Bolsonaro quer mudar o destino do Brasil

Jair Bolsonaro prometeu, no primeiro discurso após a eleição, que o seu executivo vai “quebrar paradigmas” e trabalhar para “criar um novo futuro para os brasileiros”. O 38º Presidente do Brasil anunciou a intenção de reduzir a estrutura e burocracia do Governo. Assumindo-se seguidor dos “ensinamentos de Deus”, Bolsonaro anunciou respeitar “de verdade, a federação” brasileira e o Estado democrático de Direito.

RTP /
"Este é um país de todo nós, brasileiros natos ou de coração, de diversas opiniões, cores e orientações", disse Jair Bolsonaro Pilar Olivares - Reuters

O candidato da extrema-direita venceu as eleições presidenciais no Brasil. Jair Bolsonaro, de 63 anos, obteve 55,15 por cento dos votos, na segunda volta do escrutínio, realizada este domingo, e vai suceder a Michel Temer como Presidente da República. O capitão do Exército reformado conquistou 57.765.131 votos (55,15 por cento), enquanto o candidato de esquerda, Fernando Haddad, registou 46.969.763 votos, correspondendo a 44,85 por cento.

De acordo com os resultados divulgados pela meia-noite em Portugal, a abstenção foi de 21 por cento, num total de mais de 147,3 milhões de eleitores inscritos.
Capitão do exército reformado e defensor da ditadura militar - regime que vigorou no Brasil entre 1964 e 1985 -, Jair Messias Bolsonaro tomou, no início da carreira política, posições extremas e discursos agressivos em defesa da autoridade do Estado e dos valores da família cristã.

O novo Presidente prometeu que o seu Governo "será um defensor da Constituição, da democracia e da liberdade".

"Este é um país de todos nós, brasileiros natos ou de coração, de diversas opiniões, cores e orientações", disse Jair Bolsonaro, que concorreu às eleições pelo Partido Social Liberal.

“Não existem brasileiros do Sul ou do Norte. Somos todos um só país, somos todos uma só nação, uma nação democrática. O Estado democrático de Direito tem como um dos pilares o direito de propriedade e afirmamos aqui o respeito e a defesa desse princípio constitucional, fundador das principais nações democráticas do mundo”, declarou à porta de casa, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro.

Apelidado de "mito" e "herói" pelos correligionários e de "perigo à democracia" por críticos e adversários, Bolsonaro ocupa há 28 anos cargos políticos e foi eleito deputado sete vezes consecutivas.

Aos 63 anos, Bolsonaro mobilizou milhares de eleitores desiludidos com a mais grave crise económica do Brasil, enquanto outros líderes políticos têm sido envolvidos em escândalos de corrupção.

Governo com estrutura reduzida e compromisso com federalismo
O recém-eleito Presidente do Brasil anunciou que vai "reduzir a estrutura e burocracia" do Governo. Empenhado em "construir um futuro melhor", que disse passar por um Governo que "crie condições para que todos cresçam", Jair Bolsonaro revelou que o Governo federal terá uma estrutura mais reduzida e menos burocracia, “cortando desperdícios e privilégios, para que as pessoas possam dar muitos passos à frente".

"Vamos confiar nas pessoas, vamos desburocratizar, simplificar e permitir que o cidadão e o empreendedor tenha mais liberdade para criar e construir o seu futuro. Vamos desamarrar o Brasil", declarou.

Avançando ter três nomes confirmados como elementos do seu executivo e um quarto "quase certo", Jair Bolsonaro disse que vai anunciar a composição do novo Governo "com muita cautela".

"Outro paradigma a quebrar" pelo novo executivo liderado por Jair Bolsonaro passa por "respeitar, de verdade, a federação" brasileira, transferindo os recursos federais diretamente para os estados.

"As pessoas vivem nos municípios, portanto os recursos federais irão diretamente do Governo central para os estados e municípios. Colocaremos de pé a federação brasileira", disse. "Precisamos de mais Brasil e menos Brasília", concluiu.
Acabar com “círculo vicioso da dívida” e com “viés ideológico”
No primeiro discurso após terem sido conhecidos os resultados, o novo Presidente do Brasil declarou que objetivo do seu Governo não é a "resposta às necessidades imediatas", mas antes "criar um novo futuro para os brasileiros", ao transformar o país numa "nação livre, democrática e próspera".

Jair Bolsonaro disse estar comprometido com o "emprego, renda e equilíbrio fiscal". Além disso, está empenhado em acabar com "círculo vicioso do crescimento da dívida, substituindo-o por um círculo virtuoso de menores défices, dívida decrescente e juros mais baixos", o que "estimulará os investimentos, o crescimento e a consequente geração de emprego".

"O défice público primário precisa de ser eliminado o mais rápido possível e convertido em superavit. Este é o nosso propósito", sublinhou.

No que respeita à política externa do país, Bolsonaro prometeu "libertar o Brasil e o Itamaraty (Ministério das Relações Exteriores) das relações internacionais com viés ideológico a que foram submetidos nos últimos anos".

"O Brasil deixará de estar apartado das nações mais desenvolvidas. Buscaremos relações bilaterais com países que possam agregar valor económico e tecnológico aos produtos brasileiros", sustentou.
“Mudar o destino do Brasil”
Bolsonaro, que também se dirigiu aos cidadãos brasileiros através da rede social Facebok, afirmou que os eleitores “clamavam por mudanças. Não poderíamos mais continuar flertando o socialismo, com o comunismo, com o populismo e com o extremismo da esquerda”.



