"Boa sorte, Bolsonaro!" e lamentos pela democracia

Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa enviaram "felicitações" a Jair Bolsonaro pela sua eleição como Presidente do Brasil e Donald Trump desejou-lhe ao telefone que os dois países se tornem "grandes parceiros".

Graça Andrade Ramos - RTP /
Jair Bolsonaro celebra eleição como 38º Presidente do Brasil Reuters

Jair Bolsonaro, de 63 anos, capitão do Exército reformado, venceu este domingo a segunda volta das eleições com 55,1 por cento dos votos contra 44,9 por cento do candidato do Partido dos Trabalhadores, Fernando Haddad. A abstenção cifrou-se em 21 por cento num universo de 147,3 milhões de eleitores inscritos.A imprensa do Reino Unido praticamente ignorou o sucedido, com exceção para o jornal The Guardian, enquanto o espanhol El Mundo assinalou que o "ultra-direitista Bolsonaro" foi "eleito Presidente do Brasil".

De "ameaça à democracia" e "novo Hitler", até "salvador do Brasil", as reações à eleição do novo Presidente da República Federativa do Brasil confirmaram a polaridade suscitada já durante a campanha eleitoral.

Desejos de continuação de cooperação foi o desejo oficial da maioria dos chefes de Estado e de Governo. Múltiplas vozes partidárias foram mais efusivas na sua alegria ou preocupação.
"Boa sorte!"
Marine Le Pen, líder da extrema-direita de França, foi uma das que aplaudiu e eleição. "Boa sorte ao novo Presidente Bolsonaro, que deverá endireitar a situação económica, de segurança e de democracia muito comprometida do Brasil", escreveu Le Pen no Twitter.
"Os brasileiros acabam de castigar a corrupção generalizada e a aterradora criminalidade que prosperaram sob os Governos de extrema-esquerda", dissera antes.

Enquanto candidato, Jair Bolsonaro mostou-se admirador confesso do Presidente norte-americano Donald Trump. Após a confirmação da vitória, o próprio Trump telefonou-lhe, anunciou Bolsonaro na rede Twitter.
Trump desejou-lhe também boa sorte e afirmou, sobre as duas maiores economias das Américas, "vamos ser grandes parceiros!". País irmão

O Presidente e o primeiro-ministro de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa, felicitaram oficialmente o novo Presidente. Domingo, Marcelo referiu-se aos "laços de fraternidade" bilaterais e à "significativa comunidade de portugueses e lusodescendentes residentes no Brasil, bem como à cada vez mais importante comunidade brasileira" em Portugal.

O primeiro-ministro, António Costa, cumprimentou por seu lado, em nome do Governo português, o Presidente eleito do Brasil, salientando a relação bilateral "intemporal" entre os dois países, assente numa língua comum" e "fortes laços históricos".

Já o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, considerou que nada deve prejudicar os laços entre Portugal e o Brasil.

Também o Partido Socialista português sublinhou numa nota a importância das relações históricas, sociais e políticas entre os dois países, "traduzidas no papel fundamental das comunidades que vivem em Portugal e no Brasil", lembrando contudo "a importância do respeito pelos princípios do estado de direito democrático, da igualdade e da tolerância".
Os uns e os outros
O Presidente venezuelano, Nicolás Maduro, também felicitou Jair Bolsonaro pela sua vitória nas eleições presidenciais do Brasil, e apelou à retoma das "relações diplomáticas de respeito e harmonia" entre os dois países vizinhos.

Chile, Argentina, Paraguai e Perú estiveram entre os primeiros a congratular-se com a vitória de Bolsonaro, bem como Itália e Espanha.

A porta-voz da Comissão Europeia disse entretanto, numa primeira reação à vitória de Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais de domingo e enquanto o Presidente da Comissão não envia a tradicional mensagem de felicitações, que a União Europeia espera que o Presidente eleito "trabalhe para consolidar a democracia", considerando que "o Brasil é um país democrático, com instituições sólidas".

O chefe de Estado russo, Vladimir Putin, felicitou igualmente Jair Bolsonaro, a quem manifestou o seu desejo de desenvolver ainda mais as "relações construtivas" entre os dois países, divulgou o Kremlin a meio da manhã de segunda-feira.

Pouco antes, o Presidente de França, Emmanuel Macron, felicitou o novo Presidente, afirmando desejar a cooperação com o Brasil com base nos princípios democráticos e em questões como o meio ambiente.
Inquietações
A porta-voz do partido de Macron, o A República em Marcha, foi menos politicamente correta do que o Presidente francês.

"Nenhuma democracia está a salvo", reagiu Aurore Bergé na rede Twitter. Também um dos deputados do LREM, Sacha Houlié, considerou a eleição de Bolsonaro "um novo recuo do espaço das liberdades e da justiça social", lamentou "um novo avanço dos conservadores" e alertou para "os novos desafios que os progressistas deverão enfrentar".

O primeiro secretário do Partido Socialista francês, Olivier Faure, diz que a "democracia" um pouco por todo o mundo está em perigo. "De um continente ao outro, de Orban a Trump, de Salvini a Bolsonaro, a democracia vacila. Os nacionalistas captam e desviam a fúria dos povos. É urgente deixar os nossos caminhos batidos e voltar a despertar uma esperança humanista", tweetou.

Eric Coquerel, deputado da esquerda radical França Insubmissa, "depois de ter eliminado Lula utilizando uma pseudo justiça, o neoliberalismo preferiu Hitler à Frente popular", considerou.

Ao coro da preocupação com a democracia juntou-se Pierre Moscovici, considerando que a eleição de Jair Bolsonaro no domingo para Presidente do Brasil está ligada a uma forma de "cansaço democrático".

O comissário europeu para os Assuntos Económicos e Financeiros instou as democracias a despertarem.
Contra a "política do costume"
A imprensa generalista espanhola refere que os brasileiros "abraçaram a ultra direita" com "o voto indignado contra o sistema corrupto", derrubando o "titã" PT. Em particular, o El País reflete que a vitória de Bolsonaro "encaminha o maior país da América Latina para um período de incerteza".

Uma reflexão ligeiramente diferente veio do antigo editor de assuntos internacionais do diário britânico The Guardian. Simon Tisdall escreveu na edição desta segunda-feira que a eleição de Bolsonaro "não era mais uma questão de esquerda ou de direita, mas uma rejeição maciça da política do costume".

Bolsonaro beneficiou de um fenómeno eleitoral, "uma preferência entre os eleitores por um 'outsider' político ou um 'disruptor' dissidente que desafia o status quo", acrescentou, fazendo paralelo com a eleição de Donald Trump nos EUA ou de Andres Manuel Lopez Obrador no México, mas também, ao nível dos temas de campanha, com Rodrigo Duterte, nas Filipinas.

"Ansiosos por acreditar nas suas pretensões de estar do lado deles, muitos eleitores alienados também ignoraram, ou perdoaram, as visões misóginas e homofóbicas de Bolsonaro, a sua inclinação por soluções violentas", vincou Tisdall, no artigo publicado na página eletrónica do The Guardian.

C/Lusa
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