Associações LGBT e de migrantes na Hungria lamentam retrocessos em 20 anos de UE

por Lusa

Tamás e Vivien trabalham, respetivamente, em prol dos direitos LGBT e dos migrantes, há mais tempo do que a Hungria faz parte da União Europeia, e em comum têm também a preocupação sobre "retrocessos" nestes 20 anos.

Na quarta-feira, a Hungria assinala 20 anos de integração na UE, tendo feito parte daquele que foi até agora o maior alargamento do bloco comunitário a 10 países, mas a data não é celebrada por Tamás Dombos, coordenador do projeto Háttér Society (que representa as pessoas LGBT na Hungria), ou por Vivien Vadasi, consultora jurídica da Associação Húngara para os Migrantes Menedék.

"Nos últimos anos, houve vários passos atrás e, na verdade, quando [a Hungria] entrou na UE era mais progressista em questões LGBT do que é atualmente", diz Tamás, falando com a Lusa em Budapeste.

Vivien conta, por seu lado, que a 01 de maio de 2004 "os fundos da UE passaram a estar disponíveis" para a associação, mas isso mudou quando o governo do primeiro-ministro húngaro, Viktor Órban, limitou o acesso às organizações não-governamentais.

Pelas ruas de Budapeste, os cartazes políticos `ofuscam` o 20.º aniversário de adesão ao bloco comunitário, mas não deixam de fora aqueles que são vistos como dois alvos da propaganda de Órban, a comunidade de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgénero (LGBT) e os migrantes, pelas palavras "género" e "migração" escritas em letras garrafais.

Foi, aliás, pelo desrespeito pelos direitos dos homossexuais e dos migrantes e pelo reforço do controlo do Estado sobre associações, tribunais e meios de comunicação social que Bruxelas cortou verbas europeias a Budapeste para exigir o cumprimento do Estado de direito.

"O que eu vejo é que, em 20 anos, quase nada mudou em termos de direitos. Foi importante a introdução da união de facto, mas essa foi a única grande alteração legislativa no sentido positivo", lamenta Tamás.

Em maior número são os exemplos de "retrocessos", segundo este responsável associativo, que fala em restrições a adoção por casais do mesmo sexo, abolição da entidade que fiscalizava a legislação anti-discriminação, proibição do reconhecimento legal de pessoas transgénero e numa lei que relaciona conteúdos LGBT com a pedofilia.

"Fizeram-no com os migrantes e agora estão a fazer connosco", condena.

Apesar de reconhecer que, há 10 anos, o governo húngaro começou "a utilizar a migração como uma espécie de tema polarizador do discurso público", Vivien é otimista e diz à Lusa esperar que, com a pressão de Bruxelas, o estigma mude e o apoio comunitário volte.

Outra área de tensão entre Budapeste e Bruxelas diz respeito aos media, quando se estima que o governo (de forma direta ou indireta) tenha influência em metade dos meios de comunicação social a operar no país.

Péter Bajomi-Lázár, investigador e professor universitário, afirma à Lusa que, segundo estudos recentes, "as pessoas não confiam verdadeiramente nas notícias divulgadas pelos meios de comunicação social" húngaros, o que "é uma boa notícia" dada a interferência na independência destes media.

"A Hungria tem uma situação única em termos do rácio de publicidade estatal", o que leva a que o país seja "dos mais polarizados" ao nível europeu, adianta o especialista no sistema mediático húngaro.

Aos 35 anos, Tiago Hipólito vive na Hungria desde 2013 e conta à Lusa também assistir a um "retrocesso em termos dos direitos", que está "relacionado com motivações populistas".

O jovem natural de Viseu indica notar uma "insatisfação geral com o atual governo e sobretudo com Viktor Órban".

Esta insatisfação é corroborada por investigadores europeus. Zsuzsanna Végh do Conselho Europeu das Relações Exteriores indica à Lusa que, "se a Hungria quisesse hoje aderir à UE, seria pouco provável que se qualificasse".

Dharmendra Kanani do grupo de reflexão Amigos da Europa adianta que, "para um país que beneficiou do alargamento, está a prestar-lhe um mau serviço".

 

 

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