Capitólio. Justiça e juízes divergem quanto à detenção dos invasores

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
Shannon Stapleton - Reuters

Na terça-feira, o assalto ao Capitólio a 6 de janeiro começou a ser investigado por uma comissão de inquérito e o Departamento de Justiça está a enfrentar um caminho difícil ao tentar manter os invasores detidos até ao julgamento. Juízes e procuradores divergem quanto à detenção dos responsáveis pelo assalto e existem já vários recursos em marcha.

Foram já formalmente acusados mais de 230 apoiantes de Donald Trump que, a 6 de janeiro, tentaram impedir a certificação de Joe Biden como novo Presidente.

Vários juízes federais rejeitaram os pedidos iniciais do Departamento de Justiça para manter os réus detidos até ao julgamento e existem já vários recursos em marcha.

O debate entre juízes e procuradores na questão da detenção ficou mais explícito em dois momentos durante a comissão de inquérito na terça-feira, num tribunal em Washington, quando os procuradores apresentaram os argumentos para manter em detenção um membro de um grupo extremista pró-Trump, os Proud Boys, e um alegado conspirador entre o grupo paramilitar de extrema-direita, os Oath Keepers.

Segundo a lei, apenas certos tipos de crimes violentos tornam a detenção dos réus até ao julgamento necessária. Os juízes têm de avaliar possíveis ameaças futuras para tomar uma decisão, nomeadamente a possibilidade de fuga, destruição de provas ou a prática de atos violentos por parte do réu.

Os procuradores procuram agora evocar a ameaça relacionada com o porte de armas e comportamentos que os réus tomaram após dia 6 como argumentos na apresentação dos casos para a detenção.

No caso do membro dos Proud Boys, William Chrestman, a juíza Beryl Howell, em Washington, questionou os procuradores a razão pela qual um entre os mais de uma dúzia de assaltantes ao Capitólio afiliados a este grupo deveria permanecer na prisão quando o Departamento de Justiça não questionou, previamente, a liberdade de outros líderes dos Proud Boys que foram detidos (Nicholas Ochs e Nicholas DeCarlo).

“É tudo por causa do cabo de machado que o réu [Chrestman] estava a carregar para o Capitólio?”, questionou a juíza. Chrestman foi identificado nas imagens com um cabo de machado na mão enrolado numa bandeira norte-americana. Os procuradores defenderam que o membro dos Proud Boys é mais perigoso pelo porte dessa arma.

Howell concordou e ordenou que Chrestman ficasse detido até ao julgamento. “Ele não vinha para passear. Ele vinha com uma máscara de gás, um cabo de machado. Houve algum planeamento”, argumentou a juíza.

Mas nem todos os juízes concordaram com os argumentos apresentados pela Justiça sobre a necessidade de manter os réus detidos.
Juízes anulam decisões
Numa outra audiência durante a tarde de terça-feira, o Departamento de Justiça enfrentou uma maior resistência enquanto apelava à detenção de Jessica Watkins, membro dos Oath Keepers.

Watkins declarou-se inocente do crime de conspiração e outras acusações relacionadas a 6 de janeiro, e o seu advogado argumentou que não foi violenta naquele dia. Mas o Departamento de Justiça compartilhou declarações e mensagens de texto para argumentar que Watkins tinha participado no assalto.

Os procuradores argumentaram que Watkins demonstrou vontade de invadir o Capitólio “clandestinamente” se Joe Biden fosse eleito, mas o juiz não se mostrou convencido. “Não está claro para mim em que o Governo está a contar” para justificar a detenção de Watkins, disse o juiz Amit Mehta.

Os procuradores argumentaram que as acusações relacionadas com o planeamento e ameaças ao Congresso eram um crime de terrorismo que justificava prisão e defenderam ainda que havia o risco de fuga por parte de Watkins.

“Ela entregou-se. Eu tenho dificuldades em perceber que ela constitui um sério risco de fuga”, defendeu o juiz. Mehta acabou por não tomar uma decisão quanto à detenção de Watkins, esperando-se que sejam apresentados mais argumentos na sexta-feira. Watkins permanecerá detida até lá.

Em dois outros casos, o Departamento de Justiça saiu derrotado numa discussão e vencedor noutra acerca da possibilidade de manter os assaltantes ao Capitólio detidos. Em ambos os casos foram anuladas decisões prévias de juízes.

Doug Jensen, do Iowa, que foi filmado a perseguir um agente policial do Capitólio no dia 6 de janeiro, permanecerá na prisão. O juiz Timothy Kelly argumentou, na terça-feira, que não existem indicações de que o “interesse pela revolução” por parte de Jensen tenha desaparecido após o ataque. A decisão de Kelly anulou a deliberação de um juiz de primeira instância em Iowa para libertar Jensen.

No outro caso, Christopher Grider, que alegadamente disse à sua esposa para "se livrar das coisas de Trump" após o motim, foi colocado em liberdade pelo juiz Kentaji Brown Jackson. Os advogados de defesa de Grider argumentaram que ele foi um "observador passivo" da insurreição. Grider declarou-se inocente.
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