Populismo é o irmão gémeo da democracia e não um filho bastardo - investigador

por Lusa

O investigador português José Filipe Pinto considera que o populismo crescente nas sociedades europeias é "o irmão gémeo da democracia" e não o seu "filho bastardo", traduzindo-se num voto de protesto que se estende da extrema-esquerda à extrema-direita.

Professor catedrático da Universidade Lusófona de Lisboa e Investigador Coordenador do Centro de Investigação em Ciência Política, Relações Internacionais e Segurança (CICPRIS) da mesma instituição, José Filipe Pinto apresenta na sexta-feira o livro "Populismo e Democracia - dinâmicas populistas na União Europeia".

"No livro analiso as definições que têm sido feitas do populismo e construo a minha própria definição, desmontando os mitos. Para isso sirvo-me de dois índices: o índice de populismo do sueco Andreas Heino - da Fundação Timbro - e o índice de democracia do The Economist", explicou o professor à Lusa.

O índice de populismo da Fundação Timbro contabiliza o número de mandatos (deputados eleitos) conseguidos pelos partidos populistas nas várias eleições na Europa, levando também em consideração se estes formam ou não Governo.

A Hungria, por exemplo, surge neste ranking como o país mais populista da União Europeia, com 66%.

"É o único país em que tanto o partido detentor do poder como o principal partido da oposição são ambos populistas: o Fidesz e o Jobbik. Ou seja, a alternância será feita entre populistas", disse João Filipe Pinto.

Para o investigador, o populismo define-se pela criação de um "antagonismo entre a elite e o povo", mas em que ambos os lados "são considerados homogéneos".

Por outro lado, há uma mudança de um paradigma em que os cidadãos reconhecem autoridade aos detentores do poder (lógica diferencialista) para uma nova situação "em que aqueles que dizem representar o povo não reconhecem autoridade aos detentores de poder" (lógica equivalencial).

"Nessa perspetiva o populismo acaba por acompanhar a democracia desde sempre. (...) O populismo é um irmão gémeo da democracia: pode haver populismo sem democracia e este pode até destruí-la, mas não há democracia sem populismo", afirmou o professor.

"O que eu tento provar é que os países com bons índices de desenvolvimento humano, onde a crise não se fez sentir, seriam países nos quais não seria expectável encontrar populismo se este fosse o filho bastardo da democracia", realçou.

É o caso da Dinamarca. "A natureza humana fez-nos competitivos e por isso encontraremos sempre qualquer motivo para reclamar. Só isso explica que países que têm tudo, um Estado social de altíssima qualidade, como a Dinamarca, tenham um índice de populismo de 28,9%", salientou.

João Filipe Pinto também rejeitou a ideia de que o fenómeno descreve apenas os movimentos de extrema-direita ou de direita.

"O facto de a Hungria ter um populismo de direita e a Grécia um populismo de esquerda faz cair por terra o mito que relaciona o populismo com a extrema-direita. Existem partidos populistas de extrema-esquerda, como o Podemos, em Espanha, o Syriza, na Grécia, ou o Bloco de Esquerda, em Portugal", exemplificou.

O professor também realçou que o fenómeno tem vindo a crescer exponencialmente. No ano 2000, na Polónia, o populismo era de 0,1% e hoje é de 46,4%. Na Hungria, era de 9,6% e hoje é 66,4%, adiantou o investigador, considerando que "o que distanciou o eleito do eleitor" foi "o mau desempenho dos eleitos", dos partidos tradicionais.

"O mau desempenho dos eleitos - e isto não é um discurso anti-partidos - foi o responsável por este descontentamento popular. Que depois se traduziu num voto de protesto e nas vozes encantatórias, que conseguem identificar-se como os representantes do povo", sublinhou.

Os partidos tradicionais, disse, "é que ainda não quiseram perceber que são eles os responsáveis pela criação do irmão gémeo".

 

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