Amazónia. Jair Bolsonaro proíbe queimadas por 60 dias

Em menos de 24 horas, a decisão foi tomada e o decreto publicado no Diário Oficial da União. O Presidente do Brasil decidiu quarta-feira proibir as queimadas em todo o solo nacional por um período de 60 dias.

Graça Andrade Ramos - RTP /
Uma área da floresta tropical da Amazónia, queimada por madeireiros e agricultores perto de Porto Velho, Brasil Reuters

A medida procura responder aos incêndios na região da Amazónia e simultaneamente calar o recente vendaval de críticas, externas e internas, à ação do Executivo brasileiro.

Uma oferta de auxílio por parte do G7, de 18 milhões de euros, está ainda suspensa, depois de Bolsonaro exigir ao Presidente francês, Emmanuel Macron, que se retratasse.

Macron "chamou-me mentiroso e por duas vezes disse que a soberania (sobre a Amazónia) deveria ser relativizada", lembrou Bolsonaro aos jornalistas esta quarta-feira.

"Poderemos voltar a falar quando ele se retatar depois do que disse contra a minha pessoa", acrescentou.

A suspensão de queimadas agora decretada tem efeitos imediatos, mas não será aplicada em situações de "controlo fitossanitário" - quando autorizadas pelo órgão ambiental competente -, em "práticas de prevenção e combate a incêndios", e em "práticas de agricultura de subsistência executadas pelas populações tradicionais e indígenas".

A medida faz parte de um pacote mais vasto, que irá incluir medidas de combate aos desmatamento - as quais deverão passar por incentivos financeiros - e propostas de mineração e de exploração vegetal no território.

O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, referiu ao jornal Folha de S. Paulo que se prepara para ir à Região Norte do Brasil reunir-se "com os governadores da Amazónia Legal, para contemplarmos as necessidades de todos".

De acordo com o decreto agora publicado, a proibição de queimadas é “excecional e temporária” e ditada pela proteção do meio ambiente, apesar de, de acordo com algumas autoridades brasileiras, o número de incêndios ter diminuído nos últimos dois dias.
Dados contraditórios

No balanço da Operação Verde Brasil, a maioria dos focos de incêndio tem sido registada nos estados de Rondônia, Amapá, Pará e Maranhão, tendo lavrado com maior intensidade entre domingo e segunda-feira.

A maior diminuição de incêndios registou-se terça-feira, em Rondônia, referiu. O balanço da Operação lembrou que foi ali que se concentraram os esforços federais de combate ao fogo.

"A avaliação é positiva. Com os parâmetros do Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazónia (Censipam), vimos que os focos de incêndio diminuíram bastante", disse o vice-almirante Ralph Dias, subchefe de operações do Estado-Maior das Forças Armadas, em conferência de imprensa quarta-feira.

Os dados, apresentados no balanço da Operação são aparentemente contrariados pelo Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (INPE) brasileiro, que registou 1.044 novos focos terça-feira em todo o país, mais de metade dos quais na Amazónia.
O INPE não está entre as entidades envolvidas no combate aos incêndios na Amazónia, e que incluem a Polícia Federal, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a Força Nacional e as Forças Armadas.

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) referiu que as áreas com maior número de focos de incêndio são as que se encontram fora das áreas protegidas pelo Governo Federal.

“As áreas protegidas de conservação e as áreas indígenas vão sempre ter menos incêndios, porque são as que estão mais preservadas”, referiu Gabriel Zacharia, chefe do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais do Ibama.

“Apesar dos bons resultados, os esforços precisam continuar”, acrescentou.
Ajuda do G7
Na Amazónia brasileira, o efetivo de combate a incêndios, incluindo militares, é de quase quatro mil pessoas e 250 viaturas.

Segunda-feira, no final da cimeira do G7, os líderes dos países mais ricos do mundo comprometeram-se em libertar 18 milhões de euros para combater os incêndios, ajuda primeiro recusada pelo Presidente brasileiro.

“O Brasil não está à venda por 20 milhões (de dólares) nem 20 mil milhões”, reagiu. Acrescentou, contudo, que o país “pode aceitar toda a ajuda bilateral”.

Jair Bolsonaro abriu depois caminho ao auxílio, na condição de o Presidente francês, Emmanuel Macron, a quem tem acusado de ingerência e de atitude “colonialista”, pedir desculpas.

Macron acusou Bolsonaro de “mentir” sobre os seus compromissos ambientais e exigiu por seu lado a Bolsonaro que retirasse comentários ofensivos feitos no Facebook à primeira-dama de França, Brigitte Macron.

Quarta-feira, o Presidente brasileiro retirou o comentário sobre Brigitte Macron, “para evitar más interpretações”, revelou entretanto o porta-voz presidencial brasileiro. Assinou ainda o decreto de proibição de queimadas por 60 dias.
Braço de ferro
O braço de ferro entre os dois Presidentes, devido ao alarme provocado pelo grande número de incêndios na Amazónia, iniciou-se há duas semanas, após um fim de semana particularmente afetado.

Macron sugeriu que, face à importância da Amazónia para o clima mundial e para a biodiversidade, fosse concedido à região um estatuto internacional. Sugestão repudiada imediatamente e com veemência, por Bolsonaro.

A Amazónia é a maior floresta tropical do mundo e possui a maior biodiversidade registada numa área única. É igualmente chamada "pulmão do planeta", pela quantidade de oxigénio que emite.

Tem cerca de 5,5 milhões de quilómetros quadrados e inclui territórios do Brasil, Peru, Colômbia, Venezuela, Equador, Bolívia, Guiana, Suriname e ainda a Guiana Francesa, pertencente à França e de onde viria a maioria do auxílio financiado pela União Europeia.
Investigação
Desde janeiro de 2019, o número de incêndios em todo o país ultrapassou os 83 mil, um aumento de 83 por cento face a 2018 e o mais elevado desde 2010, referem estatísticas brasileiras. A região mais afetada é a Amazónia.

São habitualmente provocados por agricultores ou criadores de gado, numa tentativa de obter mais terras.

Sexta-feira passada, o Governo do Planalto procurou garantir que a origem dos incêndios na Amazónia será investigada, ao autorizar uma operação de “Garantia da Lei e da Ordem” (GLO), confiada às Forças Armadas.

"São operações de inteligência e com um certo grau de sigilo. O combate aos crimes será trabalhado ao longo do tempo. A GLO tem um período de validade e é nesse período que tentaremos fazer este planeamento", referiu o vice-almirante Ralph Dias.

Muitas vozes ambientalistas avisam que, devido aos incêndios e desmatação que se sucedem há décadas, se está a atingir o ponto de não retorno, a partir do qual a floresta poderá não recuperar.

O Brasil detém soberania sobre 60 por cento da Amazónia, mas a floresta tem sofrido depredações em grande escala também por parte de outros países.

c/agências
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