Cavaco Silva acusa PS de o “puxar” para a luta política
O Presidente da República quebrou o silêncio e falou sobre as duas questões que marcaram a campanha eleitoral para as Legislativas: a participação de membros da Casa Civil no programa eleitoral do PSD e as alegadas escutas no Palácio de Belém. Cavaco Silva acusou "destacadas personalidades do partido do Governo" de quererem "puxar o PR para a luta político-partidária" e "desviar a atenção do debate eleitoral".
Cavaco Silva recordou que "durante a campanha eleitoral foram produzidas dezenas de declarações e notícias sobre escutas, ligando-as ao nome do Presidente da República e, no entanto, não existe em nenhuma declaração ou escrito do Presidente qualquer referência a escutas ou a algo com significado semelhante".
"Desafio qualquer um a verificar o que acabo de dizer", declarou o Chefe de Estado que acrescentou que é "sabido que a Presidência da República é um órgão unipessoal e que só o Presidente da República fala em nome dele ou então os seus chefes da Casa Civil ou da Casa Militar".
"Porquê toda aquela manipulação", questionou para de seguida referir que considera "graves as declarações" que encara "como um ultimato ao Presidente da República".
Para Cavaco Silva, "pretendia-se alcançar dois objectivos com aquelas declarações".
"Puxar o Presidente para a luta político-partidária, encostando-o ao PSD, apesar de todos saberem que eu, pela minha maneira de ser, sou particularmente rigoroso na isenção em relação a todas as forças partidárias" e "desviar as atenções do debate eleitoral das questões que realmente preocupavam os cidadãos" enumerou.
"Muito do que depois foi dito ou escrito envolvendo o meu nome interpretei-o como visando consolidar aqueles dois objectivos", frisou.
"Como é que aqueles políticos sabiam dos passos dados por membros da Casa Civil da Presidência da República", questionou para de seguida frisar "incluindo mesmo as interrogações atribuídas a um membro da minha Casa Civil, de que não tive conhecimento prévio e que tenho algumas dúvidas quanto aos termos exactos em que possam ter sido produzidas".
"Mas onde está o crime de alguém, a título pessoal, se interrogar sobre a razão das declarações políticas de outrem?" interrogou para voltar a referir que "tudo não passava de tentativas para consolidar os objectivos de colar o Presidente da República ao PSD e desviar as atenções".
Cavaco Silva desconhecia o e-mail
O Presidente da República revelou também não ter conhecimento do e-mail, trocado entre o editor de política do Jornal Público, Luciano Alvarez, e o correspondente do jornal na Madeira, Tolentino Nóbrega, que refere que foi Fernando Lima, assessor do Chefe de Estado que deu indicações sobre as alegadas escutas ao jornal.
"Desconhecia totalmente a existência e o conteúdo do referido e-mail e, pessoalmente, tenho sérias dúvidas quanto à veracidade das afirmações nele contidas", afirmou.
"Não conheço o assessor do primeiro-ministro nele referido, não sei com quem falou, não sei o que viu ou ouviu durante a minha visita à Madeira e se disso fez ou não relatos a alguém", sublinhou o Presidente da República que acrescentou que "sobre mim próprio teria pouco a relatar que não fosse de todos conhecido. E por isso não atribuí qualquer importância à sua presença quando soube que tinha acompanhado a minha visita".
O Chefe de Estado questionou também porque é que um e-mail com 17 meses foi "publicado a uma semana do acto eleitoral".
"Liguei imediatamente a publicação do e-mail aos objectivos visados pelas declarações produzidas em meados de Agosto. E, pessoalmente, confesso que não consigo ver bem onde está o crime de um cidadão, mesmo que seja membro do staff da casa civil do Presidente, ter sentimentos de desconfiança ou de outra natureza em relação a atitudes de outras pessoas", disse.
Cavaco Silva considera que o referido e-mail "deixava a dúvida na opinião pública sobre se teria sido violada uma regra básica que vigora na Presidência da República: ninguém está autorizado a falar em nome do Presidente da República, a não ser os seus chefes da Casa Civil e da Casa Militar. E embora me tenha sido garantido que tal não aconteceu, eu não podia deixar que a dúvida permanecesse".
"Foi por isso, e só por isso, que procedi a alterações na minha Casa Civil", esclareceu.
Cavaco Silva acrescentou que a publicação do e-mail lhe levantou algumas dúvidas sobre as comunicações da Presidência. "Será possível alguém do exterior entrar no meu computador e conhecer os meus e-mails? Estará a informação confidencial contida nos computadores da Presidência da República suficientemente protegida?"
No entanto acrescenta que para "esclarecer esta questão ouvi várias entidades com responsabilidades na área da segurança. Fiquei a saber que existem vulnerabilidades e pedi que se estudasse a forma de as reduzir".
"Um Presidente da República tem, às vezes, que enfrentar problemas bem difíceis, assistir a graves manipulações, mas tem que ser capaz de resistir, em nome do que considera ser o superior interesse nacional. Mesmo que isso lhe possa causar custos pessoais. Para mim Portugal está primeiro", sublinhou Cavaco Silva para de seguida acrescentar que "o Presidente da República não cede a pressões nem se deixa condicionar, seja por quem for".
"Foi por isso que entendi dever manter-me em silêncio durante a campanha eleitoral".
No entanto, "agora, passada a disputa eleitoral, e porque considero que foram ultrapassados os limites do tolerável e da decência, espero que os portugueses compreendam que fui forçado a fazer algo que não costumo fazer: partilhar convosco, em público, a interpretação que fiz sobre um assunto que inundou a comunicação social durante vários dias sem que alguma vez a ele eu me tenha referido, directa ou indirectamente".
Cavaco Silva recordou que "a Presidência da República é um órgão unipessoal e que, sobre as suas posições, só o Presidente se pronuncia".
"Uma última palavra quero dirigir aos portugueses: podem estar certos de que, por maiores que sejam as dificuldades, estarei aqui para defender os superiores interesses de Portugal", rematou.