Santander. Comissão de Trabalhadores denuncia "pressão e ameaças" para impor rescisões

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
Rafael Marchante - Reuters

A Comissão Nacional de Trabalhadores (CNT) do Santander Totta acusa o banco de “pressão”, “assédio laboral” e de “ameaças” contra trabalhadores que não aceitam a proposta de rescisão do contrato por mútuo acordo que tem sido apresentada nos últimos meses. O banco Santander nega qualquer tipo de pressão sobre os trabalhadores e garante que a sua “atuação não sofreu alterações”, não prevendo que se altere o número médio de trabalhadores que sairão da empresa.

No mês de outubro, o banco Santander Totta avançou com um processo de redução de trabalhadores através de rescisões por mútuo acordo, que têm como contrapartida uma indemnização. Segundo um comunicado da CNT do banco, ao qual a RTP teve acesso, “tem sido abordado um grande número de colegas, muitos deles sem qualquer critério de seleção”.

“Eles dizem que estão a redesenhar a organização do banco e que não precisam destas pessoas”
, diz João Pascoal, membro da Comissão de Trabalhadores do Santander. “Há pessoas que eles dizem que não precisam e são pessoas como gerentes de balcão, cujo balcão está sempre nos primeiros três lugares do ranking de ação comercial dele, portanto, é um balcão que dá muito dinheiro ao banco. Mas também gestores de clientes, assistentes administrativos. Há uma série de colegas de diferentes categorias que estão a ser chamados para a rescisão por mútuo acordo”, explicou João Pascoal à RTP.

Segundo o representante dos trabalhadores, em novembro começaram as reuniões individuais onde são apresentadas as propostas de rescisão. Nestas reuniões, “os Recursos Humanos fazem-se assessorar por uma empresa de consultores externos que pressionam os trabalhadores e chegam mesmo a ameaçá-los”.

“Na última reunião, quando o trabalhador recusa, há uma ameaça. Dizem ‘o banco já não conta consigo’ ou ‘se não aceitas agora, no final do ano és despedido’. O que não é uma ameaça real, não é juridicamente correto, mas é dito e as pessoas sentem-se coagidas perante esta ameaça”, disse João Pascoal. “Isto só é dito quando os representantes dos trabalhadores não estão presentes nestas reuniões”, acrescentou.

“Não temos nenhuma razão para não acreditar que esta seja a verdade porque temos recebido relatos trabalhadores em várias zonas do país ao mesmo tempo”, afirma o representante dos trabalhadores.
“Não há nenhuma pressão”
Contactado pela RTP, o banco Santander nega que os trabalhadores estejam a ser pressionados e sublinha que “os valores que estão a ser apresentados no acordo são acima do que é legal
. Em média são o dobro do mercado bancário e melhores que a generalidade das empresas”. Para a CNT do banco, “esta é uma atitude claramente intimidatória, dado que legalmente, numa RMA [rescisão por mútuo acordo], não existem valores legais a aplicar, valores máximos nem mínimos, mas sim uma conjugação de valores e vontades acordados entre as partes”.

Em meados de outubro, os sindicatos do Setor Financeiro (Mais) e dos Bancários do Centro (SBC) tinham já publicado um comunicado onde advertiam que, face à ação de propostas de rescisão por mútuo acordo, não iriam permitir quaisquer pressões ou ameaças sobre os trabalhadores, lembrando que estes são livres de aceitar ou recusar o que lhes é proposto durantes as reuniões.

“Muitos trabalhadores do Banco Santander Totta estão a ser convocados para uma reunião com os Recursos Humanos, na qual está também presente um consultor externo. O objetivo é apresentar-lhes uma proposta de rescisão por mútuo acordo, tendo como contrapartida uma indemnização”, lê-se no comunicado.

“Os Sindicatos lembram que compete a cada um dos visados analisar a proposta, tendo em conta a sua expectativa laboral e o futuro profissional, sendo livre de optar por continuar a sua carreira no banco ou escolher outro projeto”, refere o comunicado conjunto do Mais Sindicato e do SBC, avisando desde já que “não admitirão que os trabalhadores sejam alvo de qualquer tipo de pressão ou ameaça – nomeadamente que se intimide os visados de que se não aceitarem a rescisão por mútuo acordo poderão ser despedidos ao abrigo da extinção do posto de trabalho ou através de um despedimento coletivo”.

