Madrid em desacordo com Governo por estar excluída da fase de desconfinamento

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
Susana Vera - Reuters

Na próxima segunda-feira, 70 por cento do território espanhol entra na fase 1 de desconfinamento, mas Madrid está excluída e permanece na fase 0, juntamente com Barcelona. O Governo regional não está de acordo com os motivos pelos quais foi excluído, gerando-se protestos em algumas zonas da cidade. Madrid garante que foram reforçadas algumas medidas na região, mas os profissionais de saúde negam.

A passada segunda-feira marcou o início da fase de desconfinamento por toda a Europa, com a reabertura de alguns estabelecimentos e regresso às aulas em certos países. Na vizinha Espanha – o país europeu com mais casos de infeção por Covid-19 – milhões de espanhóis puderam reencontrar-se com a família e amigos e reunir-se em esplanadas, restaurantes e espaços ao ar livre, embora com limitação do número de pessoas.

No entanto, Madrid e Barcelona – as cidades mais atingidas pela pandemia – ficaram de fora deste relaxamento de medidas e permaneceram em isolamento. Os habitantes destas cidades continuaram sob o dever de permanecer em casa e sair apenas às horas definidas por lei.

Na próxima segunda-feira, o país entra numa nova fase, mas Madrid continua excluída. O Ministério da Saúde espanhol recusou o pedido do governo regional de Madrid e a capital, juntamente com Barcelona, não faz parte dos 70 por cento do território espanhol que entra na fase 1 de desconfinamento. As duas cidades continuam na fase 0, apesar de com menos restrições. Haverá a reabertura de alguma atividade comercial e museus com hora marcada e lotação limitada, mas as esplanadas continuam encerradas e as reuniões familiares proibidas. Espanha registou este sábado 102 mortes, o número mais baixo desde que foi decretado estado de emergência.

Para que uma comunidade possa avançar de fase, o Governo espanhol estabeleceu um conjunto de requisitos que é necessário cumprir para o efeito.

No caso de Madrid, foi cumprida uma das condições que diz respeito às capacidades do sistema de saúde, nomeadamente à capacidade de internamento nos cuidados intensivos. Neste ponto, a capital espanhola registou “um progresso significativo”, como destacou o diretor do Centro de Controlo de Alertas e Emergências Sanitárias, Fernando Simón.

Porém, Madrid não conseguiu responder ao requisito que lhe foi exigido na semana passado, o único que o Ministério da Saúde exigia para que a capital recebesse luz verde e avançasse para a fase 1 de desconfinamento: o desenvolvimento do plano para detetar e acompanhar possíveis casos de infeção por Covid-19 e seus respetivos contactos.

“Toda a força que foi colocada na capacidade de assistência nos hospitais, deve ser transferida para os serviços de atenção primária e saúde pública e isso não se faz em poucos dias, é necessário fornecer tempo suficiente para que se estabeleça”, justificou Simón.

Para além disso, o diretor do Centro de Controlo de Alertas e Emergências Sanitárias sublinhou que “é preciso ter em consideração onde a comunidade começou. Teve um início da pandemia explosivo e, embora a evolução esteja mais favorável, é uma das que ainda regista mais casos todos os dias”.

A capital espanhola é a região mais atingida pela pandemia em Espanha, com mais de 66 mil infetados e cerca de 14 mil mortos. Apesar de o número ser cada vez menor, esta quinta-feira, Madrid foi a segunda região com maior número de mortes (30).
Madrid confirma esforços, especialistas negam

O plano de deteção e acompanhamento de novos casos de infeção por Covid-19 existe, de facto, mas há ainda muitas dúvidas associadas.

Esse protocolo que estabelece os procedimentos para a catalogação de casos suspeitos, positivos confirmados e respetivos contactos próximos chegou aos centros de saúde na noite do passado domingo, mas na sexta-feira ainda não tinham sido equipados com recursos suficientes nem recebido instruções precisas para o colocar em prática.

O governo regional garante que reforçou a contratação de profissionais para permitir a aplicação do plano, mas os profissionais de saúde negam. Madrid assegurou que “colocou em marcha a extensão dos contratos de atenção primária e Summa”. Porém, os profissionais do Summa 112 (o serviço de emergências de Madrid) explicam a El País que apenas tiveram dois períodos de contratação e que não foram suficientes para compensar as baixas de mais de 500 profissionais de saúde que se encontram infetados ou em isolamento.

Antonio Cabrera, médico de família do centro de saúde de Daroca, afirma que os “reforços humanos” não chegaram a “quase nenhum” centro. Em relação aos testes PCR (que investigam o material genético do próprio vírus), o Governo regional assegura que estão a realizar-se 11 mil por dia e podem chegar a 15 mil, mas Cabrera diz que “chegaram aos centros, mas não parece que sejam em número suficiente para as previsões”.

Por estas razões, os especialistas em Saúde Pública do Ministério da Saúde justificam a razão pela qual Madrid não passou para a fase seguinte de desconfinamento, por entenderem que faltam “mais uns dias” para que o protocolo esteja bem assente.
Madrid em protesto

Os residentes e políticos da capital espanhola não receberam de bom grado a notícia de que permaneceriam na fase zero de desconfinamento e têm vindo a contestar a decisão do executivo espanhol.

A presidente da comunidade de Madrid e membro do Partido Popular Conservador (PP), Isabel Díaz Ayuso, criticou a decisão do Ministério da Saúde e acusou o Governo de estar a “aproveitar a maior crise da história recente da Espanha para impor uma única autoridade ditatorial”.

As palavras de Díaz Ayuso foram partilhadas entre a população do bairro de Salamanca, em Madrid, que saiu à rua e gritou por “liberdade”.

Os protestos levantaram preocupações na propagação da Covid-19 naquela região. O Governo defendeu o direito ao protesto, mas pediu que as pessoas se comportassem com responsabilidade. “Todas as pessoas têm sempre o direito de protestar e até, mesmo que por pouco tempo, fazer muito barulho”, disse o ministro espanhol da Ciência, Pedro Duque. “Mas a única coisa pela qual precisamos de ter cuidado é o facto de estarmos numa situação de pandemia e por isso, se estiverem em protesto, precisam de manter a distância e evitar a infeção”, acrescentou Duque.

Em Barcelona, onde também se mantém a fase 0 de desconfinamento pelo menos até 25 de maio, os ânimos parecem estar mais calmos. Na região da Catalunha, algumas áreas rurais receberam luz verde para avançar para a fase um, mas as autoridades de saúde consideraram que é ainda muito prematuro e arriscado o levantamento de muitas das medidas de restrição em vigor na capital.

Alba Vergés, a ministra da Saúde da Catalunha, disse que apesar de a taxa de infeção estar a diminuir em toda a região, está preocupada com as áreas mais povoadas que não dispõem de recursos para acompanhar novos casos de infeção e monitorizar os contactos. A taxa de mortalidade é muito elevada na Catalunha. Do total de mortes por Covid-19 em Espanha na sexta-feira, 42 por cento ocorreram nesta região. Apesar disso, diminui em relação aos 60 por cento na quinta-feira.

Por esta razão, Vergés propôs o que chamou de “fase 0.5”, o que significa o alívio de algumas medidas de restrição na Catalunha. Lojas, bibliotecas e mercados ao ar livre estão agora autorizados a abrir, apesar de ser imposta uma capacidade limite. Os bares, restaurantes, esplanadas permanecem fechados.
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