Protesto contra assédio sexual marca cerimónia dos Globos de Ouro

por RTP
Lucy Nicholson - Reuters

A cerimónia de entrega dos Globos de Ouro, que decorreu esta noite em Los Angeles, ficou marcada por um protesto contra o assédio sexual. Atores e atrizes desfilaram na passadeira vermelha vestidos de preto. O movimento “Me Too” foi lançado na passada semana por mais de 300 profissionais da indústria do cinema de Hollywood.

A passadeira vermelha fez antever o que se esperava, com o desfile de numerosos artistas de vestidos e trajes negros a servir de prólogo à crítica contra o machismo e abusos alimentada pelos movimentos “Me too” (“Eu também”) e “Time’s Up” (“Acabou-se o tempo”) que continuaria durante toda a gala dos Globos de Ouro, os prémios de cinema e televisão atribuídos pela Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood (HFPA), e os primeiros grandes prémios de Hollywood desde que estalou o escândalo de assédio sexual.

Meryl Streep, Hugh Jackman, Chris Hemsworth, Jessica Biel, Justin Timberlake, Catherine Zeta-Jones, Dakota Johnson, Emma Watson e as crianças da série "Stranger Things" foram alguns dos atores que chegaram à celebração vestidos de negro.

Entre os primeiros convidados que surgiram, também optaram por essa cor Caitriona Balfe, Debra Messing, Katherine Langford, Jamie Chung, Alison Brie, Édgar Ramírez, Freddie Highmore, Alexis Bledel ou Alfred Molina.

"Este movimento é muito importante; é apenas um pequeno gesto, mas espero que conduza a grandes mudanças. "Quando tiverem necessidade, as mulheres têm de ser escutadas, apoiadas", disse à agência noticiosa Efe Moliana, nomeado pela série norte-americana "Feud". Na sequência do escândalo por acusações de abuso sexual contra o produtor Harvey Weinstein, e que também atingiram Dustin Hoffman, John Lasseter ou Brett Ratner, era já esperado que este desfile no tapete vermelho constituísse o primeiro grande protesto público contra o assédio às mulheres em Hollywood.

À iniciativa juntou-se à ação desencadeada por mais de 300 mulheres poderosas de Hollywood, onde se incluem Meryl Streep e Eva Longoria, que lançaram recentemente um fundo de defesa legal destinado a ajudar as mulheres menos privilegiadas a defenderem-se de possíveis abusos sexuais no local de trabalho.

Este fundo de defesa legal designado "Time's Up" já garantiu mais de 13 milhões de dólares (10,7 milhões de euros) em doações e procura ajudar estas mulheres com baixos salários a protegerem-se das consequências que podem surgir após a denúncia de abusos sexuais.
Assédio sexual marcou discursos
Com duros e sentidos discursos, como os de Oprah Winfrey ou Nicole Kidman, mas também com piadas cáusticas, como as do apresentador Seth Meyers, a 75.ª edição dos Globos de Ouro ficará para a história não tanto pelos vencedores, mas pela condenação pública do assédio e abuso sexual de que são alvo as mulheres.

A noite começou desde logo com o humor de Seth Meyers que foi o mestre da cerimónia. Apesar de ter reconhecido antes da gala que provavelmente não seria “o ano mais divertido” para apresentar os Globos de Ouro, o ator e comediante acabou por sair airoso da difícil tarefa de abordar com piada o escândalo de assédio e abuso sexual que atingiu Hollywood.

“Boa noite às senhoras e aos senhores que ainda restam!”, afirmou, logo depois de subir ao palco.

“É 2018. A marijuana foi permitida finalmente [na Califórnia, para fins recreativos], mas o assédio sexual já não! Vai ser um bom ano”, ironizou, prosseguindo com piadas alusivas a Harvey Weinstein, o influente produtor de Hollywood, cujas dezenas de denúncias por assédio e abuso sexual inspiraram o movimento “Me too” para incentivar as vítimas a denunciarem os seus casos, mas também a Kevin Spacey, num serão em que nem o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, foi esquecido.
"Um novo dia está no horizonte"
Oprah Winfrey, que recebeu o prémio Cecil B. DeMille, foi uma das que mais diretamente se pronunciou contra “os homens poderosos” que durante demasiado tempo dominaram o mundo, para afirmar, de seguida, numa mensagem de esperança, que “o seu tempo chegou ao fim”.


Foto: Lucy Nicholson - Reuters

“Eu entrevistei e retratei pessoas que testemunharam algumas das coisas mais horríveis que a vida pode atirar contra ti, mas a única qualidade que todas parecem ter em comum é a capacidade de manterem a esperança numa manhã mais clara mesmo durante as nossas noites mais sombrias. Por isso, quero que todas as meninas saibam neste momento que um novo dia está no horizonte”.

E, prosseguiu, “quando esse novo dia finalmente amanhecer, vai ser por causa de inúmeras mulheres magníficas, muitas das quais estão aqui nesta sala esta noite, e por causa de alguns homens fenomenais que lutam duramente para ter a certeza de que vão tornar-se nos líderes que nos vão levar a um tempo em que ninguém mais tenha que dizer ‘Me too’ [‘Eu também’] outra vez”, realçou Winfrey diante de um auditório emocionado que se colocou de pé para a ovacionar.

Barbra Streisand, que deu os toques finais da noite ao anunciar o prémio de melhor drama, aproveitou a ocasião para recordar que foi a única mulher a ter ganhado o Globo de Ouro de melhor realização, um prémio que recebeu em 1984 pelo filme “Yentl”.

“Isso foi há 34 anos. Amigos, acabou-se o tempo. Precisamos de mais mulheres cineastas e de mais mulheres nomeadas para melhor realização”, afirmou, numa gala em que não havia nenhuma realizadora como candidata.

Por seu lado, Nicole Kidman, que foi distinguida como melhor atriz de minissérie (“Big Little Lies”), recordou no palco que a sua personagem de uma mulher maltratada representa os abusos que agora figuram no centro das conversas em Hollywood.

“Creio e espero que possamos suscitar uma mudança através das histórias que contamos e da maneira como as contamos. Mantenhamos vivo o debate”, assinalou.

Já Frances McDormand, que conquistou o prémio de melhor atriz de drama por “Three Billboards Outside Ebbing, Missouri”, afirmou sentir-se bem por participar numa noite como a de domingo e por ser parte de “um movimento tectónico na estrutura do poder” da indústria do cinema.

Susan Sarandon e Geena Davis, as estrelas de “Thelma & Louise” (1991), criticaram, por seu turno, ao apresentar um prémio, a desigualdade salarial entre homens e mulheres no universo do cinema.

C/Lusa
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