Covid-19. Estratégia "relaxada" da Suécia sem os resultados esperados

por Inês Moreira dos Santos - RTP
Reuters

Contrastando com a maioria dos países europeus, a Suécia adotou uma abordagem mais "relaxada" face à pandemia da Covid-19. Mas os números das autoridades de saúde levantam dúvidas quanto à estratégia.

Se os países vizinhos optaram, nas últimas semanas, por impor diversas medidas restritivas para combater a propagação da Covid-19, a Suécia diferenciou-se pelas medidas mais "relaxadas" e pelos resultados que têm suscitado algumas críticas.

A Suécia optou por uma abordagem bem diferente do resto do mundo: os cidadãos é que assumem a responsabilidade individual de manter o distanciamento social e o Governo mantém a maior parte da sociedade a funcionar. O Governo pede que, sempre que possível, as pessoas trabalhem a partir de casa e evitem sair.

No país, muitas escolas continuam em funcionamento, os cabeleireiros, os bares e os restaurantes continuam abertos, desde que seja respeitado o distanciamento social.

Já as visitas a lares de terceira idade e instituições de saúde foram proíbidas, sendo, aliás, uma das poucas restrições impostas pelo Governo sueco. As pessoas com mais de 70 anos ou com sintomas e suspeitas de infeção são incentivadas a ficar isoladas e a não sair de casa.

Embora as medidas da Suécia contrastem com as medidas aplicadas nos restantes países escandinavos, a população tem assumido a sua responsabilidade. De facto, segundo as estatísticas, a mobilidade dos cidadãos na capital sueca, Estocolmo, teve uma queda de 75 por cento.

O epidemiologista responsável pela estratégia sueca face à Covid-19, Anders Tegnell, considera que a estratégia está a resultar: "Podemos já ter atingido o pico", disse numa conferência em meados de abril.

Na verdade, a maioria dos suecos tem apoiado as medidas do Governo, alegando que o distanciamento social já é um hábito comum na população.

Mas os números não revelam resultados animadores com esta estratégia. A Suécia, até à data, tem mais de 18.600 casos de infeção e 2194 mortes devido à Covid-19, sendo o país nórdico mais afetado pelo novo coronavírus.
Suécia - o país nórdico mais afetado
Entre os países escadinavos, a Suécia é o que, segundo os dados das autoridades de saúde, tem mais infetados e mortos devido à pandemia. A Finlândia, a Noruega e a Dinamarca - países nórdicos e com alguns costumes comuns - adotaram estratégias mas rígidas.

A Dinamarca, por exemplo, impôs medidas de confinamento e suspensão de atividades generalizadas desde o dia 11 de março, tendo sido também dos primeiros países a fechar fronteiras. Até segunda-feira, os dados revelavam que tinha 8698 infetados e 427 mortos devido ao novo coronavírus - um número bastante inferior relativamente à Suécia.

Também a Noruega - com cerca de 7590 casos confirmados e 205 mortos - e a Finlândia - com 4695 infetados e 193 óbitos - adotaram medidas mais restritivas e impuseram o isolamento social.

De facto, as reduzidas restrições e os números mais elevados na Suécia têm levantado questões quanto à estratégia adotada pelo Governo.

Uma das poucas imposições do país foi a proibição das visitas a lares de idosos. No entanto, cerca de 50 por cento das mortes por Covid-19 na Suécia têm ocorrido nestas instituições, o que tem gerado controvérsia.

Esta semana, o Conselho Nacional de Saúde e Bem-Estar da Suécia publicou um conjunto de dados sobre as mortes causadas pelo coronavírus, sugerindo que o número real de mortes pode ser até 10 por cento superior do que revelam os números da Agência de Saúde Pública sueca.
"Imunidade de rebanho" - a controversa estratégia

A maioria dos especialista acusa o Governo sueco de usar a estratégia de "imunidade de rebanho", embora as autoridades de saúde o neguem.

Numa petição assinada por cerca de dois mil investigadores suecos, no final de março, os cientistas apelavam a medidas mais rigorosas no combate à propagação da Covid-19, argumentando que "criar uma imunidade de rebanho, como ocorre durante uma epidemia de gripe, tem pouco apoio científico".

"As medidas devem ter como objetivo limitar drasticamente o contacto entre as pessoas da sociedade e aumentar bastante a capacidade de testar pessoas quanto à Covid-19".

"Estas medidas devem ser implementadas o mais rápido possível, como é atualmente fazem os nossos países vizinhos europeus", lia-se na petição.

Jan Albert, professor do Departamento de Microbiologia e Biologia Celular do Karolinska Institutet, assumiu à CNN o número de mortes na Suécia era superior ao de outros países europeus "provavelmente, em parte" porque não tiveram "um bloqueio tão rigoroso e nem um bloqueio imposto por lei".

No entanto, o investigador considera que a maioria dos cientistas na Suécia acreditava que a "imunidade em rebaho" funcionaria.

"A imunidade do rebanho era a única coisa que acabaria com isto, a menos que houvesse uma vacina a tempo, o que é bastante improvável", acrescentou. "A verdade é que ninguém, nem na Suécia, nem nos outros países, sabe qual é a melhor estratégia".

Para o investigador, as medidas restritivas apenas "achatam a curva", não acabam com os casos.

Por sua vez, o Governo sueco também não considera que o problema esteja na estratégia e nas poucas medidas, mas sim no facto de ter havido transmissão em lares e muitas mortes em consequência disso.

A ministra da Saúde sueca, Lena Hallengren, diz que um dos principais objetivos é melhorar a "proteção aos idosos que vivem em lares e instituições". Quanto aos números pouco animadores, a ministra considera que é "muito cedo para tirar conclusões relativamente às medidas tomadas na Suécia".
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