França. Lecornu anuncia suspensão da reforma das pensões na esperança de evitar censura

O primeiro-ministro francês anunciou esta terça-feira a suspensão "até janeiro de 2028" da reforma das pensões aprovada em 2023, condição inegociável dos socialistas para não apresentarem uma moção de censura ao segundo Governo de Sébastien Lecornu.

Mariana Ribeiro Soares - RTP /
Teresa Suarez

"Vou propor ao parlamento, neste outono, que suspendamos a reforma das pensões de 2023 até às eleições presidenciais. A idade de reforma não será aumentada de agora até janeiro de 2028, tal como solicitou especificamente a CFDT [o principal sindicato de França]", disse Lecornu no discurso de política geral perante os deputados da Assembleia Nacional.

O governante alertou, no entanto, que a suspensão desta reforma custará "400 milhões de euros em 2026 e 1,8 mil milhões em 2027" e "terá de ser compensada por poupanças".
A suspensão desta lei controversa do segundo mandato do presidente Emmanuel Macron, aprovada sem votação no parlamento para aumentar a idade legal de reforma para os 64 anos, está no centro das negociações políticas em França há várias semanas.


A sua suspensão é um pré-requisito do Partido Socialista para evitar a queda do Governo e a provável realização de novas eleições legislativas antecipadas.

No seu discurso de meia hora, Lecornu confirmou também o abandono da utilização do artigo 49.3 da Constituição, um procedimento que permite a aprovação de um projeto de lei sem votação. Esta era outra das reivindicações dos socialistas.

Com este anúncio, Lecornu espera escapar a uma censura e uma nova crise política. Após o primeiro ter durado apenas 14 horas na semana passada, o novo Governo de Lecornu foi anunciado na noite de domingo e está já sob ameaças de censura. As moções foram apresentadas pela França Insubmissa (LFI), de esquerda radical, e pelo Rassemblement National (RN), de extrema-direita.
Orçamento do Estado aprovado
O Orçamento do Estado para 2026, que deverá ser adotado até 31 de dezembro, foi também aprovado na manhã desta terça-feira durante a primeira reunião do Conselho de Ministros do Governo de Lecornu.
 A previsão de défice público francês neste projeto de orçamento "é reduzida para 4,7%" do PIB e deverá "em qualquer caso ser inferior a 5% no final da discussão" no Parlamento, reafirmou o primeiro-ministro.

"Não podemos colocar o nosso país num estado duradouro de dependência de credores estrangeiros, e eu não serei o primeiro-ministro de uma derrapagem nas finanças públicas", disse Lecornu, numa altura em que França, a segunda maior economia da Zona Euro, tem uma dívida de 3.400 biliões de euros.

O Conselho Superior de Finanças Públicas alertou, no entanto, que o projecto de orçamento assentava em pressupostos de crescimento um pouco "otimistas" demais. A líder da extrema-direita, Marine Le Pen, por sua vez, considerou-o "terrivelmente mau".

Em mais uma promessa aos socialistas, que pedem uma medida de justiça fiscal, Sébastien Lecornu reconheceu "anomalias" na tributação dos mais ricos, pedindo "uma contribuição excecional" dos franceses mais ricos no próximo orçamento.

A França atravessa um período de instabilidade política sem precedentes desde que o presidente Emmanuel Macron decidiu dissolver a Assembleia Nacional e convocar eleições antecipadas, em junho de 2024, após a derrota para a extrema-direita nas eleições europeias.

Destas eleições resultou uma câmara sem maioria parlamentar dividida entre a esquerda, o centro-direita e a extrema-direita.

"Alguns gostariam que esta crise parlamentar se transformasse numa crise de regime. Isso não vai acontecer", declarou Lecornu no discurso desta terça-feira. Se o Parlamento francês não aprovar um orçamento para 2026, "os únicos que acolheriam uma crise não seriam os amigos da França", alertou ainda o primeiro-ministro.

c/agências

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