Tomar conta dos netos é cada vez mais o segundo emprego

Com uma vida de trabalho já "arrumada" atrás das costas ou em idade ainda activa, muitos avós têm um "segundo emprego", o de tom ar conta dos netos, que não garante ordenado, mas os "enriquece" de afectos.

Agência LUSA /

Os dias destes avós, já reformados ou ainda dedicados à "labuta" diária do trabalho, mais novos ou mais velhos, com um ou mais netos, são passados entr e idas e vindas das escolas e jardins de infância, passeios aos parques infantis e brincadeiras caseiras.

Uma rotina que, relataram à agência Lusa vários avós, acolhem de "braço s abertos" e sem a qual já não sabem viver. Tudo em nome de um amor, pelos filho s e pelos netos, que, tal como a paciência, também "não tem fim".

"Quando os meus dois netos não estão comigo, sinto logo a sua falta. Ta mbém ralho, mas somos muito amigos e tenho mais paciência do que a que tinha par a o meu filho. Os limites agora esticam, esticam...", confessa Miquelina Porta-N ova, de 61 anos, residente em Évora.

Esta avó, que trabalhava no comércio, apesar de ter tempo para a ginást ica e hidroginástica, dedica quase a sua jornada à Inês, de nove anos, e ao Diog o, de seis, aguardando com expectativa a chegada, dentro de alguns meses, do ter ceiro neto.

"Os pais deixam-nos cá em casa de manhã e eu e o avô é que os levamos e os vamos buscar à escola. Depois, ao final do dia, vamos para as piscinas com e les. Somos avós a tempo inteiro", diz, com um sorriso no rosto, desafiando o mar ido em questões de paciência: "Tu é que tens mais? Está-se mesmo a ver!".

Recém chegado de férias no Algarve, visível no seu bronzeado, este casa l, residente na freguesia da Malagueira, na cidade de Évora, continua em período de lazer, ou seja, os netos rumaram também para as praias mais a sul com os pai s.

"Mas as saudades eram tantas que, no dia em que nos cruzámos entre o Al garve e Évora, para não passarem mais 15 dias sem os ver, parámos a meio do cami nho e estivemos uma ou duas horas juntos. Assim, os avós e os netos já ficaram m ais consolados", acrescenta.

Miquelina não é caso único e, na Associação de Reformados, Pensionistas e Idosos da Freguesia da Malagueira, onde vários avós se juntam para "dois dedo s de conversa" ao final do dia, também Almerinda Fernandes, de 58 anos, assegura que o que mais quer na vida é "estar com os dois netos", gémeos de sete anos.

"Não os levo à escola, mas ficam comigo de dia e também de noite, quand o os pais têm horário de trabalho nocturno", conta, acrescentando, conformada: " é a vida".

Mário André, de sete anos, é outro dos netos que põe "às voltas" a cabe ça da avó, Gertrudes Carrão, de 68 anos, que enumera, com orgulho, os nomes e as idades dos seus outros três, "já criados" (com idades entre os 17 e os 25), iro nizando: "Já pode ver há quantos anos eu luto!".

O mais pequeno, diariamente, vai e vem do colégio de Évora que frequent a pela mão da avó, a qual, desde a morte do marido, encontra nos netos a sua "mo tivação para viver".

"Diga lá, primeiro vive-se para os filhos, depois é para os netos. Eu a gora, sozinha, para quem é que vivia se não fosse assim? Até era sócia do INATEL , mas já me deixei disso porque pagava e não havia jeitos de poder passear para lado nenhum", acrescenta.

No distrito de Beja, as diferenças não são muitas e as "estórias" parti lhadas entre avós e netos repetem-se, nomeadamente em Moura, onde residem Felici ana Moita, de 62 anos, e as duas netas: Sofia, de sete anos, e Beatriz, de dois anos e meio.

Já reformada, tal como o marido, dedica "todo o tempo" às netas, ficand o encarregue da mais pequena, que ainda não frequenta o infantário, logo a parti r da manhã: "Somos uns segundos pais!".

"É um autêntico trabalho a tempo inteiro, mas, apesar de serem muito re guilas quando estão as duas juntas, não passamos sem elas e gostamos de passear, fazemos peças de teatro para as entreter e ensinamos-lhes cantigas do nosso tem po", conta Feliciana.

Uma boneca de trapos, "nascida" a partir de um pano da loiça, é a nova adoração da mais velha, que descobriu, assim, pelas mãos dotadas da avó, um brin quedo de tempos idos, símbolo desta troca de experiências e afectos.

"Os miúdos, hoje, têm tantos brinquedos que nada os distrai. Por isso, é incrível como ela gostou tanto de uma boneca tão simples. E nós, como avós, fi cámos contentes por lhes podermos mostrar um brinquedo dos nossos", assegura.

A poucos quilómetros de Beja, na localidade do Penedo Gordo, também Cus tódia Adriano, de 46 anos, se confessa como uma "avó jovem e babada", não deixan do que o emprego interfira com o apoio ao pequeno Filipe, de cinco anos, um autê ntico apaixonado por tudo o que esteja relacionado com o "Homem-Aranha".

"Como os pais saem mais tarde do trabalho, vou eu buscá-lo à escola e v oltamos para casa de camioneta. Quando a mãe regressa, vai buscá-lo, mas ele est á sempre a fugir lá para casa, porque vivemos na mesma rua", diz, garantindo que "o neto e os filhos são o melhor" da sua vida. Em troca, Custódia diz só preci sar de duas coisas. Das palavras da filha, quando lhe diz que tem "a melhor mãe do mundo", e dos carinhos do neto.


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