Sobre a mesa estavam uma cópia da Constituição do Brasil, uma tradução da Bíblia, do pastor americano Eugene Peterson, e o livro Memórias da Segunda Guerra Mundial, de Winston Churchill, então primeiro-ministro do Reino Unido.

"Nós fomos declarados vencedores desse pleito. E o que eu mais quero é, seguindo ensinamentos de Deus, ao lado da Constituição brasileira, inspirando-me em grandes líderes mundiais, e com uma boa assessoria técnica e profissional ao seu lado, isenta de indicações políticas de praxe, começar a fazer um governo, a partir do ano que vem, que possa realmente colocar o nosso Brasil em lugar de destaque. Temos tudo para ser uma grande nação ", afirmou Bolsonaro.

O novo presidente tinha começado a intervenção com um agradecimento a Deus e aos profissionais de saúde da Santa Casa de Juiz de Fora, onde esteve internado após o esfaqueamento de que foi alvo no início da campanha. Expressou ainda gratidão ao povo brasileiro pela "confiança" depositada e citou a Bíblia, defendeu que “temos de nos acostumar a com conviver com a verdade”, tendo o povo “o direito de saber o que acontece no seu país”.

Considerando existirem "condições de governabilidade", Bolsonaro garantiu que "todos os compromissos assumidos serão cumpridos com as mais variadas bancadas, (e) com o povo".

“Vamos juntos mudar o destino do Brasil. Sabíamos para onde estavamos indo, agora sabemos para onde queremos ir", declarou. “Missão não se escolhe, nem se discute. Cumpre-se! A nós cabe-nos resgatar o nosso Brasil”, concluiu.
Programa de Bolsonaro a nível económico:
- Redução da dívida de 20 por cento através de privatizações;

- Criação de um sistema de pensões paralelo através de capitalização própria;

- Criação de um 'superministério' da Economia sob o comando de Paulo Guedes, liberal que defende a mínima participação do Estado na Economia nacional;

- Reorganização do sistema tributário e criação de uma taxa única de 20 por cento, que reduz a carga fiscal para quem tem maiores rendimentos.
Programa a nível Social:
- Redução da maioridade de penal de 18 para 17 anos. Inicialmente, Bolsonaro pretendia a redução para 16 anos, mas o receio de uma rejeição pelo parlamento, levou a que a alteração ficasse pelos 17 anos;

- Alívio da regulamentação do porte de armas. "As armas são instrumentos, objetos inertes, que podem ser utilizadas para matar ou para salvar vidas. Isso depende de quem as está usando";

- Garantia de "proteção jurídica" para polícias que utilizem armas em serviço;

- Fim de programas de liberdade condicional ou redução de pena e aumento do número de encarceramentos, isto num país com prisões sobrelotadas;

- Considerar a invasão de propriedades rurais ou urbanas como atos de "terrorismo";

- "Queremos um Governo decente, diferente de tudo aquilo que nos jogou numa crise ética, moral e fiscal". Promete diminuir para metade o número de ministros, de modo a limitar o número de acordos entre partidos.
Programa para a Política Externa:
- "Deixaremos de louvar ditaduras assassinas e desprezar ou mesmo atacar democracias importantes como EUA, Israel e Itália";

- O programa de Bolsonaro não menciona o Mercosul, espaço de comércio-livre para a América Latina, preferindo "focar-se em relações e acordos bilaterais".
Programa para a Educação:
- Alteração dos currículos escolares: "Mais matemática, ciências e português, sem doutrinação e sexualização precoce";

- "Inverter a pirâmide" para concentrar mais investimentos na escola primária que no ensino superior;

- Promover a educação por correspondência em locais de difícil acesso para "ajudar a combater o marxismo";

- Estabelecer um colégio militar (gerido pelo exército) em cada uma das 26 capitais de Estado, bem como no Distrito Federal de Brasília. Atualmente, o Brasil conta com 13 colégios militares em 11 capitais.
Programa para os Direitos Humanos:
- Bolsonaro não pretende alterar legislação relativa ao aborto, uma vez que a lei atual apenas permite interrupção da gravidez em casos de violação, risco para a saúde da mãe ou uma grave malformação do cérebro do feto;

- Enquanto deputado, Bolsonaro apresentou propostas para o controlo de natalidade, liberalizando vasectomias e laqueação de trompas e prometendo bolsas de apoio a quem realizasse estes processos.;

- Os direitos da comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgéneros) não são abordados no programa de Bolsonaro. Durante a campanha, proferiu várias declarações de cariz homofóbico.
Programa para o Ambiente:
- Bolsonaro reúne um forte apoio do negócio agrícola e pastorício. O seu programa não menciona a desflorestação ou o aquecimento global. O Acordo de Paris, a que se terá referido, também não consta no programa;

- Admitiu reagrupar os Ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente, mas recentemente disse estar "aberto à negociação" nesse ponto. Este ponto é um dos mais controversos no seu programa, uma vez que pode colocar os órgãos de fiscalização e regulamentação de abusos ambientais sob a tutela de um Ministério controlado pelo lobby do negócio agrícola e pastorício;

- Não pretende dar "um centímetro mais" às reservas de indígenas no Brasil.

c/ Lusa
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