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Greve geral. Ex-ministra do Trabalho aponta "falta de diálogo" como "péssimo sinal"
Ana Mendes Godinho, ex-ministra do Trabalho do PS, rejeita avançar com críticas diretas à ministra Maria do Rosário Palma Ramalho, mas defende que era possível fazer mais para impedir a greve geral e alcançar entendimentos alargados com os parceiros sociais.
Fotos: Jorge Carmona
Questionada sobre a necessidade de avançar com uma mudança profunda nas leis do trabalho, a socialista defende que as alterações deveriam seguir em sentido contrário, até porque, segundo Ana Mendes Godinho, a proposta que consta do anteprojeto apresentado pelo Governo de Luís Montenegro são, sobretudo, um "retrocesso" para os trabalhadores portugueses.
"Face a uma diminuição da precariedade, qual é a razão para, neste momento, aumentar, por exemplo, os prazos dos contratos a termo? Por que razão é que se vai voltar a dizer que ser jovem é uma razão para ser contratado a termo?", pergunta a ex-ministra, que salienta: "Uma negociação e um diálogo têm de ter as várias partes envolvidas e, quando não têm, percebo que as partes tenham de colocar a sua voz para serem ouvidas".
No mesmo sentido, a ex-ministra do PS e atual vereadora da Câmara Municipal de Sintra insiste que é" fundamental" num tema "crucial da nossa vida" que haja capacidade dialogar: "Um diálogo real e que haja, acima de tudo, capacidade de perceber as razões e as motivações pelas quais se implementam determinadas medidas. O mundo do trabalho tem desafios brutais e, cada vez mais, olhamos para a transição digital, para a transição tecnológica, para a transição verde e para tantos desafios tão grandes".
Chega admite viabilizar proposta do Governo, mas pede "cedências" a Montenegro
Para Rita Matias, a proposta de alteração à legislação laboral que foi apresentada pelo Governo tem muitas falhas, mas a deputada e dirigente do Chega garante que há disponibilidade para negociar e para viabilizar a proposta na Assembleia da República.
"O Chega tem sido muito claro no debate em curso e, tendo em conta que ainda estamos em período de negociação com trabalhadores e com partidos, parece-me que é precoce fazermos ameaças de greve e de paralisações que em nada vão trazer resultados para o país, nem para os próprios trabalhadores", disse, na Antena 1.
De acordo com a deputada, são vários os pontos de divergência onde há caminho para dialogar e chegar a um entendimento, como são disso exemplo os mecanismos que possibilitam a deteção de casos de doença fraudulenta: "Porque penaliza os trabalhadores, mas penaliza também as empresas e as entidades laborais".
"Somos favoráveis à redução do número de horas de formação, que muitas das vezes sabemos que são expedientes para dificultar ainda mais a vida dos trabalhadores. Somos favoráveis à revisão dos serviços mínimos, portanto, neste caso, uma alteração à lei da greve para garantir, por exemplo, que em situações como as que tivemos o ano passado, de paralisação do INEM, não perdemos vidas. Somos favoráveis à redução do período experimental, que sabemos que muitas das vezes é um expediente que é utilizado para manter os trabalhadores em precariedade, mas também somos absolutamente contra qualquer alteração que seja na diminuição de direitos das mulheres no tema da perda gestacional", assinalou a dirigente do partido de André Ventura.
Rita Matias assegura ainda que o Chega "não ficará na história" como o partido que "deu a mão à AD" e defende que a história recente mostra o contrário. Quanto à negociação, a dirigente garante boa-fé e disponibilidade.
"Se o Governo quiser contar com a aprovação na Assembleia da República, sabe com que linhas se tem que cozer e o que é que o Chega quer deixar cair. Se não deixarem cair, o Chega é muito claro e, naturalmente, não acompanha".
PCP não vê "nada de positivo" no pacote laboral do Governo: "Não tem reforma possível"
Na Antena 1, Vasco Cardoso, membro da Comissão Política do Comité Central do PCP, foi o mais vocal nas críticas ao anteprojeto do Governo e considerou que o ponto de partida foi demasiado negativo para os trabalhadores.
"Em mais de cem medidas, não há uma que se coloque do lado dos interesses de quem trabalha. Este pacote laboral não tem reforma possível. A opção que deve ser colocada é retirar o pacote laboral e abrir um espaço de algo para a valorização dos salários, da contratação coletiva, para a regulação dos horários de trabalho e para que os direitos dos trabalhadores sejam um elemento fundamental do desenvolvimento do país", afirmou o dirigente comunista.
No entender de Vasco Cardoso, a reforma que o Governo quer aprovar dá aos patrões "mais instrumentos para acumularem os milhares de milhões de lucros que estão a acumular" e representa uma afronta aos trabalhadores no país.
"Temos cerca de dois milhões e meio de trabalhadores que recebem menos de mil euros por mês. Cerca de 1,9 milhões de trabalhadores que trabalham por turnos ou ao fim de semana ou em feriados. Temos níveis de precariedade absolutamente demolidores, com cerca de 80% dos contratos de trabalho recentes que foram criados a serem vínculos de trabalho precários. Temos uma média salarial que está a 60% da média que é praticada na União Europeia e, ao longo dos anos, tivemos mais de vinte alterações ao Código de Trabalho, sempre na lógica de que era preciso adaptar, flexibilizar e atender às novas realidades", argumentou.
Apesar das alterações à lei, sinaliza Vasco Cardoso, poucos foram os ganhos para os trabalhadores: "O grande patronato tem tudo na mão. Tem empresas de outsourcing, tem empresas de trabalho temporário, tem a possibilidade de ter contratos a prazo que muitas vezes se multiplicam. A contratação coletiva está bloqueada e os trabalhadores perguntam-se, e justamente, o que é que estas sucessivas alterações à legislação laboral trouxeram às suas vidas. Que cada um reflita sobre como é que é hoje a sua relação laboral, o que é que leva para casa e em que condições". O programa Entre Políticos, moderado pelo jornalista João Alexandre, contou ainda com a participação de Pedro Roque do PSD.