Único português Nobel da Medicina morreu há 50 anos

Egas Moniz, o único português a ser galardoado com o prémio Nobel da Medicina, em 1949, pelo desenvolvimento de uma operação ao cérebro chamada lobotomia morreu há 50 anos, em Lisboa.

Agência LUSA /

António Caetano de Abreu Freire nasceu em Avanca, concelho de Estarreja, a 29 de Novembro de 1874 e em honra do grande herói português, e suposto antepassado da família, o seu padrinho alterou- lhe o sobrenome Freire para Egas Moniz (nobre que teve a seu cargo a educação do rei D. Afonso Henriques).

Em 1949 recebeu o prémio Nobel de Medicina pelo desenvolvimento da lobotomia, mas por motivos de saúde não se deslocou à Suécia para receber o galardão, tendo a cerimónia decorrido, excepcionalmente, na sua casa de Lisboa, cidade onde morreu a 13 de Dezembro de 1955.

A técnica desenvolvida por Egas Moniz e que deixou de ser praticada pelos médicos há 30 anos tem sido alvo de polémica.

Em Julho deste ano, familiares de pacientes que sofreram esta intervenção exigiram que fosse anulado o Prémio Nobel atribuído em 1949 ao seu inventor.

Paralelamente, um novo livro e um historiador médico afirmam que esta intervenção cirúrgica, agora considerada "bárbara", só ajudou cerca de 10 por cento de 50.000 norte-americanos aos quais foi praticada entre meados dos anos 30 e os anos 70.

A lobotomia - usada para tratar doenças mentais, epilepsia e até dores de cabeça crónicas - foi desenvolvida em 1936 por Egas Moniz, que a praticou em pacientes com doenças psiquiátricas graves, como a esquizofrenia.

O processo consistia numa incisão em fibras nervosas que ligam o lobo frontal a outras regiões do cérebro, praticada através de orifícios feitos no crânio, daí resultando em teoria o fim do comportamento anormal do paciente.

Egas Moniz, muito respeitado a nível internacional por ter desenvolvido a angiografia cerebral (para detectar tumores), apresentou uma série de casos de sucesso em pacientes lobotomizados, o que lhe valeu a atribuição do Nobel da Medicina em 1949.

A intervenção esteve tão em voga que Rosemary Kennedy, uma irmã do antigo presidente norte-americano John F. Kennedy que sofria de ligeiro atraso mental, foi lobotomizada em 1940, com 23 anos.

Depois disso passou toda a vida numa instituição até à sua morte em Janeiro passado.

No final dos anos 30 os médicos tinham começado a relatar casos de muitos pacientes que ficaram como crianças, apáticos e ensimesmados depois da operação, e o seu uso começou a decair com o advento de medicamentos psiquiátricos eficazes em meados dos anos 50 e o uso crescente dos electrochoques.

A campanha em prol da revogação do prémio foi lançada por Christine Johnson, uma bibliotecária médica (de Levittown, Nova Iorque) e criou há vários anos um "site" na Internet (psychosurgery.org) para criar uma rede de apoio entre familiares de pacientes lobotomizados.

A avó de Johnson, que começou a sofrer alucinações em 1949, foi lobotomizada em 1954 depois de ser submetida sem êxito a tratamentos psiquiátricos e electrochoques, e passou o resto da vida em instituições.

A Carta Nobel não contém nenhuma cláusula que preveja a revogação de um prémio e a fundação ignora habitualmente as críticas, como aconteceu quando foi atribuído o Nobel da Paz ao falecido presidente palestiniano Yasser Arafat.

Egaz Moniz formou-se na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e depois de terminado o curso, em 1899, prosseguiu os seus estudos em neurologia nas Universidades de Bordeaux e Paris.

Mais tarde regressa a Portugal, torna-se professor na Universidade de Coimbra e posteriormente dedica-se à política durante alguns anos, primeiro como deputado no parlamento português (1903- 1917), depois como ministro das Relações Exteriores da Primeira República (1918) e finalmente como embaixador em Espanha (1918-1919).

Quando regressa à Medicina, dedica-se à Neurologia na Faculdade de Medicina de Lisboa, onde desenvolveu o método para diagnosticar tumores cerebrais (angiografia).

Em 1935, numa conferência internacional de Neurologia, ouviu uma palestra sobre os efeitos da leucotomia frontal (corte cirúrgico das fibras nervosas que ligam o lobo frontal às restantes partes do cérebro) no comportamento de chimpanzés.

A leucotomia foi, posteriormente, designada de lobotomia por Walter Freeman.

Em Novembro de 1935, Egas Moniz e Almeida Lima realizaram a primeira leucotomia e um ano depois são publicados os resultados das 20 primeiras operações.

No seu relatório afirmava que nenhum paciente tinha morrido durante a operação, e 14 dos 20 pacientes estavam curados ou tinham melhorado.

O médico português criou assim um interesse mundial sobre o assunto e nos Estados Unidos o neurologista Walter Freeman, influenciado por estes resultados, realizou várias cirurgias por todo o país.

A popularidade desta técnica diminuiu drasticamente nos anos 50, após ter sido provado que os efeitos secundários eram muito graves.

GC Lusa/Fim


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