Homenageado na Galiza o cérebro do assalto ao "Santa Maria", José Velo

por RTP
Da esq. para a dir.: Miguel Urbano Rodrigues, Henrique Galvão, José Velo, Jorge Soutomaior DR

Está a ser objecto de um programa de comemorações intenso o cinquentenário da morte de Xosé Velo Mosquera, por muitos considerado o ideólogo do assalto ao navio português "Santa Maria", que teve Henrique Galvão como protagonista de maior notoriedade pública. Velo faleceu no Brasil em 30 de janeiro de 1972.

O município de Celanova, terra natal de Velo, levou a cabo ontem, dia do cinquentenário, um acto público de homenagem no Parque das Triguerizas, onde se encontra um monumento evocativo do homem de cultura e activista político da causa antifranquista e do nacionalismo galego. Para a sessão pública estavam previstos um recital de poesia e um concerto. Um artigo de Aser Álvarez foi publicado nesta circunstância com uma súmula dos principais dados biográficos de Velo. Um pequeno documentário evocou a sua participação na tomada do "Santa Maria", com o som de um discurso do próprio Velo.

Xosé Velo Mosquera nasceu numa família abastada de Celanova em 21 de abril de 1916, iniciou em Santiago de Compostela um curso universitário de Filosofia e Letras e aí foi surpreendido pelo levantamento franquista. 

Foi detido, por se recusar a entregar as fichas de militantes ds Mocidades Galeguistas, sendo depois incorporado no Exército que combatia a República. E nele teve de permanecer durante mais dois anos, porque não conseguiu levar a bom porto os planos que por duas vezes elaborou, visando desertar e passar-se para o lado republicano. Em 1938 foi desmobilizado e partiu para África, onde iria permanecer quase até ao fim da guerra civil.

Em 1946, já a residir em Vigo com a mulher e os filhos, viria a ser detido com o seu amigo Mariano Otero Castelao numa vasta operação contra as guerrilhas antifranquistas, sofrendo violentas torturas e permanecendo na cadeia durante vários meses. Algum tempo depois, conseguiram ambos fugir durante uma saída precária. Permaneceu clandestinamente na Galiza até conseguir passar a fronteira com Portugal.

Em Portugal, Velo e Castelao foram acolhidos no Estoril por um amigo da família de Velo, mas acabaram por ser detectados pela PIDE, detidos e internados em Caxias, até finalmente serem libertados graças a intervenções do Unitarian Service e do então presidente venezuelano Rómulo Gallegos. Puderam então partir para a Venezuela, onde chegaram em 9 de outubro de 1948. A mulher e os três filhos de Velo só um ano depois puderam ir reunir-se-lhe em Caracas.

Depois do derrubamento de Rómulo Gallegos, instaurara-se na Venezuela a ditdura de Pérez Jiménez e Velo envolveu-se na luta contra ela. Ao ser derrubado Pérez Jiménez, Velo pôde retomar actividades legais de promoção da cultura galega e de defesa da comunidade emigrada. Em 1956 tornou-se presidente do Lar Gallego e como tal participou no I Congresso da Emigração, realizado em Buenos Aires.

A finais de 1949, tras unha breve estadía en Estoril Xovita Pérez viaxa a Caracas cos seus tres fillos coa intención de reunirse co seu home, que naquela altura xa tiña comezado unha intensa vida política e social en Caracas, colaborando na loita contra a ditadura venezolana e, xa tras a caída de Pérez Jiménez, asumindo directamente responsabilidades para promover a unión dos colectivos de emigrantes galegos en Venezuela.

O activismo antifranquista de Velo prosseguia entretanto e em 1959 veio a assumir responsabilidades dirigentes no grupo Galeuzka, que iria estar na origem do DRIL (Directório Revolucionário Ibérico de Libertação). E foi no seu apartamento em Caracas, após reunião com o general Humberto Delgado, que acabou por ser fundado esse mesmo DRIL, com directa participação do galego José Fernández (mais tarde conhecido pelo alias de comandante Sottomayor) e do exilado português Henrique Galvão. Aí começaram também a planear a chamada "Operação Dulcineia".

Esta foi iniciada na madrugada de 22 de janeiro de 1961, com os comandos do DRIL a tomarem o navio português "Santa Maria", rebaptizado como "Santa Liberdade". Dos confrontos para a tomada do navio resultou a morte de um tripulante e o ferimento de um outro, que foi desembarcado na ilha de Santa Lucia.

Um compromisso assumido pelo novo presidente do Brasil, Jânio Quadros, permitiu ao navio rumar ao porto do Recife e aí ser entregue, para devolução a Portugal, contra a garantia de os autores da acção poderem desembarcar como refugiados políticos, sem sofrerem qualquer perseguição. Velo e o filho mais novo, Victor, ambos envolvidos no assalto, puderam portanto instalar-se em São Paulo, onde depois se lhes foi reunir a mulher, tendo os outros dois filhos permanecido na Venezuela.

Pouco mais de dois anos depois, deu-se o golpe militar e iniciou-se a ditadura dos generais brasileiros. Velo envolveu-se ainda na luta contra esse novo regime, desta vez com menos sucesso do que na Venezuela. Viria a morrer, em São Paulo, em 30 de janeiro de 1972, sem ter visto o fim de mais essa ditadura e pouco antes de começar a dissolução da ditadura franquista.
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