Ativistas da flotilha repatriados. Montenegro insiste que Governo "fez tudo o que estava ao seu alcance"

O primeiro-ministro reafirmou esta segunda-feira que o Governo "fez tudo o que estava ao seu alcance" para agilizar o repatriamento dos ativistas da flotilha humanitária detidos pela máquina militar israelita na aproximação a Gaza. Luís Montenegro acrescentou que o processo decorreu "num clima de normalidade e tranquilidade".

Carlos Santos Neves, Inês Moreira Santos, Andreia Martins - RTP /
"Nós, na democracia, temos que respeitar as opiniões de todos" António Pedro Santos - Lusa

"A verdade é que o Governo fez tudo aquilo que estava ao seu alcance, para que os portugueses pudessem ser repatriados o mais rápido possível, num clima de normalidade e tranquilidade, e creio que foi isso que aconteceu", insistiu o chefe do Governo, à margem de uma ação de campanha para as eleições autárquicas em Vieira do Minho.

Questionado sobre os termos em que os líderes do Chega, André Ventura, e do CDS-PP, Nuno Melo, se referiram à receção dos ativistas portugueses no Aeroporto de Lisboa, o primeiro-ministro evitou alargar-se em comentários.André Ventura empregou o termo "palhaçada" e Nuno Melo descreveu a fotilha humanitária como "panfletária".

"Nós, na democracia, temos que respeitar as opiniões de todos. É consabido que, da minha parte, com a líder do Bloco de Esquerda, a Mariana Mortágua, há muitas divergências, mas isso não significa que nós não tenhamos as nossas responsabilidades e não tenhamos que acompanhar os portugueses, sejam eles quem forem, respeitando a manifestação da sua opinião, da sua expressão, e sobretudo dando-lhe o tratamento que é devido a qualquer compatriota", frisou o governante.

Ainda segundo Montenegro, a posição do Governo relativamente à causa palestiniana tem sido equilibrada, defendendo ser necessário que todos "saibam respeitar-se uns aos outros e que não haja extremismo na forma como se expõem as ideias e as opiniões".

"Eu não gostei de ver uma estação de comboios ser invadida e haver uma perturbação da vida normal das pessoas, acho que não é necessário chegar a esse ponto para exprimir uma posição, acho que há muitos instrumentos para se ouvir a voz de quem tem uma opinião, seja ela qual for", vincou o líder dos social-democratadas, aludindo aos incidentes de sábado na Estação do Rossio, em Lisboa.
"Não somos heróis"

Os quatro portugueses que estiveram cativos de Israel foram repatriados no domingo. Mariana Mortágua, Sofia Aparício, Miguel Duarte e Diogo Chaves aterraram no Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, pelas 22h30, após uma escala em Madrid.À chegada, deixaram duras críticas à falta de ação por parte dos diferentes governos.Dezenas de ativistas aguardavam pelos quatro ativistas junto às chegadas da Portela.

Os ativistas foram recebidos numa sala por familiares e amigos antes de serem ovacionados por centenas de apoiantes da causa palestiniana, já perto das 0h00 de segunda-feira.

"Não somos heróis, estamos a fazer o que os nossos governos não estão a fazer", afirmou a coordenadora do Bloco de Esquerda nas primeiras declarações à imprensa em Lisboa, lançando também críticas ao Executivo português pela ausência de sanções contra Telavive.

"Isto não é sobre nós. A nossa crítica não é o apoio consular que foi dado aos cidadãos portugueses que estavam na prisão israelita. (…) A nossa crítica é ao Governo português que não aplica sanções a Israel", enfatizou a deputada.
"Imaginem o que eles não fazem a palestinianos"


Mariana Mortágua destacou que os ativistas perceberam "a diferença naquela prisão entre ser europeu e ser palestiniano". Por muito difícil que tenha sido, reconheceu, e "que tenha havido abusos - que houve - isso deu-nos uma ideia do grau de impunidade dos israelitas contra palestinianos".

"Todos nós temos experiências muito semelhantes nesta detenção na prisão israelita. Temos experiência em ver camaradas a serem espancados e levados (...) Tivemos experiências de várias horas algemados e de sermos provocados por um ministro israelita", descreveu Mariana Mortágua à saída do aeroporto.

"Se eles nos fazem isto a nós, imaginem o que eles não fazem a prisioneiros palestinianos"
, fez notar. No aeroporto da capital espanhola, antes de rumar a Lisboa, Mariana Mortágua acusou Israel de inventar "um crime". Questionada pela RTP, a dirigente bloquista afirmou que, perante as autoridades de Israel, "nunca" admitiu ter entrado "ilegalmente" no território, para que o repatriamento tivesse lugar.

O ativista Miguel Duarte contou que todos passaram "fome e sede": "Fomos algemados, fomos vendados, fomos postos dentro de autocarros-prisão".

Acrescentou ainda que as celas "estavam completamente sobrelotadas" e que alguns dos detidos estiveram mais de 48 horas sem água ou comida. "Temos camaradas que têm diabetes que estiveram três dias sem receber insulina. Fomos postos em jaulas ao sol durante muito tempo", continuou.

"Não existem direitos de prisioneiros nas prisões israelitas, se nós tivemos alguma proteção às nossas vidas e à nossa integridade física foi porque somos europeus, temos mobilizações pelo apoio à flotilha. Temos de fazer o mesmo pelos palestinianos".
"Soldado israelita falsificou as nossas assinaturas"

Também a atriz Sofia Aparício contou que as autoridades israelitas tentaram que os ativistas assinassem documentos "escritos em hebraico", que não assinaram.

"Obviamente que nós não assinámos", afirmou. "Houve também a tentativa, durante a noite, de nos obrigarem a assinar documentos. Fazia parte da estratégia deles".

Denúncia reforçada por Miguel Duarte: ainda antes de chegar ao Aeroporto de Israel, houve ativistas que foram "quase obrigados" a assinar documentos "o mais depressa possível, sem poder lê-los".

"Os documentos diziam que nós aceitávamos que Israel tinha-nos capturado legalmente e trazido para Israel de forma legal", explicou. "Recusámo-nos a assinar e vimos um soldado israelita com os nossos passaportes a falsificar as nossas assinaturas para mostrar que nós aceitamos ser intercetados legalmente".

"É preciso ser claro quanto a isto: fomos intercetados, fomos raptados em águas internacionais e trazidos ilegalmente e contra a nossa vontade para Israel".

c/ Lusa

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