Eleições nos Açores. Como funcionam e qual é a história do Governo Regional?

As eleições legislativas regionais nos Açores acontecem este domingo e são 13 as forças políticas que disputam os 57 lugares na Assembleia Legislativa da região. Com o PS na liderança do Governo Regional há mais de duas décadas, está nas mãos de 228 mil eleitores a decisão sobre um novo mandato socialista - o que as sondagens dão como praticamente garantido - ou uma mudança de panorama político no arquipélago. Como funcionam estas eleições?

Quantos deputados são eleitos?
Há um total de dez círculos eleitorais nos Açores – um por cada ilha, mais o círculo de compensação, que coincide com a totalidade da área da região. Apenas seis dos 13 partidos na corrida estão a concorrer por todos os círculos: PS, PSD, CDS, BE, CDU e PPM, todos os que já têm assento atual no arlamento regional.

PAN, MPT, Aliança, Livre, Chega, Iniciativa Liberal e PCTP/MRPP são os restantes partidos que se apresentam a votos.

O número de lugares no parlamento não se alterou em relação a 2016, data das últimas eleições. Continuam a ser 57 os parlamentares com assento no hemiciclo açoriano, e a sua distribuição vai também manter-se. Os partidos Chega e Iniciativa Liberal estreiam-se este ano nas eleições regionais dos Açores.

Em cada círculo de ilha são eleitos dois deputados e mais um por cada 7.250 eleitores ou fração superior a mil. Tal significa que São Miguel, por ser a maior ilha dos Açores e aquela com mais eleitores (quase 128 mil), vai eleger 20 deputados.

A Terceira, com cerca de 52 mil eleitores, elege dez. Seguem-se o Pico e o Faial, ambos com cerca de 13 mil votantes e com direito a quatro parlamentares. São Jorge, Santa Maria, Graciosa e Flores elegem, cada uma, três deputados. A mais pequena ilha açoriana, o Corvo, elege dois deputados.

Os restantes cinco deputados, deste total de 57, são eleitos pelo círculo de compensação, que reúne os votos que não foram aproveitados para a eleição de parlamentares nos círculos de ilha.
Quem venceu as últimas legislativas?
Há quatro anos foi o Partido Socialista quem venceu as legislativas nos Açores, com 46,4 por cento dos votos, elegendo 30 deputados. O PSD foi o segundo partido mais votado, com 30,89 por cento (19 deputados), seguido do CDS, com 7,1 por cento (quatro deputados), Bloco de Esquerda (3,6 por cento e dois mandatos), coligação PCP/PEV (2,6 por cento, um mandato) e, por fim, PPM (0,93 por cento, um mandato).

O Partido Socialista é, aliás, quem governa o arquipélago há 24 anos. Desde 2012 até agora é Vasco Cordeiro o líder do PS/Açores e presidente do Governo Regional, após a saída de Carlos César, que esteve 16 anos no poder.

Agora, Cordeiro volta a apresentar-se a votos na tentativa de um terceiro e último mandato como chefe do Executivo açoriano.

Os socialistas têm, porém, visto reduzir a percentagem de eleitores a seu favor desde 2004, ano em que o partido venceu com 56,96 por cento dos votos. Em 2008 venceu com 49,96 por cento, em 2012 com 48,98 por cento e, em 2016, com 46,43 por cento.

Até hoje, o melhor resultado do PS nos Açores foi em 2004, quando venceu com 56,96 por cento dos votos. Na altura, aliando-se ao CDS, teve de governar com uma maioria relativa, uma vez que obteve o mesmo número de mandatos para o parlamento regional do que o PSD.
Quem deverá vencer este ano?
Uma sondagem da Universidade Católica para a RTP revelou que o Partido Socialista conta com 45 por cento das intenções de voto, conservando, assim, a maioria absoluta.

O PSD conta, por sua vez, com 32 por cento, enquanto o CDS regista a sua maior queda, recolhendo apenas três por cento dos votos – menos de metade dos obtidos nas últimas eleições regionais.

A provável vitória socialista deverá ocorrer mesmo depois de os partidos da oposição terem assumido o objetivo de acabar com a maioria absoluta do PS no arquipélago.


A sondagem da Católica avança ainda a probabilidade de três novos partidos entrarem na Assembleia Legislativa Regional: Chega (com três por cento das intenções de voto), PAN e Iniciativa Liberal (ambos com dois por cento).

Estes resultados foram obtidos com base nestas intenções diretas de voto. Dezoito por cento dos inquiridos não sabem ou não responderam. Dez por cento dizem que não vão votar, e desses, 7 por cento apontam a pandemia como causa para faltarem às urnas.
Como e por que razão foi decidida a autonomia do arquipélago?
Após a instauração do regime político-administrativo dos Açores que materializou a autonomia, a então Assembleia Regional dos Açores foi eleita pela primeira vez, a 27 de junho de 1976. Cerca de um mês depois, teve lugar a abertura da Assembleia, que contava então com um total de 43 deputados, contra os 57 que atualmente compõem o hemiciclo.

As primeiras eleições legislativas após a criação do regime de autonomia no arquipélago deram a vitória ao PSD, então liderado por João Mota Amaral. O partido obteve uma maioria absoluta, com 53,83 por cento dos votos e 27 deputados eleitos num total de 43.

Mas por que razão foi então criado este Governo Regional? Segundo a Lei 2/2009 sobre o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, o objetivo foi assegurar a “autonomia política, legislativa, administrativa, financeira e patrimonial” do território.

