Universidade de Bar-Ilan recebeu importante oferta de Portugal
Um valioso exemplar de "Meam Loez", obra didáctica judaica em língua ladina que pertenceu ao falecido humanista português Sam Levy, pertence agora ao acervo do Centro da Língua Ladina, na Universidade Bar-Ilan, em Ramat Gan.
André Levy, filho de Sam Levy, fez pessoalmente a entrega dos dez volumes da obra, como oferta, durante uma recente visita àquela universidade.
"Meam Loez" foi escrito originalmente no século XVII, em Jerusalém, pelo rabino Yaakov Culi, descendente de famosos rabinos da Península Ibérica.
Trata-se de uma compilação de todos os preceitos da religião judaica, escrita em Ladino, a língua familiar dos judeus exilados da Espanha e de Portugal.
Originária do espanhol e do português quinhentistas, juntamente com elementos de hebraico, o Ladino é a língua de que os judeus sefarditas se serviam para traduzir literalmente do hebraico para o vernáculo as orações e os textos sagrados da sua religião.
Uma versão coloquial da mesma língua é conhecida por judeu- espanhol, com variantes em dialectos regionais, nos vários países balcânicos, onde a língua assume também nomes diferentes, como "ispanyolit", "djudezmo", "Chudeo" e outros.
Ambas eram escritas sempre em caracteres hebraicos.
A partir de meados do século XX começaram a surgir livros e jornais em judeu-espanhol, escrito com caracteres latinos.
Acompanhou depois a dispersão desses judeus para Israel e para o continente americano e ainda hoje se fala e se escreve, mas cada vez menos.
No seio de muitas famílias judaicas portuguesas, ainda é costume, nalgumas festividades, ler os textos litúrgicos em hebraico e, em seguida, na tradução em ladino.
"Meam Loez" foi escrito em Ladino, a pensar nas pessoas mais humildes e menos cultas da diáspora judaica ibérica.
Durante cerca de 200 anos, "Meam Loez" gozou de uma popularidade sem precedentes entre a gente comum do judaísmo sefardita.
Conhecem-se pelo menos oito edições, algumas delas de luxo, que era costume os pais da noiva oferecerem como prenda muito apreciada ao novo genro.
Nas sinagogas do Império Otomano organizavam-se grupos de companheiros, que se reuniam regularmente para estudarem juntos os ensinamentos divulgados no "Meam Loez".
Sam Levy, cujo nome foi dado a uma rua de Lisboa, nasceu em Esmirna, na Turquia, no seio de uma família de judeus portugueses originária das Beiras.
Quando veio viver para Portugal, era portador de uma chave, que se conservara na sua família e que, segundo a tradição, pertencera à porta da sua casa em Portugal.
Judeu muito culto, dominando perfeitamente vários idiomas, Sam Levy tinha um amor muito especial ao ladino e ao judeu-espanhol, língua que sempre se falou em sua casa e na casa de seus pais.
O receio de que o uso da língua se perdesse, sobretudo que deixasse de haver pessoas que a lessem na versão original em caracteres hebraicos, levaram-no a empreender a tarefa gigantesca de gravar em fitas magnéticas os textos do "Meam Loez", lidos por ele próprio.
A oferta de seu filho, André, à Universidade de Bar-Ilan, vem contribuir para a manutenção da língua familiar, pela qual o pai tinha tanto carinho.
Os novos estudantes do Ladino poderão agora servir-se da obra para os seus trabalhos de preservação da tradição.