"Políticos não querem pegar em questões quentes como a legalização da prostituição" - Pereira da Silva

Os políticos "não querem pegar em questões quentes como a legalização da prostituição para não queimarem as mãos", afirmou quarta-feira o advogado José António Pereira da Silva.

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Num debate, realizado na Fábrica Braço-de-Prata e moderado pelo jornalista João Mesquita, Pereira da Silva destacou que "a prostituição é uma profissão" e que, como tal, "deve ser legalmente enquadrada".

"À roda da esquina: uma conversa sobre a legalização das casas de passe" foi o tema da discussão que teve como protagonistas várias figuras públicas.

Pereira da Silva lançou em Março deste ano o romance também intitulado "A roda da esquina", uma obra em que se destaca a despenalização do aborto e a legalização das casas de prostituição.

No inicio, o moderador informou que havia 1.800 assinaturas recolhidas pelo movimento impulsionado por Pereira da Silva, que pretende levar a legalização da prostituição e das casas de passe à Assembleia da República "para acabar com a prostituição de rua".

Para o advogado, a Constituição "reconhece o direito de cada pessoa a escolher a sua profissão, o seu modo de vida e as suas escolhas sexuais" e considera que a prostituição deve ser uma "profissão tributada".

"Somos um movimento cívico que apela à consciência da sociedade civil para um problema grave", anunciou perante as cerca de 30 pessoas presentes.

Apesar da maioria dos membros da mesa se inclinar para a legalização da prostituição, nem todos concordaram com a afirmação de Pereira da Silva de que a prostituição "é uma opção".

O padre franciscano Henrique Campos, que se apresentou em nome pessoal, referiu que não sabe dizer se está ou não a favor da legalização mas que a prostituição "não é uma opção senão em cerca de dez por cento dos casos".

"É a pobreza e a miséria que as leva para a profissão", sustentou Henrique Campos.

Em relação à proposta de Pereira da Silva sobre rastreios obrigatórios aplicados às "profissionais do sexo", porque representam também "um problema de saúde pública", o padre acrescentou que "nem sempre são as causadoras das doenças".

Outro dos presentes, o advogado Ricardo Sá Fernandes, considerou que não se trata "apenas de um problema das mulheres" porque "os homens também se prostituem".

Acrescentou que tem muitas dúvidas mas que tem a certeza de que "o que está não pode continuar por uma razão de justiça elementar".

No entanto, alertou para a "visão paternalista" que muitas vezes se pode ter quando se quer ajudar as prostitutas e lembrou o livro "Trabalhadores do sexo, uni-vos" como uma outra forma de se encarar o problema.

O psiquiatra António José Albuquerque relatou que na sua experiência de trabalho com prostitutas descobriu que têm problemas muito específicos e que a "psicopatia pela violência", o "abandono" e a "frustração" são as principais patologias na prostituição.

Por sua vez, o deputado do PSD Campos Ferreira recordou as mudanças que se deram na prostituição nas últimas décadas destacando que, "quando era miúdo, as prostitutas eram portuguesas e muitas vezes até tinham orgulho em serem as primeiras" na iniciação do sexo.

"A indústria globalizou-se e encontrar uma prostituta portuguesa é difícil", destacou.

Desvinculando a sua opinião de qualquer posição oficial do PSD, Campos Ferreira acrescentou que "a polícia tem de actuar contra a tragédia deprimente nas ruas".

Também a favor da legalização está o autarca do PS João Soares que referiu que as pessoas devem ter "meios para se defenderem" mas que não se tenham "ilusões líricas" porque "só pela via legal não se vai lá".

O candidato a Bastonário da Ordem dos Advogados António Marinho Pinto mostrou-se "frontalmente contra a prostituição" como contra as drogas "que levam as pessoas à condição de escravo" mas defendeu que se deveria tomar o exemplo da troca de seringas nas prisões ou da interrupção voluntária da gravidez em locais com condições para melhorar a situação de quem é prostituto, mesmo que se seja contra a prostituição.

Durante o debate, todos estiveram de acordo com a condenação do proxenetismo e Pereira da Silva referiu que o estatuto de trabalhador independente para as prostitutas é uma das formas de acabar com esse fenómeno.

Defendeu ainda que parte das receitas arrecadadas pelos impostos pagos pelas prostitutas deveriam ser encaminhados para a luta contra os proxenetas e o tráfico de mulheres e ainda para programas de reinserção social daquelas que desejassem abandonar a "profissão".

No entanto, João Soares, que referiu ter conhecido a "experiência holandesa", alertou para que também na Holanda existe "imensa prostituição de rua e proxenetas".

No final, o padre Henrique Campos destacou que no debate "não se discutiu a degradação social, a miséria, a pobreza, nem o que leva à procura do sexo".

Em Portugal, a prostituição não é legal nem ilegal porque a lei só pune o lenocínio, que é o favorecimento e a exploração da actividade.

Em declarações ao Diário de Notícias, o secretário de Estado da presidência do Conselho de Ministros e o membro do Governo, Jorge Lacão, afirmou que "a tendência de regulamentar no sentido de internalizar essa actividade pode levar a situações que fiquem muito perto do condicionamento drástico da liberdade das pessoas, que pode ser contrária à própria ordem constitucional - que é uma ordem constitucional de liberdade".

Jorge Lacão acrescentou que não se prevê para breve, por parte do Governo, qualquer iniciativa legislativa em relação a esta matéria.

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