O Artigo 3.º da mesma lei estabelece como objetivos fundamentais da autonomia a participação livre e democrática dos cidadãos, a defesa dos valores e interesses dos açorianos e do seu património histórico e “o desenvolvimento económico e social da região e o bem-estar e qualidade de vida das populações, baseados na coesão económica, social e territorial e na convergência com o restante território nacional e com a União Europeia”.
Qual o papel do Governo Regional?
O Governo Regional é “o órgão executivo de condução da política da Região e o órgão superior da administração regional autónoma”, também de acordo com a lei sobre o Estatuto Político-Administrativo do arquipélago.

Constituído pelo presidente e pelos secretários regionais, compete ao Governo Regional “conduzir a política da região”, “elaborar as propostas de plano de desenvolvimento económico e social” e apresentar à Assembleia Legislativa a proposta de orçamento para o arquipélago, entre outras obrigações a que está sujeito.

“Os membros do Governo Regional têm assento nas reuniões da Assembleia Legislativa e o direito de usar da palavra para a apresentação de qualquer comunicação ou prestação de esclarecimentos”, refere o artigo 72.º.
Qual o papel da Assembleia Legislativa e dos seus deputados?
Já a Assembleia Legislativa é o órgão representativo da região e possui poderes legislativos e de fiscalização da ação governativa regional.

Os deputados que compõem esta Assembleia têm, entre outros poderes e deveres, os de apresentar anteprojetos e antepropostas de lei, participar e intervir nos debates parlamentares, formular questões ao Governo Regional, realizar dois debates em cada sessão legislativa sobre assuntos de política regional e requerer ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade de qualquer norma com fundamento na violação de direitos da Região.
Por onde estão distribuídos os eleitores açorianos?
Neste momento, segundo mapa oficial publicado no final de agosto em Diário da República, estão inscritos na Região Autónoma dos Açores 228.572 eleitores, num total de quase 243 mil habitantes.

Estes eleitores estão distribuídos pelas ilhas de São Miguel, onde fica a sede do Governo Regional (127.947 eleitores), Terceira (52.498), Pico (13.613), Faial (13.019), São Jorge (8.710), Santa Maria (5.393), Graciosa (3.936), Flores (3.119) e Corvo (apenas 337 eleitores).

A discrepância de números justifica-se por quase 80 por cento dos habitantes dos Açores residirem nas ilhas de São Miguel e Terceira, que são também aquelas com maior densidade populacional e onde se registaram quatro em cada cinco nascimentos no arquipélago em 2019.

Devido à tendência de os mais jovens escolherem abandonar a ilha quando entram no ensino superior ou no mercado de trabalho, e também ao facto de o número de mortes ter vindo a superar o número de nascimentos, nos últimos cinco anos os Açores perderam cerca de quatro mil habitantes, segundo dados da Fundação Francisco Manuel dos Santos.

Mosteiro, na ilha das Flores, é a freguesia dos Açores com menos eleitores, 28, e na região há um total de 37 freguesias com menos de 500 inscritos para votar nas legislativas regionais de 25 de outubro.
Qual é habitualmente a taxa de participação eleitoral?
Apesar de terem ganho alguns eleitores - este ano estão inscritos 228.572, quando em 2016 eram 228.259 -, os Açores têm vindo a registar os maiores valores de abstenção do país.

Nas eleições para a Assembleia Legislativa Regional de 2016, só na ilha de São Miguel registou-se uma taxa de abstenção de 63,1 por cento, segundo a plataforma Pordata. Isto apesar de São Miguel ser a maior e mais populosa ilha açoriana.

No total do arquipélago, a taxa de abstenção nas últimas eleições foi de 59,2 por cento. Já a taxa de participação contou com 118.350 votos válidos, 2.297 votos brancos e 1.500 votos nulos.

No sufrágio deste ano foi possível aos eleitores exercerem o seu direito de voto de forma antecipada, por mobilidade, algo que até agora só era permitido nas eleições presidenciais, legislativas nacionais e europeias.
Qual é a relação entre o Governo Regional e o da República?
Desde a criação do Governo Regional, em 1976, este passou a exercer autonomamente o seu poder, sendo independente do Governo da República. No entanto, foi estabelecida uma relação de proximidade entre ambos os órgãos.

“A República e a Região devem cooperar mutuamente na prossecução das respetivas atribuições”, estabelece o Artigo 11.º da lei sobre o Estatuto Político-Administrativo do arquipélago. Assim sendo, o “Governo Regional e o Governo da República podem celebrar acordos juridicamente vinculativos sobre matérias de interesse comum”.

Além disso, a região autónoma “participa na determinação, condução e execução das políticas gerais do Estado sobre matérias que lhe digam respeito”. O Governo da República pode delegar total ou parcialmente poderes no Governo Regional.

Há, porém, quem considere pouco favorável para o arquipélago a relação entre os dois governos, pelo menos da forma como tem funcionado em anos recentes. "Como são governos do mesmo partido político (PS) seria de presumir uma excelente relação entre ambos, mas, salvo algumas exceções de natureza funcional de alguns serviços, a verdade é que o saldo global não me parece favorável aos Açores", defendeu, em entrevista à agência Lusa no contexto das eleições, o analista de política açoriana Elias Pereira.

Como exemplos, o especialista apontou os "sucessivos adiamentos" no financiamento da Universidade dos Açores e a "ausência de esquadras da PSP" ou da instalação "de outros serviços ainda no âmbito da administração interna que exigiam da República outra resposta e que não se concretizaram".

O também advogado destacou que o "aprofundamento do conceito autonómico" é, em muitos casos, limitado pela "prática centralista da República" e por "alguma incapacidade dos políticos regionais".

"Há que preparar uma revisão constitucional que enquadre as autonomias na orgânica do Estado e que demonstre que a descentralização e desconcentração administrativas são a única via para o desenvolvimento do país, e não um grito insular inconsequente", defendeu.