Comunidade "portuguesa" de Aceh sobreviveu aos maremotos

por Eduardo Lobão, Agência LUSA

Muito poucas pessoas de uma comunidade de cerca de 400 poderão ter sobrevivido ao sismo e aos maremotos que atingiram a ilha indonésia de Samatra no passado dia 26 de Dezembro, disse quinta-feira o embaixador de Portugal, José Santos Braga.

Contactado telefonicamente de Díli pela Lusa, o embaixador informou que visitará oficialmente Aceh entre os dias 22 e 24, tencionando deslocar-se a Lamno, pequena localidade onde estava radicada a comunidade conhecida localmente por "portugueses".

Eram assim conhecidos por causa dos traços fisionómicos europeus e a pele mais clara que apresentavam. As mulheres eram conhecidas como "mata-biru" (olhos azuis), sendo frequentes vezes apontadas como exemplo da grande diversidade étnica da Indonésia.

Lamno, sede de um subdistrito em Aceh Jaya, situa-se no sopé de uma colina perto do mar e os seus habitantes dedicavam-se em grande parte à pesca.

De acordo com José Santos Braga, esta ligação a Portugal continua a suscitar interesse, como recentemente se confirmou com a publicação de artigos no jornal "Waspada", de Medan, e na edição de hoje do "Jakarta Post", na capital indonésia.

"Vai ser importante ver quantos elementos da comunidade restam, o que resta de Lamno e ter naturalmente em conta os planos de reordenamento de aglomerados populacionais que o governo da Indonésia está a preparar em articulação com as Nações Unidas e a comunidade internacional", salientou o diplomata.

De Lamno, ainda sem contactos regulares com Aceh, parece restarem apenas destroços de habitações e 30 das cerca de 300 pequenas embarcações de pesca.

Os sobreviventes confirmados da comunidade de "portugueses" de Lamno são Jamaluddin Putih, de 40 anos, pescador, que se encontrava no mar na altura dos maremotos, a mulher e dois filhos, uma criança de oito anos, referenciada pelo jornal "Waspada", e uma anciã de 80 anos, identificada como Cut Pudo.

Segundo a edição de hoje do "Jakarta Post", Cut Pudo foi arrastada vários quilómetros pelas ondas, mas miraculosamente salvou- se, tendo sido transportada por um helicóptero militar para uma clínica. Presentemente, está a ser tratada por uma equipa dinamarquesa de ortopedia em Darussalam, Banda Aceh.

"Um mês depois do desastre, ela parece recomposta, mas ainda traumatizada e confusa, e estava a chorar quando a encontrámos numa tenda de um hospital de campanha. Ela apenas fala o dialecto de Aceh e, segundo os seus parentes, parece ter esquecido o seu verdadeiro nome", escreve o jornalista indonésio do "Jakarta Post".

Nas declarações à Lusa, o embaixador de Portugal em Jacarta mostrou-se convencido de que os portugueses não deixarão de voltar a manifestar mais uma vez a sua solidariedade.

"Estou convencido de que se encontrará uma forma de os portugueses manifestarem uma vez mais a sua solidariedade para com as vítimas daquela catástrofe", disse.

Quanto ao facto de nunca ter sido dado qualquer tipo de apoio a Lamno antes da tragédia de 26 de Dezembro, José Santos Braga assinalou que "as relações com a Indonésia atravessaram fases muito complicadas até há bem pouco tempo".

"Por outro lado, a situação de grande instabilidade política e social no Aceh não permitia que se fizessem deslocações àquela parte da Indonésia", acrescentou.

Durante a sua deslocação a Aceh, o embaixador de Portugal manterá contactos com as autoridades locais, civis e militares, e com os serviços de coordenação da ajuda humanitária das Nações Unidas.

"Além disto, encontrar-me-ei com a segunda equipa de médicos portugueses que têm um hospital de campanha em Banca Aceh. Procurarei também encontrar-me com o pequeno Martunis, e família", adiantou José Santos Braga, referindo-se à criança descoberta vários dias depois da tragédia, deambulando sozinha numa praia e envergando uma camisola da selecção nacional de futebol.

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