Mulheres que Contam. Isabel Alçada e Ana Maria Magalhães

por Silvia Alves - RTP

Isabel Alçada e Ana Maria Magalhães são professoras reformadas e escritoras no ativo. Formam uma dupla imbatível há 40 anos, colorindo a vida de várias gerações com a coleção "Uma Aventura", entre outras obras.

São ambas irmãs mais velhas, habituadas a mediar conflitos e, na escrita a “quatro mãos”, sabem ler as divergências como um enriquecimento.
 
Como verdadeiras repórteres, viajaram, visitaram, mergulharam nos ambientes que depois reproduzem nas suas histórias e, ainda hoje, encarnam com notório entusiasmo as suas personagens – são aventuras prazerosas em que, muitas vezes, se apanham a rir do que escrevem.
E porque é quase como escrever para os filhos ou netos, na escrita tentam passar os princípios e valores que prezam, sem darem lições de moral. Para quem tenha dúvidas de que o mal nunca prevalece, encarregam-se de tornar o vilão da história pouco atraente, nem que seja malcheiroso…

A sua própria aventura começou quando, já como colegas, resolveram partilhar ideias sobre como motivar e interessar uma turma especialmente difícil. Daí a escrever histórias motivadoras foi um salto, e o que dizer 40 anos depois desta primeira que se tornou dezenas de aventuras e se traduziu em milhões de leitores?

Isabel Alçada é clara, “os livros são bons se interessarem aos leitores, é preciso que o leitor descubra o livro de que gosta”. Ana Maria Magalhães acrescenta “não há nada pior em educação do que a aldrabice”. Se os alunos rejeitam uma obra, é preciso saber cativá-los com outra. Porque o que se pretende é que as pessoas leiam, e com prazer – sem cânones, porque “o prazer de ler é uma condição essencial para que as crianças decidam ler, exercitem a leitura e se tornem leitores”.

Para lá do lúdico, ou do programa escolar obrigatório, há uma ciência da leitura – na qual, aliás, se baseia o Plano Nacional de Leitura.

Isabel Alçada partilha as suas ideias:

“Todos os seres humanos têm o direito à leitura e partilham o potencial inato para aprenderem a ler. Mas todos precisam do processo de aprendizagem formal, assegurado pela escolarização.

No século XXI, apesar de nas constituições da maioria dos países figurar a garantia de escolarização universal, ainda subsistem desigualdades que impedem muitas crianças, jovens e adultos de dominarem plenamente a leitura. Tanto os Estados, como as organizações internacionais que os congregam e muitas organizações da sociedade civil têm procurado lançar políticas e iniciativas para erradicar o analfabetismo e assegurar a todos os cidadãos o inestimável poder conferido pela leitura.

As políticas públicas de leitura que apresentam consistência e sustentabilidade definem com clareza as questões e os problemas a que procuram dar resposta e estruturam-se com base em parâmetros que visam assegurar-lhes eficiência e eficácia.

Para os professores, como aliás para quem direta ou indiretamente participa na promoção da leitura, é interessante abordar as múltiplas vertentes das políticas de leitura e verificar como os resultados da investigação são hoje indispensáveis para analisar problemas, fundamentar decisões e avaliar os resultados da intervenção política.

O poder e o valor da leitura no século XXI

Quem gosta de ler não duvida de que a leitura confere um poder extraordinário pois, em qualquer momento e em qualquer circunstância, dá acesso a conhecimentos, experiências, reflexões, convicções, sentimentos, desejos ou sonhos de quem, nos mais variados locais da terra e nas mais variadas épocas da história, decidiu usar a escrita para comunicar. Munidas do poder de ler, as pessoas alargam horizontes e conseguem vencer barreiras do espaço e do tempo.

As sociedades contemporâneas utilizam a escrita como instrumento basilar da cultura e da ciência, da atividade económica e política, da comunicação, da vida quotidiana, o que coloca a leitura no centro das competências chave indispensáveis aos cidadãos do século XXI. Dominar a leitura tornou-se por isso uma exigência universal e um indicador de desenvolvimento.

