Camponeses de Macomia relatam medo e intensos tiroteios nas matas

por Lusa

Populares de Macomia, na província moçambicana de Cabo Delgado, relataram hoje à Lusa intensos tiroteios e medo nas matas do posto administrativo de Mucojo, a 40 quilómetros da sede daquele distrito, atacada há duas semanas.

A situação afeta sobretudo os camponeses das zonas de produção de Nambine e Namigure, a pouco mais de 10 quilómetros de Mucojo, que desde a invasão por cerca de uma centena de insurgentes à vila sede de Macomia têm acompanhado diariamente tiroteios naquelas matas.

"Não está fácil, todos os dias nós acompanhamos tiroteios, na zona de Mucojo. Não tenho sacos para ensacar de forma rápida o milho, não sei se vou conseguir tirar todo ele", descreveu à Lusa Dorteia Jerónimo, 40 anos, camponesa e mãe de quatro filhos, dependentes desta produção agrícola para se alimentarem.

Os populares desconhecem a origem dos intensos e contínuos tiroteios, mas receiam ter de abandonar o campo.

"É uma possibilidade, estamos com medo, as pessoas, não sabem se são as nossas Forças de Defesa e Segurança ou se são os rebeldes, o certo é que houve se quase todos os dias tiroteios, lá em Mucojo", disse outro camponês, à Lusa.

O posto administrativo de Mucojo, em Macomia, é uma zona considerada de capital importância para o distrito e para a província de Cabo Delgado, dada a potencialidade económica caracterizada sobretudo pela produção do peixe.

O ataque de grupos insurgentes à vila de Macomia, um dos maiores dos últimos meses no norte de Moçambique, palco de uma insurgência armada, provocou de 10 a 14 de maio quase 1.500 deslocados, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), além de relatos da população sobre saque e pilhagem de lojas e outras ONG.

Segundo o mais recente relatório daquela agência do sistema das Nações Unidas, que a Lusa noticiou anteriormente, os "ataques e receios de ataques" por parte destes grupos armados levaram à fuga de mais de 530 famílias de Macomia, totalizando 1.461 pessoas registadas pela OIM nos locais de destino, sendo mais de metade (57%) crianças.

A Médicos Sem Fronteiras (MSF) anunciou na quarta-feira que as instalações daquela Organização Não-Governamental (ONG) em Macomia foram "saqueadas" durante o ataque terrorista à vila em 10 de maio, levando à suspensão das atividades locais.

"Durante o ataque, as instalações de MSF foram saqueadas. Todos os profissionais de MSF encontram-se em segurança. No entanto, medicamentos, equipamentos médicos e carros foram roubados", refere a ONG em comunicado.

Acrescenta que "o ataque forçou a organização a suspender" todas as suas atividades em Macomia.

"A MSF prestava serviços de saúde primários e atividades que salvavam vidas na sua maternidade e unidade de emergência, para uma população de mais de 150.000 pessoas. As equipas da MSF asseguravam igualmente o encaminhamento de pacientes para o hospital mais próximo, em Pemba, a três horas de carro em uma zona de conflito", sublinha a ONG.

O Ministério da Defesa Nacional confirmou em 10 de maio este "ataque terrorista", garantindo que um dos líderes do grupo foi ferido pelas Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM) e outro morto.

Posteriormente, fontes locais consultadas pela Lusa confirmaram que pelo menos cinco corpos foram encontrados no regresso da população à vila de Macomia, após a saída dos grupos insurgentes da localidade -- segundo alguns relatos com cerca de 100 homens -, mais de 24 horas depois.

Os ataques levaram ainda à pilhagem das lojas da vila, tendo os insurgentes levado igualmente viaturas e motorizadas.

O Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, já confirmou este ataque à sede distrital de Macomia, explicando que aconteceu numa zona antes controlada pelos militares da missão dos países da África austral, que está em progressiva retirada até julho,

Cabo Delgado enfrenta desde outubro de 2017 uma rebelião armada com ataques reclamados por movimentos associados ao grupo extremista Estado Islâmico.

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