Canal da Mancha. França detém mais um suspeito de tráfico de pessoas após naufrágio fatal

por Joana Raposo Santos - RTP
O quinto suspeito conduzia um veículo de matrícula alemã e terá comprado na Alemanha os semirrígidos onde seguiam os migrantes. Gonzalo Fuentes - Reuters

França deteve, na última madrugada, uma quinta pessoa por suspeitas de tráfico humano, na sequência do naufrágio que fez cerca de três dezenas de mortos no Canal da Mancha.

As autoridades francesas tinham já detido, horas após a descoberta dos corpos, quatro alegados traficantes de pessoas suspeitos de estarem ligados ao incidente no Canal da Mancha.

Esta manhã, o ministro francês do Interior anunciou uma quinta detenção. Segundo Gerald Darmanin, o homem conduzia um veículo de matrícula alemã e terá comprado na Alemanha os barcos semirrígidos onde seguiam os migrantes.

O número de vítimas mortais do episódio no Canal da Mancha ainda pode aumentar. Entre os 27 óbitos já confirmados encontra-se um adolescente e três crianças, segundo fontes policiais ouvidas pela Agence France-Presse.

Os migrantes saíram do porto francês na tentativa de chegarem ao Reino Unido, mas apenas dois foram, até agora, encontrados com vida.

Os dois sobreviventes, um iraquiano e um somali, estavam em “grave hipotermia” na quarta-feira, mas hoje estarão “um pouco melhor”, anunciou o ministro francês do Interior, acrescentando que ambos os homens serão ouvidos rapidamente.
"Organizações mafiosas"
Apesar da tragédia e do tempo agitado, muitos migrantes continuam a tentar alcançar o Reino Unido. Esta manhã, dois barcos com cerca de 40 pessoas atracaram na cidade de Dover, em Inglaterra.

A Jurisdição Especializada Inter-regional da cidade de Lille, junto a Calais, já abriu uma investigação à tragédia no Canal da Mancha, referindo-se a alegados crimes de “ajuda à entrada e estadia irregulares por grupo organizado”, “homicídio e lesões involuntárias” e “associação criminosa”.

O ministro Gerald Darmanin informou esta quinta-feira que, desde 1 de janeiro deste ano, o país já deteve 1.500 traficantes de seres humanos. Os contrabandistas funcionam como “organizações mafiosas” que atuam no “crime organizado”, chegando mesmo a utilizar “telefones codificados”, especificou o governante. Os ministros francês e britânico do Interior deverão reunir-se ainda esta quinta-feira para discutir o assunto.

Darmanin alertou para o facto de estas “associações criminosas” estarem presentes na Bélgica, Alemanha e Inglaterra, defendendo, por isso, que os países trabalhem juntos no combate a este problema.

As tentativas de atravessar o Canal da Mancha a bordo de pequenas embarcações, instáveis e sem segurança, duplicaram nos últimos três meses, alertou recentemente o prefeito marítimo do Canal da Mancha e do Mar do Norte, Philippe Dutrieux.

Entre o início deste ano e até 20 de novembro, cerca de 31.500 migrantes partiram das costas francesas e 7.800 foram resgatados. Apesar das temperaturas rigorosas nos meses mais frios, a tendência não diminuiu.

Segundo o Reino Unido, nos primeiros dez meses do ano foram 22 mil os migrantes a fazer a travessia.
Reino Unido e França trocam acusações

O presidente francês, Emmanuel Macron, veio já assegurar que “a França não permitirá que o Canal da Mancha se transforme num cemitério”, apelando a uma “reunião de emergência dos ministros europeus”.

Em entrevista à Sky News, o primeiro-ministro britânico disse, por sua vez, estar “chocado, revoltado e profundamente triste”, garantindo que quer “fazer mais”, em conjunto com a França, para desencorajar as travessias ilegais.

Boris Johnson afirmou ainda ter encontrado “dificuldades em persuadir alguns aliados, em particular os franceses, a agir” perante a crise migratória.

A presidência francesa avançou esta quinta-feira que Macron já esteve ao telefone com Johnson, a quem terá transmitido a esperança de que “os britânicos cooperem totalmente e se abstenham de instrumentalizar uma situação dramática para fins políticos”.

Segundo o Eliseu, “o presidente da República insistiu na necessidade de agirmos com dignidade, respeito e espírito de cooperação no que diz respeito às vidas humanas”.
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