Milhares de crianças ucranianas raptadas pela Rússia. Especialistas denunciam crime de guerra

Milhares de crianças ucranianas estão desaparecidas e pensa-se que estejam detidas na Rússia ou em territórios ocupadas pela Rússia, o que tem levado pais desesperados a viajar para a Rússia para tentar encontrar os seus filhos, revela o The Guardian. Durante as negociações de cessar-fogo, Moscovo tem rejeitado os pedidos de Kiev para que as crianças sejam devolvidas e acusou a Ucrânia de "encenar um espetáculo".

Rachel Mestre Mesquita - RTP /
Jose Colon / Anadolu via AFP

Desde o início da invasão da Ucrânia pela Rússia, em fevereiro de 2022, que milhares de crianças têm sido levadas à força pelas forças militares russas das suas casas, do campo de batalha após a morte dos pais ou coagidas pelas famílias.  

Uma equipa de especialistas da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, que tem investigado os raptos com recurso a base de dados russas, documentos oficiais, ligações familiares e até imagens de satélite estima que cerca de 35 mil crianças possam estar detidas na Rússia e nos seus territórios ocupados, o que tem forçado as famílias a tomar medidas desesperadas e arriscadas para tentarem resgatá-las. 
Teme-se que muitas crianças tenham sido enviadas para campos militares, orfanatos ou até sido adotadas por famílias russas

Nathaniel Raymond, diretor-executivo do Laboratório de Investigação Humanitária de Yale, disse ao The Guardian que: "Se a criança for colocada num orfanato (...) é basicamente impossível recuperá-la. Elas estarão perdidas". Para o especialista "este é provavelmente o maior rapto de crianças em guerra desde a Segunda Guerra Mundial — comparável à germanização de crianças polacas pelos nazis". 

Questionado pelo Guardian, Nathaniel Raymond explica que as crianças estão atualmente a ser usadas por Moscovo como moeda de troca nas negociações de paz com a Ucrânia, já que Kiev tem feito do regresso das suas crianças uma exigência fundamental nas negociações.

"Quando os russos começaram, pensavam iriam sair vitoriosos rapidamente, por isso este programa foi lançado, não para levar estas crianças e mantê-las em cativeiro, mas para poder "russificar" a Ucrãnia. Mas como as coisas começaram a correr mal rapidamente, tiveram de mudar a sua propaganda da fase de ocultação de responsabilidades para a utilização destas crianças como reféns a serem usados nas negociações", afirma o especialista. "Retirar uma criança de um grupo étnico ou nacional e torná-la parte de outro grupo étnico ou nacional – isso é um crime de guerra", denuncia Nathaniel Raymond.

O Tribunal Penal Internacional (TPI) concorda que a deportação ilegal de de crianças ucranianas constitui um "crime de guerra", razão pela qual emitiu em março de 2023 mandados de prisão contra o presidente russo, Vladimir Putin, e a sua Comissária russa para os Direitos da Criança, Maria Lvova-Belova.

Durante as negociações de paz em Istambul, na Turquia, no início deste mês a Rússia rejeitou os pedidos da Ucrânia para que as crianças fossem devolvidas. Um alto funcionário do Kremlin terá mesmo acusado a Ucrânia de "encenar um espetáculo sobre o tema das crianças perdidas". 

Até à data, apenas 1366 crianças foram devolvidas ou conseguiram fugir de voltar para a Ucrânia, de acordo com a organização ucraniana Bring Kids Back.
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