O SUL

A Argentina, o exílio, o regresso, as memórias, a nostalgia e o tango, sob a música de Piazzolla e num belo filme de Solanas

Em 1983, com a queda da ditadura militar da Argentina, Floreal, um preso político, é libertado depois de cinco longos anos na prisão. A sua mulher, Rosi, espera-o impacientemente em casa, mas Floreal decide errar pela cidade. Buenos Aires mudou. A Argentina mudou. Ele próprio mudou. Ao som de tangos, Floreal encontra amigos, reais e irreais, desaparecidos ou mortos, como El Negro, que lhe mostra cenas do passado, o destino de muitos que foram presos, torturados e traídos, e mesmo caso de amor da mulher com Roberto. Por seu lado, Rosi evoca a angústia da busca do paradeiro do marido, de prisão em prisão através do país, e acaba por ir ao seu encontro.

O exílio de Fernando Solanas em França permitiu-lhe tratar o tema no seu belíssimo ¿Tangos: O Exílio de Gardel¿, que retratava o percurso dos argentinos obrigados a fugir do seu país. Em 1988 voltou, em certa medida, ao tema do exílio mas do exílio interior, a partir das memórias e evocações, imaginadas e reais, de um preso político que erra por Buenos Aires na noite da sua libertação, ao som da portentosa música de Astor Piazzolla. Solanas voltava-se agora a sul e para um país renascido na esperança e na liberdade, onde as feridas da ditadura, da violência e da crueldade dos exílios internos jamais serão esquecidas. Uma bela e fascinante evocação sentimental, que é tão política quanto poética, tão real e onírica quanto fascinante e violenta, construida com o fabuloso domínio plástico e a sensibilidade de um admirável criador a quem o cinema serviu sempre para dar uma notável dimensão pessoal às ideias e aos sentimentos de um homem dividido pela política e dilacerado pela nostalgia do seu país, dos tangos, da liberdade e da esperança a sul.