Aviso da Rússia. "Só vamos fornecer alimentos e produtos agrícolas aos nossos amigos"

por Carlos Santos Neves - RTP
Colheita de trigo em Sredniy, na região de Stavropol, Rússia Eduard Korniyenko - Reuters

Depois do ultimato sobre o abastecimento de gás à Europa, que o Kremlin passou a condicionar ao pagamento em rublos, acendeu-se esta sexta-feira novo sinal amarelo em Moscovo. Dmitry Medvedev, presidente da Rússia de 2008 a 2012 e atual número dois do Conselho de Segurança do país, adverte para cortes nas exportações de produtos agrícolas.

A advertência de Medvedev surgiu nas redes sociais, observou a agência Reuters. O antigo presidente – entre os mais fiéis aliados de Vladimir Putin em Moscovo - começa por dizer que gostaria de elencar “alguns pontos simples, mas importantes, sobre a segurança alimentar na Rússia”, tendo em conta as sanções ocidentais.

“Só vamos fornecer alimentos e produtos agrícolas aos nossos amigos. Felizmente temos bastantes e eles não estão, de todo, na Europa ou na América do Norte”, acentua. Estes abastecimentos “a amigos”, enfatiza ainda Dmitry Medvedev, concretizar-se-ão em rublos e nas respetivas moedas nacionais dos países de destino, em proporção a definir.A Rússia interditou a maior parte das importações de alimentos do Ocidente em 2014, na sequência da anexação da Crimeia. A lista pode ser alargada, ameaça Medvedev.


Ainda segundo o antigo chefe de Estado russo, a prioridade de Moscovo, em contexto de guerra e subsequentes sanções por parte do Ocidente, recai no mercado doméstico e no controlo dos preços intrafronteiras.

A Rússia figura entre os maiores produtores globais de trigo, produto que o país exporta, essencialmente, para o Médio Oriente e o Continente Africano. Ucrânia e União Europeia são os principais concorrentes de mercado.
E na Ucrânia? “Não sabemos que culturas serão plantadas”
Na quinta-feira, em entrevista à France Presse, o ministro ucraniano da Agricultura fez soar novo alerta para o efeito da invasão russa na produção cerealífera do país, cuja colheita, disse, pode ser abatida para metade, face ao volume do ano passado. Um “prognóstico otimista”, assinalou Mykola Solsky.Em 2021, o sector agrícola da Ucrânia produziu 106 milhões de toneladas de cereais – um máximo histórico. O país é o quarto maior exportador mundial de milho e, antes da ofensiva militar russa, posicionava-se para ocupar o terceiro posto nas exportações de trigo.

O ministro ucraniano fez notar que a guerra atingiu duramente boa parte das regiões mais férteis do país, nomeadamente Kherson, Zaporozhye e Odessa, no sul.

Por outro lado, a mobilização de agricultores para a defesa abriu uma crise de mão-de-obra. Kiev admite instituir um “sistema de isenções temporárias” que permita manter os trabalhadores deste sector afastados das frentes de batalha.

Mykola Solsky reconheceu que não é possível estimar “que culturas serão plantadas”: “Cada agricultor ou quinta tomará a sua decisão com base na disponibilidade de sementes, fertilizantes, pesticidas e combustível”.

A agricultura ucraniana debate-se também com a crescente escassez de combustíveis. Estes eram sobretudo fornecidos, antes da invasão, por Rússia e Bielorrússia. E os portos marítimos estão agora vedados pelas tropas russas.

“O inimigo dirige cinicamente os seus ataques contra os depósitos de combustível, sabendo que estamos a preparar-nos para a campanha de sementeira, para impedi-la”, vinca o governante ucraniano, acrescentando, sem concretizar, que “estão a caminho” novos abastecimentos.No início da semana, no Conselho de Segurança das Nações Unidas, a Rússia foi acusada de gerar uma crise alimentar internacional, cujos impactos poderão ser mais acentuados no Médio Oriente e no Norte de África.

Por agora, a Ucrânia deverá dispor de reservas em suficiente quantidade para alimentar a própria população. Isto porque foi proibida – ou limitada – a exportação de produtos como o trigo, a aveia, a carne bovina, aves e o açúcar.

c/ agências
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