Jovens “inseguros” na mira do Facebook

por RTP
Regis Duvignau - Reuters

O jornal The Australian revelou ter tido acesso a um documento interno produzido pelo Facebook que mostra que esta rede social usa algoritmos para identificar jovens australianos, mesmo com idades como 14 anos, ao permitir que anunciantes os visem quando estão mais vulneráveis, incluindo quando se sentem “inseguros” e “inúteis”.

O jornal australiano fala de um documento de 23 páginas a que teve acesso, classificado como “confidencial: apenas interno” e datado de 2017 que mostra como a rede social pode identificar “momentos em que os jovens precisam de um ‘boost’ de confiança”.

Refere o The Australian que ao monitorizar ‘posts’, fotografias, interações e atividade na internet, o Facebook consegue determinar em tempo real quando os jovens se sentem “derrotados”, “sobrecarregados”, “ansiosos”, “nervosos”, “estúpidos”, “idiotas”, “inúteis” ou “falhados”.

O jornal revela que o estudo foi preparado por dois executivos australianos do Facebook, David Fernandez e Andy Sinn. O documento interno explicará como aquela rede social recolhe informação psicológica sobre mais de seis milhões de estudantes e jovens trabalhadores australianos e neozelandeses.

Uma apresentação terá sido feita para um dos maiores bancos australianos. O documento, não publicado na íntegra pelo The Australian, afirmaria que o Facebook teria uma base de dados dos utilizadores mais jovens: 1.9 milhões de alunos do ensino superior, 1.5 milhões de estudantes do ensino médio e 3 milhões de jovens trabalhadores.

O documento revelará ainda que o Facebook pode identificar não só sentimentos, mas também entender como as emoções são comunicadas em diferentes alturas da semana.

As informações disponíveis aos anunciantes incluem o status de relacionamento de um jovem, a localização, o número de amigos no Facebook e a frequência com que acedem à plataforma, revela o jornal. Outros momentos na vida dos jovens que o Facebook procurará para vender anúncios estão associados com "boa aparência e confiança do corpo" e "exercitar e perder peso".

Informações detalhadas sobre mudanças de humor entre os jovens são "baseadas em dados internos do Facebook", afirma, alegadamente, o documento, "compartilháveis apenas com acordo de não divulgação" e "não estão disponíveis publicamente", diz o The Australian.

Uma prática que gerará dúvidas face à legislação sobre publicidade na Austrália. Este código define uma criança como uma pessoa de 14 anos ou mais nova e refere, diz o Australian, que uma criança deve obter uma autorização expressa dum progenitor ou guardião antes de se envolver numa atividade que resulte na recolha ou revelação de informação pessoal. Informação que é descrita como aquela que identifique ou possa identificar a criança.

Em resposta ao jornal, o Facebook terá avançado com um pedido de desculpas garantido que tinha iniciado uma investigação, admitindo que esta era uma prática inapropriada. “Abrimos uma investigação para compreender esta falha no processo e melhorarmos a supervisão”, revela o The Australian, citando um porta-voz do Facebook.

Nesta declaração ao Australian, o Facebook refere ainda que “os dados desta pesquisa foram reunidos e apresentados em conformidade com as regras aplicáveis de privacidade e proteção legal, incluindo a remoção de qualquer informação que possa identificar uma pessoa”, realçando que os processos internos têm um standard mais elevado do que o exigido por lei.

“O Facebook apenas permite estudos que cumpram um rigoroso processo de revisão quando estão envolvidos quaisquer dados sensíveis, particularmente dados que envolvam jovens ou o seu comportamento emocional”, acrescentado, segundo o jornal, que “esta pesquisa não parece ter seguido este processo”.

A notícia foi revelada durante o fim de semana. Já esta segunda-feira, o Facebook terá emitido uma outra declaração que não faz qualquer menção a um pedido de desculpa ou eventual averiguação disciplinar.

De acordo com o The Guardian, a rede social descreve o artigo do The Australian como “enganoso”, alegando que a companhia não “oferece ferramentas para segmentar pessoas baseadas no seu estado emocional”. O Facebook advoga que os documentos em causa foram baseados numa “pesquisa feita pelo Facebook e posteriormente partilhadas com um anunciante” e “tinha como objetivo ajudar marketeers a entender como as pessoas se exprimiam”.

O Facebook declinou descartar se pesquisas similares sobre a vulnerabilidade emocional de adolescentes foram conduzidas para propagandas em mercados fora da Austrália.
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