Irão. Ativista detida descreve violência e tortura vivida nas prisões

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
Reuters

Sepideh Qolian, uma das ativistas mais proeminentes do Irão, descreve numa carta o tratamento bárbaro que ela e os outros detidos receberam por parte dos interrogadores. Segundo Qolian, os detidos são vítimas de abusos e forçados a confessar. As confissões são posteriormente transmitidas pela televisão estatal e os detidos são condenados e outros enforcados.

Na sua carta, citada pela BBC, Qolian explica que uma das alas da prisão de Evin, onde se encontra, foi transformada num espaço de “tortura e interrogatório”. “A sala está cheia de meninos e meninas e os gritos dos torturadores podem ser ouvidos”, descreve Qolian.

A ativista está a estudar direito na prisão. Na carta, Qolian descreve o que testemunhou a 28 de dezembro do ano passado, quando foi levada para esta ala da prisão para realizar um exame. "Está muito frio e a nevar. Perto da porta de saída do prédio, um menino com os olhos vendados e com apenas uma fina camisa cinzenta está sentado em frente a um interrogador. Ele está a tremer e a implorar: 'Juro por Deus que não bati em ninguém'. Eles querem que ele confesse”, lê-se na carta.

A ativista foi detida em 2018 por apoiar uma greve dos trabalhadores e protestar numa fábrica de açúcar na província iraniana de Khuzistão. Na sua carta, Qolian relembra o seu próprio interrogatório, há cinco anos, onde foi forçada a confessar.

Sepideh Qolian diz ter sido interrogada por uma mulher que, depois de horas de inquirição, a trancou dentro da casa de banho. De acordo com Qolian, a casa de banho ficava dentro de uma sala de interrogatório e ela podia ouvir um homem a ser torturado e chicoteado.

"Os sons de tortura continuaram por horas ou talvez um dia, talvez mais, perdi a noção do tempo", escreve.

Depois de três dias de interrogatório contínuo, privada de sono, a ativista iraniana foi levada para uma sala com uma câmara onde foi forçada a confessar.

"Peguei no roteiro dela quando estava semiconsciente e sentei-me à frente da câmara e li", escreve Qolian. Com base nessas mesmas confissões, a ativista foi condenada a cinco anos de prisão.

Em 2019, Qolian identificou a mulher que a interrogou e torturou depois de a ter reconhecido na televisão enquanto assistia às confissões forçadas de outo prisioneiro. Numa carta pública, a ativista identificou a interrogadora como Ameneh Sadat Zabihpour, uma "interrogadora-jornalista" com ligações à Guarda Revolucionária Islâmica.

Em novembro do ano passado, o Departamento do Tesouro dos EUA sancionou Ameneh Sadat Zabihpour. Por sua vez, a interrogadora processou Qolian, que recebeu uma sentença adicional de oito meses por causa das suas acusações.
Milhares de detidos nos protestos
O Irão está a ser palco de violentos protestos, que começaram em meados de setembro do ano passado após a morte sob custódia de Masha Amini – uma mulher de 22 anos que foi detida pela polícia da moralidade por usar o véu islâmico “indevidamente”.

Os protestos rapidamente adquiriram uma nova dimensão, com os manifestantes a criticarem o Governo iraniano e a questionarem a República Islâmica.

“No quarto ano da minha detenção, finalmente consigo ouvir os passos da liberdade de todo o Irão”, escreve Qolian, referindo-se aos protestos antigovernamentais.

De acordo com a Agência de Notícias de Ativistas de Direitos Humanos (HRANA), pelo menos 519 manifestantes, incluindo 69 crianças, foram mortos e 19.300 foram detidos.


Muitos dos detidos enfrentam pena de morte e, até agora, quatro manifestantes foram enforcados depois de as suas confissões terem sido exibidas na televisão.
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