O presidente da Assembleia da República prestou homenagem aos eleitos para a Assembleia Constituinte em 1975, nas primeiras eleições livres, e abordou a questão das crises democráticas na Europa e em Portugal.
José Pedro Aguiar-Branco defendeu a tese que não se deve confundir as causas com as consequências quando se analisam fenómenos como o populismo ou a abstenção em atos eleitorais.
"A causa - a raiz do problema - é, tantas vezes, a incapacidade de apresentar resultados, de falar de futuro, de construir o futuro, e de estar à altura de quem nos elegeu. O que digo é válido para Portugal, mas também para a Europa", observou.
Depois de criticar a dificuldade da União Europeia em decidir e responder rapidamente aos desafios, José Pedro Aguiar-Branco deixou um recado aos políticos, dizendo que "não podem ser meros comentadores e analistas da realidade".
"Os políticos não são espetadores da realidade. São construtores da realidade. É assim que os cidadãos nos olham. É para isso que nos elegem", advertiu.
José Pedro Aguiar-Branco indicou depois que a democracia também se degrada quando os políticos abdicam voluntariamente dos princípios e dos direitos pelos quais os democratas lutaram - "princípios como a presunção de inocência, ou a liberdade de expressão".
"Quando promovemos a desconfiança no sistema e nos seus fundamentos, quando optamos por subir o tom da discussão para simular discordâncias que não são assim tão profundas, quando desistimos de olhar para o que temos em comum e preferimos focar-nos naquilo que nos divide".
Em suma, para o presidente do parlamento, a democracia fica mais fraca quando se abdica dos consensos. Nesta parte da sua intervenção, avançou alguns exemplos: "Podemos discordar quanto à política de imigração, mas todos concordamos que é preciso integrar quem chega; podemos discordar sobre o papel do Ministério Público, mas todos concordamos que a Justiça precisa de uma reforma; podemos discordar sobre o papel do Estado na sociedade, mas todo concordamos que a carga fiscal é excessiva -- e que a administração precisa de modernização e eficiência".
Tal como na parte inicial do seu discurso, também no fim da sua intervenção José Pedro Aguiar-Branco elogiou a mobilização dos cidadãos para as primeiras eleições livres em Portugal em Abril de 1975. Cidadãos que se mobilizaram para estar nas mesas de voto e que "nada pediram em troca".
"Nem uma senha de presença, nem um gesto de reconhecimento público. Não foram agraciados, não foram condecorados. Eles também não sabiam se os resultados seriam aceites, também não sabiam se estariam seguros, se seriam perseguidos. E, por um apurado sentido de dever cívico, não faltaram à chamada" assinalou o presidente da Assembleia da República.
c/ Lusa