Jornalistas da televisão estatal italiana em greve contra "controlo sufocante" do Governo

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
Jakub Porzycki - NurPhoto via AFP

Vários jornalistas da televisão estatal italiana RAI aderiram, esta segunda-feira, a uma greve de 24 horas em protesto contra o aumento da censura e repressão por parte do Governo de direita. Os jornalistas falam em "controlo sufocante" por parte do Executivo de Giorgia Meloni e acusam o Governo de tentar reduzir a RAI a um "megafone governamental".

“Fazemos greve para defender a autonomia e independência do serviço público de rádio e televisão face ao controlo permanente dos espaços de informação por parte dos políticos”, anunciou o Usigrai, o principal sindicato que representa os jornalistas da RAI, em comunicado.

“Preferimos perder um ou mais dias de salário do que perder a nossa liberdade”, acrescentou o sindicato.


Há duas semanas que os jornalistas das redações da televisão e da rádio da RAI estão a protestar contra a redução do orçamento da empresa, incluindo o congelamento das contratações, a eliminação de postos de trabalho divergências e a reorganização do pessoal.

Para os funcionários, a racionalização tem como objetivo final “reduzir a RAI para se tornar o megafone do Governo”.

Em resposta ao comunicado do sindicato, a direção da RAI afirmou que “nenhuma censura ou ordem de silêncio foi colocada sobre a informação” e acusou o sindicato de fazer greve por “motivos ideológicos e políticos”, que “nada têm a ver com os direitos humanos dos trabalhadores”.

“A greve do sindicato Usigrai, a um mês das eleições europeias, além de empobrecer a oferta de informação, expõe o serviço público à exploração política, privando os cidadãos do direito fundamental à informação, pedra angular da democracia”, acrescenta a direção da televisão estatal italiana no comunicado de imprensa.
Discurso antifascista censurado
A influência política sobre a RAI sempre foi motivo de preocupação e de debate. No entanto, a situação agravou-se desde que Giorgia Meloni, líder do partido Fratelli d'Italia, de origens neofascistas, assumiu o poder em Itália em 2022.

O Governo é acusado de influenciar a programação da televisão estatal, nomeadamente de censurar temas que não estão em sintonia com a sua posição de direita, e de afastar funcionários com opiniões opostas às do Executivo.

A questão da censura ganhou relevo no mês passado, quando a RAI cancelou abruptamente um monólogo de um escritor antifascista que iria para o ar no dia 25 de abril, data em que a Itália comemora a libertação do regime fascista.


O texto era altamente crítico em relação a Meloni, cujo partido tem origens no movimento neofascista italiano.

Funcionários da RAI e a primeira-ministra italiana negaram ter censurado o monólogo, alegando motivos financeiros.

Meloni respondeu publicando o discurso na sua página do Facebook, ao mesmo tempo que criticava Scurati e acusava a oposição de esquerda de “chorar pelo regime”.
Itália desce no ranking de liberdade de imprensa
A greve ocorre numa altura em que a Itália desceu cinco posições no índice anual de liberdade de imprensa, elaborado pela organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF)

No 46.º lugar de um total de 180 países, a Itália passou para a categoria de países “problemáticos”, juntamente com a Polónia e a Hungria.


Os RSF citaram, entre outros, relatos de uma proposta de aquisição da agência noticiosa italiana AGI por um deputado do partido Liga, parceiro de coligação do governo de direita de Meloni. O deputado controla já três diários conservadores.

No mês passado, os jornalistas da AGI entraram também em greve para protestar contra a proposta de venda da ENI, controlada pelo Estado.

c/agências
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