Afeganistão. EUA confirmam diálogo com talibãs para retirada de civis

por RTP
O emirado do Qatar, que Blinken visita esta terça-feira e para onde os Estados Unidos moveram os seus diplomatas que estavam no Afeganistão, é um local chave para contactos diplomáticos e onde os talibãs têm também embaixada. Reuters

O secretário de Estado dos Estados Unidos confirmou o diálogo com os talibãs "nas últimas horas" para assegurar a saída de americanos e afegãos que desejem abandonar o Afeganistão, através de voos adicionais. De visita ao Qatar, Antony Blinken afirmou ainda que está a tentar garantir a partida de voos charter do aeroporto de Mazar-i-Sharif com segurança.

O secretário de Estado Antony Blinken e o secretário da Defesa Lloyd Austin foram recebidos pelo emir do Qatar, o Sheikh Tamin bin Hamad al-Thani logo após a chegada a Doha, esta segunda-feira.

Os representantes da política externa e da defesa norte-americana agradeceram ao emir “pelo extraordinário apoio do Qatar ao facilitar uma passagem segura de cidadãos norte-americanos, de parceiros e outros afegãos em risco”, refere o Departamento de Estado. Sem mais detalhes, foi revelado que foram debatidas “outras questões bilaterais e iniciativas para promover a segurança e a prosperidade regional”.

Na manhã de terça-feira, Blinken encontrou-se com o ministro dos Negócios Estrangeiros do Qatar. Após o encontro com Mohammed bin Abderrahmane Al-Thani, Blinken afirmou que os talibãs disseram que “vão deixar partir livremente as pessoas portadoras de documentos de viagem”, incluindo os afegãos que quiserem deixar o país e que tiverem os documentos necessários.

Depois de o departamento de Estado ter confirmado serem 200 os cidadãos americanos ainda no Afeganistão, Blinken referiu agora que são “cerca de uma centena”. Garantiu ainda que os Estados Unidos vão continuar a sua ação de diplomacia, sabendo que o Qatar é um aliado.

O emirado do Qatar, para onde os Estados Unidos moveram os seus diplomatas que estavam no Afeganistão, é um local chave para contactos diplomáticos e onde os talibãs têm também embaixada. Os governantes do Qatar têm nos últimos meses assumido o papel de mediadores no diálogo entre países ocidentais e talibãs.

Durante a segunda quinzena de agosto, foram retiradas do Afeganistão quase 124 mil pessoas, 75 por cento das quais afegãos em risco. Mais de 55 mil pessoas foram transportadas via Doha, a principal base de apoio da gigantesca operação de resgate.

Os norte-americanos querem assim garantir que o Qatar continue a ajudar na retirada dos americanos que ainda se encontram no Afeganistão, bem como dos milhares de afegãos que colaboraram com os militares estrangeiros durante as duas décadas em que estiveram no país. Washington também está a movimentar-se para construir consenso entre os países aliados sobre como responder ao futuro governo talibã.

Por isso, após a passagem pelo Qatar, Blinken vai seguir para a Alemanha, onde juntamente como homólogo Heiko Maas vai presidir a uma reunião online com ministros de 20 países sobre o Afeganistão. Na Alemanha, Blinken vai visitar a base aérea de Ramstein, onde estão albergados temporariamente milhares de afegãos a caminho dos Estados Unidos.

O Departamento de Estado revelou ainda que Washington conseguiu garantir a partida segura de mais quatro americanos do Afeganistão por terra. “Esta é a primeira evacuação terrestre facilitada pelo Departamento de Estado”, com os talibãs conhecedores da operação. No entanto, não foi revelada a fronteira utilizada.

Já o secretário da Defesa, que está num périplo pelo Golfo, vai deslocar-se à Arábia Saudita e ao Kuwait.
Aeroporto de Cabul operacional nos próximos dias
No sábado, o Qatar anunciou a reabertura do aeroporto de Cabul para ajuda humanitária e voos domésticos, devendo os voos internacionais ser retomados “em breve”. As Nações Unidas voltaram a lançar o alerta para as dificuldades humanitárias crescentes no Afeganistão. O porta-voz da organização internacional alertou para o colapso dos serviços básicos, comida e outros bens. Estão programados voos diários de ajuda humanitária a partir de Doha com destino a Cabul.

