Alegada manipulação do défice é "dúvida legítima" para a CIP
A Confederação da Indústria Portuguesa (CIP) manifestou esta quinta-feira o que considera ser "uma dúvida legítima" sobre as estimativas do Governo de José Sócrates, questionando se o défice calculado para 2009 "estará a ser aumentado para se apresentar serviço". Quanto ao Orçamento do Estado para 2010, a estrutura representativa do patronato esperava "mais rigor".
"É uma dúvida legítima que os deputados irão, com certeza, questionar", reforçou Mira Amaral.
A Confederação da Indústria Portuguesa, sustentou o antigo governante, ficou "surpreendida" com a estimativa de défice orçamental avançada pelo ministro das Finanças - 9,3 por cento do produto interno bruto (PIB) em 2009 e 8,3 por cento este ano. Isto numa altura em que a generalidade das previsões apontava para os oito por cento. Para a CIP, o Governo poderá estar a "empolar" dados para retirar o país "dos radares" das agências de notação de crédito. Por outro lado, a Confederação teme que as agências de rating, ao colocarem Portugal "no mesmo campeonato da Grécia", gerem mais obstáculos à obtenção de crédito.
Daí que os empresários experimentem hoje uma "preocupação com o ajuste das contas públicas", nas palavras do presidente da CIP, António Saraiva: "Se o prémio de risco de Portugal sobe, as taxas de juro para as empresas e famílias sobe também. Não vale a pena estarmos a pensar que não temos que nos preocupar com esta área".
Orçamento do Estado "sabe a pouco"
O Núcleo de Estudos de Conjuntura da Universidade Católica questionava, na quarta-feira, o valor do défice de 2009 calculado pelo Ministério das Finanças, falando de um eventual "empolamento" para que o Executivo se pudesse apresentar, no final deste ano, como protagonista de um trajecto de consolidação das contas públicas. Em entrevista à SIC, Teixeira dos Santos negou essa hipótese, classificando-a de "tonteria".
"Dizer que se inflacionou as previsões é uma tonteria. O ano de 2009 já acabou, os números estão sobre a mesa, é só adicioná-los. Aqui não se vai fazer qualquer inflação. Nem pensem que eu ia agora apresentar uma estimativa de défice de 2009 sabendo que daqui a um mês e meio o INE faria um reporte que iria desmentir isso. É uma tonteria que não tem fundamento algum e acho que nem sequer merece ser dada qualquer atenção a uma afirmação ou a uma insinuação dessa natureza", afirmou o ministro.
Da leitura da proposta de Orçamento apresentada na terça-feira pelo ministro das Finanças, a CIP conclui que "não houve esforço" suficiente no objectivo da "contenção da despesa pública".
"Sabe-nos a pouco. Esperávamos mais rigor, mais contenção da despesa pública. Sentimos que não houve aí o esforço que gostaríamos de ter verificado, porque encontramos hoje um empresariado que, todos sabemos, tem dificuldades. Encontramo-nos com duas pesadíssimas mochilas, como eu tenho referido, a dívida pública e a dívida externa", sintetizou esta quinta-feira António Saraiva.
A Confederação da Indústria Portuguesa pretende que o Governo proceda a uma regularização das dívidas da Administração Pública. Quer também que os pagamentos a fornecedores, por parte do Estado, sejam concretizados num prazo máximo de 30 dias. No plano fiscal, a CIP defende a supressão do pagamento especial por conta e a redução do prazo de reeembolso do IVA para um mês. Propõe, por último, a extinção do imposto de selo, nomeadamente aquele que incide sobre operações financeiras - casos da utilização de crédito e das comissões por garantias prestadas.
Saraiva pede "bom-senso" em reacção a entrevista de Belmiro
O presidente da CIP comentou ainda a entrevista de Belmiro de Azevedo à Visão. Em declarações à revista, o patrão da Sonae arrasou a classe política do país, da esquerda à direita. O empresário refere-se, por exemplo, a Cavaco Silva como "um ditador", afirma que Manuela Ferreira Leite "pode ter muita experência de governação mas não sabe de muitas outras coisas" e adianta que José Sócrates "liga e manda ligar" com muita frequência.
No entender de António Saraiva, "a crispação não nos leva a lado nenhum".
"Todos temos que ter razoabilidade e bom-senso. A sociedade actual está demasiado crispada e o nosso papel deve ser, nesta altura, o de gerar pontos de confiança, não o de manter ou agravar as crispações", afirmou o responsável, à margem da conferência de imprensa da CIP.