Passos Coelho alega que "não há alternativa" aos cortes

por RTP
"Só vamos sair desta situação empobrecendo", admitiu Passos, depois de assinalar que "não vale a pena fazer demagogia" Miguel A. Lopes, Lusa

As “medidas de natureza horizontal” aplicadas aos trabalhadores do Estado e pensionistas, em particular a suspensão dos subsídios de férias e de Natal, “são extremamente pesadas”, mas “não há alternativa ao caminho seguido”, argumentou esta terça-feira o primeiro-ministro. Ao encerrar uma conferência do Diário Económico dedicada aos desafios do Orçamento do Estado para o próximo ano, Pedro Passos Coelho quis demarcar-se da “demagogia”, para reconhecer que Portugal só vai “sair” da situação de crise “empobrecendo” em “termos relativos e absolutos”.

“Podíamos ter ido pelo lado do aumento da despesa, aumentando os impostos para todos e não apenas para os funcionários públicos e pensionistas. Mas isso era aumentar a receita e não cortar a despesa e isso seria visto como um caminho errado. Podíamos ver o nosso programa de ajuda financeira morrer em novembro”, sustentou Pedro Passos Coelho durante a intervenção que culminou os trabalhos da conferência promovida pelo jornal Diário Económico.“A cair”

O próximo ano é “o mais duro do ajustamento”. Mas “não será o último”. E “não vale a pena fazer demagogia sobre isto”, advertiu Pedro Passos Coelho. O país, sustentou, terá de empobrecer antes de recuperar “um trajeto de crescimento económico”.

“Nós sabemos que só vamos sair desta situação empobrecendo em termos relativos, em termos absolutos até, na medida em que o nosso Produto Interno Bruto está a cair”, reconheceu o primeiro-ministro.

“Se alguém souber de uma forma de diminuir a dívida, o défice, enriquecendo e gastando mais, digam, se fazem favor, porque todos nós estaríamos em condições de adotar essas medidas fantásticas”, desafiou.


Na antecâmara da reunião do Conselho de Estado convocada por Belém, o primeiro-ministro não fez qualquer referência direta ao Presidente da República, que, na passada quarta-feira, avaliou a subtração dos subsídios de férias e de Natal para pensionistas e trabalhadores do Estado com vencimentos mensais acima de mil euros como “a violação de um princípio básico de equidade fiscal”. Todavia, acabaria por dar nova réplica às críticas de Cavaco Silva com a garantia de que o Executivo não tem “nenhum prazer em penalizar seja quem for”.

Se os cortes dos subsídios tivessem sido alargados à esfera privada, argumentou Passos Coelho, “dificilmente esse exercício seria considerado credível no exterior”. “Fazer este agravamento fiscal iria penalizar ainda mais o esforço de recuperação da economia que tem de ser feito do lado privado”, continuou o governante, citado na edição on-line do Diário Económico. Por outro lado, “toda a área privada ainda precisa de fazer reajustamentos”, uma vez que “não foi só o Estado que se endividou”.

“Injustiça é relativa”
Na mesma linha, Passos reconheceu que “os funcionários públicos” vão ser chamados a “pagar uma parte significativa do esforço”. “Eles e os pensionistas”, admitiu. Porém, para o primeiro-ministro, “é relativa” a questão da “injustiça”. “Volto a dizer que o desemprego vai aumentar e as empresas têm dificuldades de financiamento, mas precisamos dos privados para alavancar o crescimento económico”, insistiu.

O primeiro-ministro parte da perspetiva de que “o modelo de desenvolvimento económico e de investimento público, que não dá qualquer retorno, que insistia na ideia de apoios para tudo, está a condenar” o país “ao fracasso”. Para advogar que o “caminho está por escrever”: “Sem solução para a crise, países como Portugal vão ter mais dificuldades. Jogamos o nosso destino em várias frentes”.

Ainda assim, contrapôs Pedro Passos Coelho, “podemos fazer tudo bem em Portugal e isso não chegar para recuperar a economia”. “Temos essa noção”, confessou o governante, para quem é crucial “mudar alguns fundamentos do regime económico”. O que passará pela aprovação, já na próxima semana, de “novas orientações sobre os gestores públicos e os gabinetes ministeriais”. Isto para pôr cobro a um “Estado paralelo que é construído dentro dos gabinetes dos ministros”.

“Não temos margem para negociar”
Quanto à discussão da proposta de Orçamento do Estado para o próximo ano, o primeiro-ministro sublinha que, em matéria de “opções fundamentais” e “medidas mais polémicas”, não há “margem para negociar” com os socialistas. Até porque as políticas de base estão condicionadas pelo pacote de resgate financeiro definido com o Fundo Monetário Internacional e a União Europeia.

“Mas estamos abertos a toda a negociação e a toda a conversação com o Parlamento e, claro, em especial com o PS”, afirmou Passos Coelho, sem deixar de frisar que seria “seria bom que o país fosse poupado a qualquer ideia de que o Governo à segunda-feira ou à quinta está disponível para adotar medidas extremamente difíceis, mas que têm de ser concretizadas para que as nossas metas sejam atingidas, e depois ao sábado, domingo ou à segunda-feira estivesse a repensar medidas em que pensou muito maduramente e que só adotou por saber que não tem alternativa para elas”.

A intervenção do primeiro-ministro abordou ainda o tema da recapitalização da banca. É também na próxima semana, segundo Passos, que o Conselho de Ministros aprova as regras que vão enquadrar o acesso à linha de 12 mil milhões de euros do programa de resgate. Na sua ótica, “será difícil que toda a banca dispense aceder a esta possibilidade”. E a verba vai ser suficiente “para acorrer a esta necessidade de recapitalização dos bancos”, que vai “ocorrer em toda a Europa” e não “estritamente em Portugal”.

“O Estado não tenciona envolver-se na gestão dos bancos, não tenciona nacionalizar os bancos nem ser dono de bancos. O Estado será um agente passivo, o que não quer dizer que não transporte recomendações, como aquelas que foram feitas em termos europeus, de não distribuição de dividendos no caso de dinheiro público ser injetado no capital dos bancos. Isso parece-me evidente”, enfatizou.
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