Mafra. Cultura descarta culpas no atraso de requalificação dos sinos

por Andreia Martins - RTP
Nuno Patrício - RTP

A Direção-Geral do Património Cultural (DGPC) explica que o envio de documentos para o Tribunal de Contas (TdC) para dar avanço às obras nos sinos do Palácio Nacional de Mafra, que estão em risco de queda, está condicionado por “formalismos processuais que não dependem do Ministério da Cultura”, relacionados com a mudança do ano económico e com a Lei do Orçamento. Antes, o TdC tinha esclarecido que está há dois meses à espera de documentos por parte da tutela para dar seguimento à obra. A RTP tentou obter esclarecimentos junto do Ministério das Finanças mas ainda não conseguiu qualquer resposta.

Em reação à notícia desta quarta-feira sobre o atraso na requalificação dos sinos e carrilhões do Palácio Nacional de Mafra, a Direção-Geral do Património Cultural, que interditou o espaço junto à entrada devido ao risco de queda de parte da estrutura, diz que o avanço das obras está dependente de “formalismos processuais”.
 
Numa resposta por escrito enviada à RTP, a DGPC esclarece que “a resposta ao pedido de envio de documentação feito pelo Tribunal de Contas a 19 de dezembro aguarda somente pela conclusão de formalismos processuais e autorizações que não estão na dependência do Ministério da Cultura, relacionados com a mudança do ano económico”.

À agência Lusa, a mesma entidade acrescenta que essas formalidades estão também ligadas "à Lei do Orçamento”. 

Sobre esta questão, a RTP entrou em contacto com o Ministério das Finanças e não obteve qualquer resposta até ao momento.  

A reação da Direção-Geral do Património Cultural chega no seguimento de um esclarecimento do Tribunal de Contas, que disse esta quinta-feira que aguarda o envio de dados por parte da DGPC há mais de dois meses.   

A informação em causa é necessária para decidir sobre o avanço das obras nos sinos do Palácio Nacional de Mafra. O risco de queda por degradação dos carrilhões obrigou à interdição da circulação com um conjunto de baias colocadas junto às torres sineiras desde a semana passada.  

"O processo deu entrada no Tribunal de Contas no dia 2 de novembro de 2017 e, neste momento, encontra-se devolvido aos serviços [da DGPC] para esclarecimentos, desde o dia 19 de dezembro de 2017", disse a entidade em resposta à agência Lusa.
 
Segundo explica o tribunal, o visto necessário para o início das obras nos sinos e carrilhões foi pedido a 2 de novembro e devolvido à DGPC a 23 de novembro de 2017, com pedido de mais esclarecimentos. O pedido voltou a ser feito a 15 de dezembro e mais uma vez devolvido a 19 de dezembro.  
 
À agência Lusa, o Tribunal esclareceu que dispõe de 30 dias úteis para se pronunciar sobre o um processo desta natureza onde é necessário um visto, mas que essa contagem volta à estaca zero quando são pedidos novos elementos e retomada quando há resposta por parte do requerente.  
 
Esta foi a reação do TdC às declarações da diretora-geral do Património Cultural, Paula Silva, que na quarta-feira disse à RTP que as obras ainda não avançaram porque aguardam a aprovação do Tribunal de Contas.  
 
“Neste momento estamos à espera de documentos para o Tribunal de Contas nos dar o visto para nós podermos de imediato iniciar a obra”, justificou.  
 
A diretora-geral do Património explicou que a assinatura do contrato com o empreiteiro que ganhou a obra foi feita em outubro de 2017. O mesmo foi confirmado à RTP esta quinta-feira pelo diretor do Palácio Nacional, Mário Pereira.
 
O responsável confirma que o processo de restauro “se arrasta há bastante tempo” e que o “primeiro sinal da cedência das estruturas é de 2004”.

“Desde 2004 que tem havido naturalmente um agravamento da situação, devido à cedência das madeiras e à corrosão dos metais”, diz o diretor, referindo-se à estrutura em volta dos sinos que sustenta e faz o escoramento dos carrilhões.
"Documentos têm de ser autorizados pelo Ministério das Finanças"
A candidatura ao fundo de salvaguarda, fundo que permite fazer obras urgentes, foi feita logo em 2013. Esse fundo, destinado para obras em perigo de segurança para pessoas e bens, conheceu concurso para adjudicação do empreiteiro em finais de 2015 mas só dois anos depois foi assinado.  

O compasso de espera para o início da obra já dura desde novembro. Segundo a diretora-geral, em declarações na quarta-feira à RTP, o atraso no avanço da obra está relacionado com a mudança do ano económico e com a necessidade de “pedir outros documentos que têm de ser autorizados pelo Ministério das Finanças, documentos que são necessários apresentar novamente ao Tribunal de Contas com a data de 2018”.  
 
Também em declarações à RTP, o presidente da Câmara de Mafra, Hélder Sousa Silva, referia que o concurso público “ainda carece de um visto do Tribunal de Contas e de uma portaria de extensão de encargos. Certo é que essa portaria nunca mais sai, o visto nunca mais sai, a obra nunca mais avança”, referiu.  

Nas duas torres do Convento de Mafra, cada uma com 50 metros de altura e com cerca de trezentas toneladas de peso no seu conjunto, abriga-se um dos conjuntos sineiros musicais mais antigos do mundo, inseridos num monumento histórico do barroco português que em 2017 assinalou o tricentenário da colocação da primeira pedra.  

A obra de recuperação dos carrilhões deveria ter estado pronta nessa altura, até porque alguns dos 119 sinos, alguns com 12 toneladas de peso, foram alvo de escoramento desde 2004. Uma solução que deveria ter sido de caráter provisório mas que se prolongou no tempo, o que deu origem ao desgaste e apodrecimento das estruturas de suporte.

“Primeiro (a obra) era para estar pronta a 17 de novembro de 2017, depois já era para começar durante o ano de 2017, podendo não estar pronta aquando da comemoração do tricentenário. Hoje ninguém nos diz nada, ninguém sabe quando é que as obras começam”, assinalava Hélder Sousa Silva.   
 
“Os dois carrilhões são um instrumento único que existe no mundo e que há cerca de dez anos a esta parte estão completamente silenciados. A Câmara naturalmente não pode deixar de lamentar profundamente esta situação”, sublinhava ainda o autarca.  

O Palácio Nacional de Mafra é desde o final de 2017 monumento é candidato a património mundial, constando numa lista sobre os quais a UNESCO só deverá decidir em 2019.  

Em 2014, a organização de defesa do património Europa Nostra alertou para o avançado estado dos carrilhões, que considerou um dos sete locais relacionados com cultura mais ameaçados da Europa.  

No ano seguinte, a DGPC lançou um concurso de 2,5 milhões de euros para o restauro dos sinos e carrilhões. Ontem, em declarações à RTP, a diretora-geral do Património esclareceu que a obra terá um custo de um milhão de euros e deverá durar dois anos. Paula Silva esclareceu ainda que o aluguer da estrutura que faz o escoramento dos sinos custa 40 mil euros por ano e, por essa razão, é de todo o interesse da tutela avançar com a obra “o mais rapidamente possível”. 
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