Por sua vez, o Santander argumenta que estas acusações “não correspondem à verdade” e garante que “não há nenhuma pressão sobre os trabalhadores.
O banco tem sempre muito cuidado nestes processos de acordo, de ouvir as pessoas, de perceber o que está em causa. As coisas estão a acontecer como nos outros anos. Temos sempre feito acordos com vários trabalhadores e nunca se levantou nenhuma questão até agora”, acrescenta.
Trabalhadores colocados em teletrabalho
Mais recentemente, a partir do final de novembro, o banco “começou a enviar estas pessoas [que recusam a rescisão] para casa, em teletrabalho, com a justificação da pandemia. Mas enviam só essas pessoas que não aceitaram a proposta”, diz João Pascoal.

Verificamos que as respostas negativas, legitimadas pela Lei e por não corresponderem às ansiedades dos trabalhadores, estão a ter como consequência o teletrabalho sem tarefas para executar, sendo encarado por muitos como forma de 'pressão' e ação psicológica”, acusa a CNT do banco. “Em alguns casos é atribuída a lacónica situação de ‘on hold’, ficando o trabalhador a aguardar contacto das hierarquias”, acrescenta.

“Em cada balcão que continua aberto ao público, estão lá todos os trabalhadores, menos essa pessoa que foi chamada e recusou a rescisão de contrato. Sendo só este universo de pessoas, isto configura assédio laboral”, diz João Pascoal. 

Confrontado com esta situação, o Santander explica apenas que “grande parte do banco está em teletrabalho” devido às exigências da pandemia. “Temos muitos trabalhadores em casa a trabalhar. Uns terão mais coisas para fazer do que outros”, acrescenta.

Para além disso, o comunicado da CNT do banco afirma que existem ainda outras situações “que configuram maior gravidade e que se prendem com o facto de estar a ser vedada a atividade aos colegas eleitos para as estruturas de representação coletiva, nomeadamente as Subcomissões de Trabalhadores dos Balcões a que pertencem, podendo indiciar atos discriminatórios proibidos por Lei”.

Por estes motivos, a comissão de trabalhadores do banco exige “a interrupção deste processo e o regresso aos balcões dos trabalhadores que não tenham condições de cumprir as suas funções em regime de teletrabalho”.
“O saldo entre saídas e entradas é bastante reduzido”
O banco Santander não avançou quantos funcionários tenciona reduzir, mas, segundo João Pascoal, “no mínimo duas a três centenas de pessoas já foram ou estão a ser chamadas para estas rescisões”.
A maioria (cerca de 80 por cento) destes trabalhadores não está a aceitar a proposta de rescisão.

Por sua vez, o Santander garante que a sua atuação não sofreu alterações. “A política que tem sido seguida e que continuamos a executar é de as saídas serem feitas por acordo entre o Banco e cada trabalhador. Não prevemos que durante o corrente ano se altere o número médio de colaboradores que sairão por acordo, reforma e pré-reforma. Aliás, o número de saídas deverá ser menor”, adianta o banco.

Segundo os dados enviados à RTP, entre o final de 2019 e o final de setembro deste ano saíram do Santander 111 trabalhadores (para um total de 6.077) e foram encerradas 40 agências.
Em termos de contratações, o Santander avança que até ao momento conta com 89 novos trabalhadores. “Nunca nos últimos anos o Santander contratou tantos novos colaboradores como em 2020”, afirma o banco, sublinhando que “o saldo entre saídas e entradas é bastante reduzido”.

Segundo um comunicado do banco, o Santander obteve, entre janeiro e setembro deste ano, 245,5 milhões de euros de lucro, o que representa uma queda de 35 por cento face ao período homólogo de 2019. O banco, detido pelo grupo espanhol Santander, anuncia prejuízos recordes de quase onze mil milhões de euros no primeiro semestre deste ano, justificando os resultados negativos com o impacto da pandemia da Covid-19.
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