Aviso ao Parlamento. May exclui "adiar o Brexit além de 30 de junho"

por Carlos Santos Neves - RTP
“Espero apaixonadamente que encontrem forma de apoiar o acordo que negociei com a UE”, afirmou a primeira-ministra britânica, dirigindo-se aos deputados Chris J. Ratcliffe - EPA

Foi com uma comunicação para consumo televisivo que a primeira-ministra britânica encerrou o dia em que pediu aos diretórios da União Europeia o adiamento, por três meses, da saída do Reino Unido. Theresa May insistiu esta noite no apelo para que o seu plano, duas vezes rejeitado pelo Parlamento, em janeiro e em março, possa ainda passar à terceira investida no crivo dos deputados.

“Este adiamento é uma questão de grande lamento pessoal para mim”, reconheceu a chefe do Executivo britânico, durante uma intervenção a partir do Número 10 de Downing Street.
“Tenho a certeza de que o povo britânico já aguentou o suficiente”, clamou Theresa May, que falou aos britânicos após uma ronda de contactos com membros da oposição.

“Espero apaixonadamente que encontrem forma de apoiar o acordo que negociei com a UE, um acordo que cumpre com o referendo e é o melhor acordo possível, e continuarei a trabalhar noite e dia para garantir apoio para o acordo”, insistiu Theresa May.

A primeira-ministra tratou, em seguida, de aclarar que não está “preparada para adiar o Brexit para além de 30 de junho”.

De dedo apontado a Westminster, a governante conservadora estimou que, “até agora, o Parlamento tem feito tudo para evitar tomar uma decisão, propondo moção após moção, emenda após emenda”.

Horas antes, a governante conservadora oficializara junto da cúpula da União Europeia o pedido para que a saída do Reino Unido fosse adiada de 29 de março para 30 de junho. Na resposta, o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, vincou que a aprovação da nova data pelos 27 países-membros só poderá ocorrerá mediante a luz verde do Parlamento de Londres ao acordo de saída.

Recorde-se que o speaker da Câmara dos Comuns, John Bercow, afirmou já esta semana que uma terceira votação do acordo negociado por Theresa May implica a apresentação de um texto “substancialmente” diferente.
O que dizem Tusk e Juncker

Perante a carta da primeira-ministra britânica, na qual foi pedido o adiamento, até ao final de junho, da aplicação do artigo 50 do Tratado de Lisboa, Donald Tusk afirmou esta quarta-feira acreditar “que um curto prolongamento seja possível”. Todavia, acrescentou, tal extensão “será condicionada a um voto favorável sobre o acordo de saída na Câmara dos Comuns”.
Passado um milhar de dias desde o referendo de junho de 2016, a primeira-ministra britânica tenta também evitar que o Reino Unido participe nas próximas eleições para o Parlamento Europeu, em maio, algo que encara como “inaceitável”.
O pedido de May terá agora de receber a anuência unânime dos demais membros da União, cujos líderes se reúnem entre quinta e sexta-feira numa cimeira em Bruxelas. Os franceses já fizeram saber que se oporão ao adiamento, caso este não seja acompanhado de uma estratégia que se afigure “credível”.

Nesta fase, a alternativa à dilatação do prazo é apena uma: o denominado hard Brexit, uma saída desprovida de enquadramento bilateral com pesados custos para a economia do Reino Unido.

“Mesmo que a esperança de um sucesso final possa parecer frágil, ou até ilusória, e que seja cada vez mais visível e justificada uma fadiga do Brexit, não podemos renunciar à procura, até ao último instante, de uma solução positiva”, exortou o presidente do Conselho Europeu, que não colocou de parte a possibilidade de vir a convocar uma nova cimeira extraordinária para “a próxima semana”.

Por sua vez, a Comissão Europeia veio advertir para “graves riscos políticos e jurídicos” decorrentes do adiamento pedido por Theresa May. E o próprio presidente do Executivo comunitário, Jean-Claude Juncker, estimou que “não haverá decisão esta semana durante o Conselho Europeu”.

Internamente, a erosão da primeira-ministra continua a ser potenciada a partir de diferentes flancos. O líder dos trabalhistas, Jeremy Corbyn, insistiu na necessidade de um calendário ainda mais dilatado, denunciando o que considera ser “a incompetência, os fracassos e a intransigência da primeira-ministra e do seu Governo”.

Já Dominic Grieve, deputado conservador partidário de um segundo referendo, foi ao ponto de declarar que “nunca se sentiu tão envergonhado” de integrar as fileiras do partido de Theresa May.

c/ agências
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