A eleição de Donald Trump representa um enorme teste para o sistema político norte-americano e, sobretudo, para o Partido Republicano. É, aliás, provável que o novo presidente cause maior perturbação nos republicanos do que nos democratas, para quem Trump pode constituir uma oportunidade para gerar coesão num partido dilacerado pelas divisões expostas nas eleições primárias.
A testar os limites do sistema
Nunca é excessivo afirmar que os dois principais partidos norte-americanos não têm estruturas semelhantes às dos partidos europeus, sendo sobretudo coligações alargadas que variam ideologicamente em função dos estados e de interesses corporativos. Nesse sentido, e apesar de os republicanos terem demonstrado desde os anos 90 um maior pragmatismo e uma maior coesão quando comparados com os democratas, torna-se difícil prever que figuras moderadas como o senador John Mccain alinhem acriticamente com as derivas autoritárias do novo presidente. Por outro lado, os diferentes congressistas e senadores, eleitos uninominalmente, respondem perante eleitorados muito diferentes e não homogéneos. Um congressista republicano da Califórnia não tem a mesma agenda do que um congressista republicano do Mississípi.
O sistema político norte-americano não é perfeito (já enfrentou grandes desafios), mas tem capacidade para reagir. Não é comparável ao caos constitucional venezuelano ou sequer ao instável presidencialismo brasileiro. A forma como uma juíza federal contrariou uma ordem executiva de Trump por considerá-la, em parte, incompatível com a legalidade vigente demonstrou esta capacidade de reacção. Há válvulas de escape nos “freios e contrapesos” e a própria sociedade reage, como se viu pelo advogados e associações que se ofereceram para apoiar as vítimas da decisão de Trump acerca de refugiados e emigrantes.
Quer tudo isto dizer que podemos estar descansados? Claro que não. As mais recentes derivas autoritárias fundamentam-se na perversão de resultados obtidos nas urnas. Que o digam os cidadãos da Rússia, Venezuela, Nicarágua ou Turquia. Trump já demonstrou que pretende testar os limites do sistema, mas não é o único actor em jogo, as regras estão definidas e os norte-americanos sabem jogar com elas. Aguardemos.