Terça-feira, o ministro dos Negócios Estrangeiros do Qatar disse esperar que o aeroporto de Cabul possa receber passageiros nos próximos dias, mas que o acordo para tal ainda não foi finalizado. Mohammed bin Abdulrahman al-Thani confirmou que conversou com os americanos as mais recentes evacuações do Afeganistão.

Já o ministro turco dos Negócios Estrangeiros, em declarações à NTV, disse que o país está a dialogar com o Qatar e com os Estados Unidos sobre o futuro modelo operacional do aeroporto de Cabul e confirmou conversações com os talibãs.

Mevlut Cavusoglu avançou que 19 técnicos turcos estão em Cabul e nota que a principal questão é a garantia de segurança no interior do aeroporto. O ministro turco aventou a possibilidade de recurso a uma companhia privada de segurança, caso os talibãs insistam em não ter militares estrangeiros no Afeganistão.
Aviões americanos bloqueados no Afeganistão
Sobre a situação de Mazar-i-Sharif, onde estão seis aviões prontos a descolar, o secretário de Estado dos Estados Unidos afirmou ainda que está a tentar garantir a partida de voos charter do Afeganistão com segurança.

Antony Blinken disse que Washington identificou um número "relativamente pequeno” de americanos que tentam sair pelo aeroporto da cidade de Mazar-i-Sharif, no norte do Afeganistão.

Numa conferência de imprensa em conjunto com o homólogo do Qatar, em Doha, Blinken referiu que o principal desafio à retirada de pessoas com recurso aos voos charter é que alguns afegãos que querem sair por ali não têm a documentação adequada.

A administração norte-americana está a ser pressionada perante relatos de que estão centenas de pessoas, incluindo cidadãos americanos, presas no aeroporto de Mazari-Sharif. A fundadora e diretora da ONH Ascend Athletics refere que entre 600 e 1.300 pessoas, incluindo 19 americanos, tentam deixar o Afeganistão. “Já se passaram sete dias e nada está a acontecer”, disse Marina LeGree, cuja organização quer fazer sair um grupo de afegãs da minoria Hazara, e restante família, com idades entre os 16 e os 23 anos.

Marina LeGree aponta responsabilidades aos diplomatas americanos. Tudo parecia bem encaminhado até que o Departamento de Estado disse que os procedimentos de triagem não poderiam ser feitos por falta de pessoal. “Parece que estão a tentar fugir”, disse Marina LeGree.

Não tínhamos informações confiáveis que nos permitiriam confirmar a informações sobre os voos fretados, seja sobre quem os está a organizar, sobre o número de cidadãos americanos ou membros de outros grupos prioritários a bordo (…) ou onde vão aterrar”, reagiu o porta-voz do Departamento de Estado.

Este é um assunto que tem sido utilizado pelos republicanos nos Estados Unidos, para criticarem a administração de Joe Biden.
Talibãs dispersam manifestão anti-Paquistão
Ainda com o novo governo por anunciar, os talibãs dispersaram - com recurso a tiros para o ar – cerca de 70 afegãos que protestavam em frente à embaixada do Paquistão em Cabul.

De acordo com a Agência France Presse, os manifestantes denunciavam a ingerência de Islamabad, com quem os talibãs têm estreitas ligações, nas questões internas afegãs.

No domingo, enquanto os talibãs anunciavam os avanços sobre o vale de Panchir, o chefe dos serviços secretos paquistaneses chegava à capital do Afeganistão para um encontro com os líderes talibãs. Faiz Hameed quis oferecer ajuda para criar uma “estrutura centralizada de comando militar”, que una o exército do Afeganistão e os guerrilheiros tribais, uma vez que Islamabad está preocupada com os vários grupos armados existentes no país, em particular após o colapso do Exército Nacional Afegão.

O Paquistão foi o principal apoiante das forças talibãs durante anos e um dos três países que reconheceu oficialmente o regime, na década de 1990, quando este controlava o Afeganistão. A visita de Hameed também visa lembrar os talibãs da ajuda do Paquistão nas lutas pelo território afegão, bem como ajudar a pacificar as diferenças entre as várias fações talibãs durante o processo de formação de governo.
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