O que foi o CR, "motor da Revolução" e "órgão executivo do MFA"

por Lusa
Lusa

O Conselho da Revolução (CR), que existiu entre 1975 e 1982, representou a institucionalização do Movimento das Forças Armadas (MFA), que derrubou a ditadura de 48 anos, num país que, por uns meses, viveu uma revolução.

Após a tentativa de golpe de 11 de Março de 1975, por forças de direita e que levou à fuga, para a Espanha, do general António de Spínola, primeiro Presidente após o 25 de Abril, foi criado o CR, o "motor da Revolução", a par da Assembleia do MFA.

É o órgão "de direção da revolução", como surge no comunicado final, ou "órgão executivo do MFA", como anuncia Vasco Lourenço, militar de Abril, após a assembleia dos 200, que criou o CR logo na noite do golpe e madrugada seguinte, 12 de março. 

Neutralizado o golpe, a primeira decisão, em 14 de março, foi nacionalizar a banca e as seguradoras, um "salto qualitativo no processo revolucionário", apontando um rumo por uma "via socialista", após meses de indefinição.

A posse dos 25 membros, Presidente da República, chefes militares membro da coordenadora do MFA ou o primeiro-ministro, aconteceu em 17 de março, e a sua composição foi sofrendo alterações ao longo do tempo.

Num país abalado pela libertação e fim da ditadura de quase meio século e por uma revolução nas ruas, as divisões eram grandes, entre forças de esquerda, extrema-esquerda, de centro e direita. E os principais partidos aceitaram a chamada Plataforma de Acordo Constitucional.

A criação do CR decorre, segundo a historiadora Maria Inácia Rezola, do evoluir da revolução e dos confrontos com Spínola, que quis secundarizar, sem êxito, o papel do MFA, da debilidade dos partidos políticos e da necessidade de uma transição liderada pelos militares de forma a garantir o programa do movimento, que incluía a realização de eleições livres, para a Assembleia Constituinte.

Herdeiro da Junta de Salvação Nacional (JSN), primeiro órgão após o golpe, o Conselho da Revolução tinha também as atribuições da JSN, os poderes constituintes do Conselho de Estado, mas também o poder legislativo do Conselho dos Chefes dos Estados-Maiores na área militar e o "poder legislativo para as necessárias reformas de estrutura da economia portuguesa".

Tinha amplos poderes, como vigiar o cumprimento do programa do MFA, mas também das leis (precursor do Tribunal Constitucional), escolher chefes militares, definir linhas gerais da política económica, social e financeira, entre outros.

Com uma revolução nas ruas e nos quartéis, o CR também vive momentos de tensão, dividido que estava entre várias sensibilidades, entre "gonçalvistas", afetos a Vasco Gonçalves, primeiro-ministro, à esquerda, os "otelistas", de Otelo Saraiva de Carvalho, estratego do 25 de Abril e chefe do COPCON (Comando Operacional do Continente), adepto de uma democracia direta, popular, e os "melo antunistas", do grupo dos nove ou moderados que se opunha tanto aos modelos socialistas da URSS e da Europa de Leste como à social-democracia europeia.

Perante as divisões entre os militares, houve ainda uma tentativa de ultrapassar o impasse, com a criação do triunvirato ou tróica, com o Presidente Costa Gomes, o primeiro-ministro, Vasco Gonçalves, e o comandante do COPCON, Otelo Saraiva de Carvalho.

O Processo Revolucionário em Curso (PREC) durante o Verão Quente, em 1975, quase levou o país a um confronto aberto entre a esquerda mais radical e os moderados, a que se juntaram partidos como o PS, mas também o PPD e o CDS e até a Igreja Católica contra a ameaça comunista.

O princípio do fim da revolução aconteceu em novembro de 1975, no 25 de Novembro, movimento militar que ditou a vitória dos moderados sobre a esquerda militar, que chegou a agrupar militares próximos do PCP e "otelistas".

O CR ganha então um novo papel, passando de "motor da revolução" a papel de catalisador na vida política, sendo alvo, da parte dos partidos políticos, como o PPD, de Sá Carneiro, que chegou a reclamar a extinção do CR por via referendária.

Apesar das suas divisões internas, o conselho acabou em 1982, após uma revisão constitucional. E em 29 de outubro desse ano realizou-se a última reunião do CR, poucas horas antes de a Constituição já revista entrar em vigor, e que consagrava o poder civil sobre o poder militar.

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