro pelas missas e outros serviços. Um padre alemão, que foi e xcomungado, traduziu bem a minha ideia num livro chamado `Funcionários de Deus`" , referiu.

Foi na diocese de Lamego que, pela primeira vez, lhe foram atribuídas paróquias, tendo passado por Almofala, Salzedas, Cujó e Monteiras e, ao atingir os 75 anos, pediu ao bispo D. Jacinto Botelho para o dispensar, tendo então pass ado a residir em Viseu, com a irmã Maria do Socorro. "Sempre foi muito progressista. Detesta o seguidismo, gosta de pensar p ela sua própria cabeça e, por isso, tem tido problemas", disse à Lusa Maria do S ocorro, frisando que "se Deus deu inteligência aos homens, foi para que a usasse m".

PUB