Coronavírus. Hospital de Wuhan confirma morte de médico Li Wenliang

Depois de desmentir notícias sobre a morte de um dos seus médicos, o Hospital Central de Wuhan confirmou, ao início da noite em Portugal, o falecimento de Li Wenliang devido a uma infeção com o 2019-nCoV.

RTP /
Foto: Twitter

O médico oftalmologista ficou conhecido depois de ter denunciado o início da epidemia do novo coronavírus no Hospital Central de Wuhan, no final de dezembro.

Foi um dos oito médicos que publicou nas redes sociais alertas sobre o que se passava, o que lhe valeu ser investigado pela polícia e forçado ao silêncio.

Li "morreu depois dos esforços que empreendemos para o ressuscitar. Lamentamos profundamente o seu falecimento", lê-se num comunicado, publicado na conta oficial do Hospital no site Weibo e reproduzido pelo South China Morning Post.

O médico, de 34 anos, morreu às 2h58 minutos de sexta-feira [hora local], revelou ainda o Hospital.

A confirmação da morte de Li Wenliang surgiu ao fim de horas de confusão. Anunciada por vários media, chineses e internacionais, foi depois negada pelo Hospital.

Li estava em estado "crítico" e sobrevivia à custa de ventilador, explicava o desmentido, no qual o centro hospitalar lamentava ainda que o médico tivesse sido infetado pelo mesmo coronavírus para o qual alertara outros médicos.

O coração de Li havia parado cerca das 21h30 locais de quinta-feira, tendo sido então submetido a tentativas de reanimação e colocado sob respiração artifical.
Raiva e exigência de desculpas
A morte de Li está a levar a uma onda de comoção e de raiva nas redes sociais, com vários internautas a censurarem a conduta das autoridades pela perseguição feita ao médico no início da epidemia.

Além de publicarem imgens de velas, muitos exigem desculpas públicas pela forma como Li foi tratado.

"Nenhuma polícia alguma vez lhe pediu desculpa. Poderia ter sido um herói nacional, mas a negligência de alguns custou-lhe a sua vida, assim como a de umas centenas de inocentes", escreveu um utilizador da rede Weibo.

"A reprimenda do doutor Li será uma nódoa na história chinesa contra a epidemia. O doutor Li alertou o público à custa da própria vida. A esquadra de Wuhan ainda não retirou de publicação a sua reprimenda, mesmo após a sua morte", criticou outro.

As autoridades chinesas têm sido acusadas de tentar ocultar a epidemia na cidade de Wuhan, o que poderá ter ajudado à disseminação do vírus.

O esforço que está a ser exigido aos profissionais de Saúde em Wuhan é igualmente alvo de críticas, depois da morte de um jovem médico de 28 anos, devido a exaustão.

Forçado a retractar-se
Wenliang foi um dos primeiros médicos do Hospital Central da capital da província de Hubei a falar publicamente da epidemia.

O próprio contou a sua história a partir da sua cama de hospital, depois de ter sido internado.

A 30 de dezembro comentou o caso no Weibo, num grupo de conversa com colegas de curso. Vários pacientes estavam internados de quarentena no Hospital, devido a uma infecção respiratória, por um coronavírus semelhante ao SARS.

Li avisava-os para terem cuidado e usarem vestuário protetor para evitarem a infeção.

Apesar de ter sido publicado num grupo, o alerta depressa começou a circular nas redes sociais.

No mesmo dia, as autoridades de saúde locais confirmaram 27 casos de um novo tipo de vírus
, todos eles ligados a um mercado local de marisco.

Isso não evitou que Li e os outros médicos tivessem sido obrigados a desdizer-se e a remeter-se ao silêncio quanto à nova doença.
Quatro dias depois de publicar a primeira mensagem, Li foi chamado ao Gabinete de Segurança Pública de Wuhan, onde teve de assinar uma carta, na qual era acusado de "fazer comentários falsos" que "pertubavam gravemente a ordem social".

Li Wenliang era então um de oito médicos investigados pela polícia por "espalhar rumores" e denunciados publicamente pelos órgãos de comunicação do Partido Comunista Chinês.

Nas suas publicações no Weibo, o médico escreveu que a três de janeiro regressou ao trabalho.

Uma semana depois, a 10 de janeiro, começou a tossir, no dia seguinte tinha febre e dois dias depois estava internado no hospital.

"Na altura, o Governo ainda insistia que não existia transmissão entre humanos e dizia que ninguém nas equipas médicas tinha sido infetado. Fiquei muito confuso", escreveu Li a 31 de janeiro.

"Os meus testes virais ainda são negativos, mas estou com dificuldades em respirar, mal consigo mexer-me. Os meus pais também estão internados", acrescentou.
A reprimenda
No mesmo dia, Li Weinliang publicou uma fotografia da reprimenda que fora forçado a assinar a 3 de janeiro.

"Fica avisado solenemente que, se insistir nas suas afirmações e permanecer impenitente, e continuar a prosseguir actividades ilegais, será punido por lei", lê-se na carta da polícia de Wuhan publicada pelo South China Morning Post.


No dia seguinte a estas publicações, sábado, dia 1 de fevereiro, o médico foi diagnosticado com o coronavírus 2019-nCoV.

A notícia da sua morte, esta quinta-feira, provocou manifestações de pesar em todo o mundo, com a OMS a deixar uma mensagem especial.

"Lamentamos saber da perda de qualquer pessoa que trabalhe na primeira linha de cuidados dos pacientes", reagiu o diretor do programa de emergências da Organização Mundial de Saúde.

"Deviamos celebrar a sua vida e fazer o luto com os seus colegas", acrescentou Michael Ryan, durante uma reunião.

Os responsáveis do Partido Comunista de Wuhan pediram desculpas formais dia seis de fevereiro, pela falha em providenciar tratamento atempadamente aos pacientes do coronavírus.
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