Justiça da África do Sul ditou "fim do fim dos recursos" contra extradição de Chang - jurista

por Lusa

O jurista sul-africano André Thomashausen considerou à Lusa que o Tribunal Constitucional ditou hoje "o fim do fim dos recursos" de Moçambique contra a extradição do seu ex-ministro das Finanças Manuel Chang para os Estados Unidos da América (EUA).

"É o fim de um processo judicial muito extenso que se arrasta há bem mais de quatro anos de recursos contra uma extradição de Manuel Chang", avançou o jurista e académico jubilado da Universidade da África do Sul, especialista em Direito Internacional e Comparado.

O Tribunal Constitucional sul-africano rejeitou hoje por unanimidade uma tentativa de Maputo para evitar que o seu ex-ministro das Finanças de Moçambique Manuel Chang, detido na África do Sul desde 2018 a pedido dos EUA, seja extraditado para ser julgado por fraude e corrupção no chamado processo das dívidas ocultas de 2,7 mil milhões de dólares (2,5 mil milhões de euros) secretamente contraídas no vizinho país lusófono.

Nesse sentido, o coletivo de 10 juízes sul-africanos indeferiu pela segunda vez em 12 meses as tentativas de Maputo para recorrer de uma decisão do Tribunal Superior de Gauteng, em Joanesburgo, em novembro de 2021, em que a juíza Margaret Victor, anulou a decisão do ministro da Justiça, Ronald Lamola, de extraditar Chang para Moçambique.

"O Sr. Manuel Chang deve ser entregue e extraditado para os Estados Unidos da América para ser julgado pelos seus supostos crimes, nos Estados Unidos da América, tal como está contido no pedido de extradição de 28 janeiro de 2019", concluiu a juíza sul-africana, na sentença a que a Lusa teve acesso.

Em 07 de junho do ano passado, o Tribunal Constitucional da África do Sul já tinha rejeitado um pedido de Maputo para recorrer da extradição de Chang para os EUA.

"A PGR [Procuradoria-Geral da República] de Moçambique é a parte responsável por estes atrasos, tendo utilizado todos os recursos imagináveis", considerou Thomashausen, em declarações à Lusa, sublinhando que "apresentou esta [nova] petição ao Tribunal Constitucional fora do prazo previsto pela lei, mas o Tribunal Constitucional perdoou esse lapso".

"Fê-lo para decidir que mais nenhum recurso pode ser admitido porque não existe nem a mínima base para que um tal recurso possa suceder", explicou.

Na ótica de André Thomashausen, "acabaram assim os dispendiosos abusos do processo judicial em que a PGR de Moçambique tem insistido e que já custaram aos contribuintes moçambicanos mais de três milhões de dólares em despesas de advogados".

"Para Manuel Chang, a decisão vem a tempo para poder escapar a mais um Inverno no sistema prisional sul-africano. A África do Sul está com cortes de energia diários de 10 em cada 24 horas e por conseguinte as prisões durante este Inverno vão funcionar sem meios de aquecimento", concluiu o André Thomashausen.

O Ministério da Justiça e Serviços Correcionais sul-africano, contactado pela Lusa, não reagiu até ao momento à decisão do tribunal.

Aos 63 anos, Manuel Chang foi detido em 29 de dezembro de 2018 no Aeroporto Internacional O.R. Tambo, em Joanesburgo, a caminho do Dubai, com base num mandado de captura internacional emitido pelos EUA em 27 de dezembro, pelo seu presumível envolvimento no chamado processo das dívidas ocultas.

Os empréstimos foram secretamente avalizados pelo Governo da Frelimo, liderado pelo Presidente da República à época, Armando Guebuza, sem o conhecimento do parlamento e do Tribunal Administrativo.

Chang, que foi ministro das Finanças de Moçambique durante a governação de Armando Guebuza, entre 2005 e 2010, terá avalizado as dívidas secretamente contraídas a favor da Ematum, da Proindicus e da MAM, empresas públicas referidas na acusação norte-americana, alegadamente criadas para o efeito nos setores da segurança marítima e pescas, entre 2013 e 2014.

A mobilização dos empréstimos foi organizada pelos bancos Credit Suisse e VTB da Rússia.

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