Mulheres que Contam. Manuela Ralha

por Silvia Alves - RTP

Vereadora na Câmara Municipal de Vila Franca de Xira nos departamentos de Cultura e Direitos Sociais.

Se há uma ideia que define Manuela Ralha é “sê inteiro, sê todo em cada coisa que fazes”.
E Manuela Ralha é uma mulher inteira, íntegra. Porque o mundo é complexo, luta pela diversidade, e diversidade implica pensar, implica ter noção da necessidade do outro – e luta contra a ditadura do normativo, em que se vive numa realidade que não é a nossa. Luta contra a discriminação, contra todas as discriminações, contra todos os patamares da discriminação.
Viver a nossa verdadeira realidade é um acto de liberdade, que dá trabalho – implica olhar para dentro e percebermos quem somos. E para isso é preciso coragem moral e intelectual para chegar à essência das coisas, e de si. E, muitas vezes, implica fazer travessias no deserto. Mas, se formos livres na nossa essência, na nossa cabeça, não há nada que nos prenda…

Manuela Ralha tem o pelouro da Cultura e Acção Social na Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, onde reencontra muitos problemas que já os neo-realistas narravam e retratavam.

A exposição "A Família Humana" no Museu do Neo-Realismo expõe realidades que ainda hoje se mantêm.

“Se formos a ver, temos exemplos como nos ‘Feios, Porcos e Maus’, na nossa sociedade e perfeitamente actuais, a violência doméstica continua a ser um flagelo, a subordinação do homem sobre a mulher continua a existir, as famílias em que a mulher continua a ser a cuidadora principal, a ter de abdicar da sua vida para se dedicar ao cuidado do filho e da família continua, a miséria humana é exactamente a mesma, continuamos a ter as situações de abuso sexual, de abuso sobre crianças, a questão de não cuidado, da falta de afectividade.”

Sobre o mundo actual, Manuela Ralha comenta: “Nós hoje vivemos num tempo e num mundo que vive demasiado rapidamente, numa velocidade sobrenormal, vivemos demasiado depressa, aquilo que hoje é uma coisa, amanhã já não é, já não nos interessa, ou já perdemos o interesse, e perdemos a noção de que precisamos de tempo para saborear e gerir o mundo e a sociedade à nossa volta.”

Pensa que aos jovens não é dado tempo nem oportunidade de olhar para dentro para descobrirem quem são – que toda a normativização acaba por criar sérios problemas de personalidade e na área da saúde mental. Porque um jovem, em desequilíbrio interno, sofre de depressão, ansiedade – na sociedade, estes desequilíbrios traduzem-se em pessoas dependentes de barbitúricos, de medicamentos e terapias.

A Cultura pode ser uma das portas abertas para a diferença porque, segundo diz, “o papel da Cultura é, sobretudo, a criação de pensamento crítico. Ou seja, pôr a pessoa a pensar, pensar em si, pensar no outro, na sua envolvente. A pensar e a sentir.” E é preciso apostar na Educação.

No centro de tudo, na realidade, trata-se de relembrar os valores absolutos da dignidade humana, do respeito pelos direitos do Homem.
Em 2004, Manuela Ralha sofreu um acidente que lhe colocou um enorme desafio: o de descobrir a pessoa que nasceu naquele acidente. Da experiência tirou, sobretudo, uma forma de estar na vida mais perto dos seus próprios valores. Saiu reforçada enquanto ser humano, e essa força colocou-a ao serviço dos outros também – tornou-se activista pelos direitos das pessoas com deficiência.

Foi sócia-fundadora e presidente da Direção da Mithós-Histórias Exemplares, Associação de Apoio à Multideficiência; membro fundador e elemento da Comissão Coordenadora do Movimento (d)Eficientes Indignados; Presidente do Conselho Fiscal do Centro de Vida Independente e membro da Comissão Coordenadora do “Sim, Nós Fodemos”.

Ainda hoje, no meio de múltiplos afazeres, é júri da Ação Qualidade de Vida da Associação Salvador.
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