A leitura é uma permanente fonte de aprendizagem e conhecimento, permitindo o desenvolvimento pessoal nas suas dimensões intelectual, ética, cívica, estética, com efeitos multiplicadores do potencial humano. As crianças, tal como os adolescentes, encontram-se na fase da vida em que a aprendizagem é a atividade principal. Nesta fase, têm absoluta necessidade de ler para se desenvolverem, para aprenderem e avançarem no sistema de ensino. Um insuficiente domínio da leitura afeta o desenvolvimento cognitivo, pois não só dificulta a aquisição de conhecimentos, como tem consequências comportamentais e motivacionais que inibem o desempenho em várias atividades escolares.

Quanto aos adultos, têm cada vez maior necessidade da leitura para se ajustarem aos desafios atuais, em todas as dimensões da vida pessoal, familiar, profissional e cívica.

Vários estudos chamam a atenção para o facto de a leitura, além de potenciar a aquisição de informação, constituir um instrumento essencial da reflexão crítica, com efeitos no modo como a pessoa analisa o passado, como antecipa o futuro e como toma decisões.

O Plano Nacional de Leitura (PNL)

Em Portugal, o Plano Nacional de Leitura (PNL) obteve resultados comprovados pelos estudos de avaliação, realizados durante uma primeira fase de dez anos (2006- 2011), e pelos resultados obtidos pelos alunos portugueses nos estudos PISA e PIRLS, que a
partir de 2009 se situaram acima dos obtidos em avaliações anteriores.

Como meta o PNL visa atingir resultados gradualmente mais favoráveis nos estudos internacionais de avaliação de literacia. Como metodologias de intervenção segue orientações internacionais, nomeadamente as seguintes recomendações da EU: tomar a evidência científica como suporte da definição de programas; suscitar a adesão e a mobilização dos atores centrais – docentes, professores bibliotecários, bibliotecários, famílias e ampliar o seu conhecimento acerca da leitura; celebrar parcerias; avaliação externa.

Texto publicado pelo PNL na sequência da pandemia

A recuperação de aprendizagens que a pandemia impediu aconselha que os docentes do 1º ciclo deem um enfoque especial ao desenvolvimento da leitura e da escrita e procurem avaliar em que situação se encontra cada um dos seus alunos.
 
A aprendizagem da leitura e da escrita é, sem dúvida, um dos domínios essenciais, que exige uma atenção especial, pela sua transversalidade e pela forma como afeta o trabalho nas restantes áreas curriculares.
 
As aprendizagens essenciais identificam os conhecimentos, capacidades e atitudes que a escola deve assegurar em cada ano de escolaridade na área curricular de língua portuguesa. Essa identificação constitui uma referência importante para que os docentes possam avaliar em que medida cada um dos seus alunos se encontra longe ou perto das aprendizagens a atingir, nos vários domínios: compreensão do oral; expressão oral; leitura; educação literária; a expressão escrita; conhecimento explícito da língua.
 
Convém, contudo, não esquecer que o objetivo central das atividades de ensino da leitura é assegurar um domínio progressivamente mais seguro da compreensão.
 
No início da escolaridade, o trabalho na sala de aula tem um impacto decisivo aprendizagem inicial da leitura e, para garantir que todas as crianças durante o 1º ciclo dominam a compreensão da leitura, é indispensável que a escola lhes proporcione oportunidades para realizar múltiplas aprendizagens que estão na base da leitura e à escrita. No entanto, a aquisição de uma competência sólida exige uma prática constante que promova um desenvolvimento gradual, pois o nível de compreensão que as crianças vão adquirindo não depende apenas do ensino, mas também do tempo que dedicam à leitura, do contacto com diferentes tipos de livros e da valorização que o professor atribui à atividade leitora.
 
A evidência comprova que o sucesso na compreensão dos textos está diretamente relacionado com o tempo efetivamente dedicado à leitura de livros, tanto na aula como em tempo livre. E como o interesse e a motivação das crianças para a leitura condicionam de forma decisiva o tempo que ocupam com livros, cabe à escola um papel relevante na promoção do gosto pela leitura para assegurar os progressos na compreensão.
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