Em direto
Após apagão. "Todas as subestações da rede nacional repostas"

Alerta dos Médicos Sem Fronteiras. Gaza tornou-se "vala comum" para palestinianos

por Cristina Sambado - RTP
Hatem Khaled - Reuters

Numa altura em que as forças israelitas retomaram a ofensiva militar por terra, mar e ar na Faixa de Gaza, deslocando pessoas em massa e bloqueando deliberadamente a ajuda essencial, a organização Médicos Sem Fronteiras alerta que o território se tornou numa “vala comum” para os palestinianos e para aqueles que tentam ajudá-los.

Gaza foi transformada numa vala comum de palestinianos e de todos aqueles que os ajudam e dos que vêm em seu auxílio. Estamos a assistir em tempo real à destruição e à deslocação forçada de toda a população”, alertou Amande Bazerolle, coordenadora de emergência de MSF em Gaza.

Segundo Amande Bazerolle, “sem lugar seguro para os palestinos ou para aqueles que tentam ajudá-los, a resposta humanitária está a debater-se gravemente com o peso da insegurança e da escassez de suprimentos críticos, deixando as pessoas com poucas ou nenhuma opção de acesso aos cuidados”.

“As vidas dos palestinianos estão mais uma vez a ser sistematicamente destruídas. Uma série de ataques mortais das forças israelitas tem demonstrado um flagrante desrespeito pela segurança dos trabalhadores humanitários e médicos em Gaza”, lê-se em comunicado enviado às redações, pela organização Médicos Sem Fronteiras (MSF) esta quarta-feira.

A MSF apela “às autoridades israelitas para que levantem imediatamente o cerco desumano e mortal a Gaza, protejam as vidas dos palestinianos e do pessoal humanitário e médico, e que todas as partes restabeleçam e mantenham o cessar-fogo”.
De acordo com dados do Ministério da Saúde da Palestina, mais de 50 mil pessoas morreram desde outubro de 2023. Quase um terço das quais são crianças. Desde que reiniciou a sua ofensiva militar a 18 de março, após dois meses de relativa calma, as forças israelitas mataram mais de 1. 500 palestinianos.


Segundo as Nações Unidas, pelo menos 409 trabalhadores humanitários, na sua maioria pessoal da UNWRA, o principal fornecedor de ajuda humanitária em Gaza, foram mortos desde outubro de 2023. “Onze membros da MSF, alguns em serviço, foram mortos desde o início da guerra, dois deles nas últimas duas semanas”.

“No último caso de um ataque impiedoso das forças israelitas contra trabalhadores humanitários, os corpos de 15 socorristas e as ambulâncias em que viajavam foram encontrados numa numa vala comum, em 30 de março, em Rafah, no sul de Gaza. O grupo foi morto pelas forças israelitas quando tentavam prestar assistência a civis atingidos por bombardeamentos em 23 de março. Provas recentes partilhadas publicamente mostram que os trabalhadores e os seus veículos estavam claramente marcados e identificáveis, o que põe em causa as alegações iniciais das autoridades israelitas”, acrescenta o comunicado.

Para Claire Magone, diretora-geral de Médicos Sem Fronteiras em França, “este horrível assassinato de trabalhadores humanitários é mais um exemplo do flagrante desrespeito pelas forças israelitas à proteção dos trabalhadores humanitários e médicos. O silêncio e o apoio dos aliados mais próximos de Israel encorajam ainda mais essas ações”.

A MSF considera que apenas investigações internacionais e independentes podem trazer à luz as circunstâncias e as responsabilidades por esses ataques a trabalhadores humanitários.

Apesar de a situação ser catastrófica há mais de 18 meses, nas últimas três semanas, MSF testemunhou vários incidentes envolvendo o assassinato de trabalhadores humanitários e médicos.

“A coordenação dos movimentos humanitários com as autoridades israelitas, Sistema de Notificação Humanitária (SNA), um mecanismo já imperfeito, revelou-se pouco fiável e quase não oferece garantias de proteção. Os locais notificados, nos quais os trabalhadores humanitários informam Israel da sua presença, tais como instalações de saúde onde trabalham, foram atingidos”, afirma a MSF.

A organização frisa ainda que “as áreas próximas às instalações de saúde foram alvo de ataques, combates e ordens de evacuação pelas forças israelitas”.
As equipas da MSF tiveram de abandonar muitas instalações, enquanto outras continuam a funcionar com o pessoal e os pacientes presos no interior, incapazes de sair em segurança durante horas a fio.

A 7 de abril, as equipas de MSF e os doentes ficaram presos no hospital de campanha da organização em Deir Al-Balah, no centro de Gaza. Os rockets foram lançados pelo Hamas nas proximidades dos hospitais, pondo em perigo tanto os pacientes como os funcionários e levando a uma ordem de evacuação da área pelas forças israelitas, que também efetuaram ataques perto dos complexos dos hospitais Al Aqsa e Nasser.

A MSF “condena veementemente estas ações das partes beligerantes e apelamos para que respeitem e protejam as instalações de saúde, os doentes e o pessoal médico”

Desde 18 de março, MSF não pôde retornar ao hospital indonésio no norte de Gaza onde as equipas estavam preparadas para iniciar os cuidados pediátricos, mas tiveram de fugir do hospital de campanha, que que estava instalado ao lado do complexo.

O cerco total a Gaza esgotou as reservas de alimentos, combustível e medicamentos. A MSF sublinha que faltam medicamentos para o tratamento da dor e de doenças crónicas, antibióticos e materiais cirúrgicos críticos. A falta de reabastecimento de combustível na Faixa de Gaza levará à inevitável suspensão das atividades, uma vez que os hospitais dependem de geradores de eletricidade para manter para manter vivos os doentes em estado crítico e efetuar operações que salvam vidas.

As autoridades israelitas impediram deliberadamente a entrada de toda a ajuda em Gaza durante mais de um mês. Os trabalhadores humanitários têm sido obrigados a assistir ao sofrimento e à morte das pessoas. O fardo impossível de prestar ajuda com os mantimentos esgotados, ao mesmo tempo que eles próprios enfrentam as mesmas condições de risco de vida”, explicou Amande Bazerolle.

Não há forma de cumprirem a sua missão em tais circunstâncias. Isto não é um fracasso humanitário - é uma escolha política e um ataque deliberado à capacidade de sobrevivência de um povo, levado a cabo com impunidade”, acrescentou.

Para a organização, as autoridades israelitas devem pôr termo à punição coletiva dos palestinianos. E “exorta os aliados de Israel a porem termo à sua cumplicidade e a deixarem de permitir a destruição de vidas palestinianas”.
Tópicos
PUB