Veados renascem na Serra da Lousã

Extintos desde o século XIX, os veados estão de regresso à Serra de Lousã. Estes animais passeiam agora pelos verdejantes campos da região serrana entre Coimbra e Leiria. Outrora caçados até à extinção pelo Homem, hoje são mais de três mil os Cervus elaphus (veados vermelhos), graças a um projeto coordenado pela Unidade de Vida Selvagem do Departamento de Biologia da Universidade de Aveiro.

Tudo começou em 1995, após o restabelecimento do habitat e do ecossistema natural da região. mas faltavam algumas espécies dominantes nesta mata. O veado era uma delas. No início deste projeto foram introduzidos 120 veados provenientes da Zona de Caça Nacional da Contenda e da Tapada de Vila Viçosa, até 2004.

Passados mais de 20 anos, esse número aumentou - e muito -, tornando-se o Cervus Elaphus um dos animais mais acarinhados por biólogos, amantes da natureza e turistas.

A reintrodução pôs cobro à extinção dos animais, como explica Carlos Fonseca, biólogo e coordenador da Unidade de Vida Selvagem.

"O objetivo é devolver à Lousã uma espécie emblemática extinta por ação do Homem e voltar a ter na região centro de Portugal aqueles animais em estado selvagem", acrescenta.


A fácil adaptação dos veados levou ao sucesso do projeto. A população destes animais na Serra da Lousã aumentou em mais de 300 por cento nos últimos 20 anos, um crescimento que os promotores da reintrodução consideram um sucesso.

"É um dos maiores êxitos nacionais e europeus entre os programas de fomento e conservação da biodiversidade", congratula-se Carlos Fonseca.

Os animais são de grande porte, podendo mesmo atingir os 180 quilos e chegar aos dois metros de altura. Os machos, conhecidos pelas grandes hastes, são um ponto de atração que leva muitos visitantes à Serra da Lousã.
"Os veados vermelhos acabam por chegar perto de casas, alimentam-se nas hortas e explorações agrícolas".
Apesar de tudo, esta reintrodução gerou alguns conflitos com a população vizinha. Para amenizar a situação, já estão a ser discutidas estratégias de gestão integrada a nível social, onde participem as autarquias, entidades gestoras da zona de caça e o próprio Instituto da Conservação da Natureza.

Até à data, os veados não estão sujeitos a ameaças iminentes de predadores naturais. No entanto, a sua expansão para a Serra da Estrela pode vir a ser um problema, por se estarem a aproximar de alcateias identificadas naquela zona.

"Predadores naturais nesta parte da cordilheira [Lousã] não existem, apesar de muitas vezes alguns habitantes locais dizerem já ter visto lobos. O facto é que o lobo não está confirmado nesta região", afirma o biólogo.

Além da caça, o regresso a casa dos veados veio dinamizar o potencial económico e turístico da região, especialmente na época de acasalamento, que ocorre entre setembro e outubro.

"O veado é hoje em dia, definitivamente, um ex-libris de toda a Serra da Lousã", garantem os biólogos envolvidos.

Por agora, a equipa da Universidade de Aveiro responsável pela reintrodução dos veados quer garantir a melhoria da monitorização científica continuada da população, a gestão de conflitos com os humanos e a articulação da caça ao veado com a caça a outras espécies que coabitam na serra.

A reprodução registada destes veados é de uma cria por fêmea. Hoje há mais de três mil animais em estado selvagem espalhados por uma área de 100 mil hectares, delimitada pelo Rio Mondego a norte e pelo Zêzere a sul. O facto é que os veados estão a expandir-se para nordeste através da cordilheira central, numa zona em que a despovoação humana permite à espécie crescer sem os conflitos que ocorrem em zonas mais povoadas.

O projeto em curso, da autoria de Carlos Fonseca, Ana Valente, Jorge Valente e Rita Torres, do Departamento de Biologia e do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar, foram agora publicados na revista "International Journal of Biodiversity Science, Ecosystem Services & Management".

O reencontro com a natureza destes animais é visível numa fotogaleria fornecida por Maria Augusta Pinto, colaboradora da Universidade de Aveiro.