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"Mãos sujas de sangue". Ativistas europeus exigem abolição da agência Frontex

por Inês Moreira Santos - RTP
Reuters

Ativistas, capitães de navios de resgate e cerca de 80 organizações de direitos humanos de todo o mundo lançaram, este mês, uma campanha internacional a exigir à União Europeia que seja abolida a agência de controlo e assistência nas fronteiras europeias, a Frontex. A organização "Abolish Frontex" acusa a UE de ter "sangue nas mãos" e tem planeadas várias ações de protesto em toda a Europa.

"Mais de 740 pessoas já morreram este ano ao tentarem atravessar o Mediterrâneo, à procura de um lugar seguro", começam por dizer os ativistas, numa carta enviada à Comissão Europeia, ao Parlamento Europeu e ao Conselho da UE.

"O regime fronteiriço da UE forçou-as a tomarem perigosas rotas migratórias, muitas vezes em embarcações não navegáveis; alistou países vizinhos para as deter no seu caminho; enfrentou-as com violência e empurrões; ou recusou-se a salvá-las - abandonando-as para se afogarem no mar", continua o documento.

Lançada a 9 de junho, a "Abolish Frontex", uma campanha organizada por dezenas de ativstas e ONG's que lutam contra as políticas fronteiriças da UE, reivindica o fim do financiamento do sistema de controlo e assistência fronteiriço da UE e da prória agência Frontex. Na carta enviada aos principais orgãos executivos e consultivos europeus, os ativistas destacam as "práticas ilegais e desumanas" da agência de fronteiras da UE, acusando ainda a Frontex de ter promovido e usado violência contra os migrantes.

"São vidas perdidas devido à obsessão da União Europeia em reforçar as fronteiras em vez de proteger as pessoas. A que custo? As políticas da Fortaleza Europa já mataram mais de 40.555 pessoas desde 1993".

A Frontex, com sede em Varsóvia, foi criada em 2004 para lutar contra a imigração ilegal e o crime transfronteiriço. Desde então, tem crescido e alargado as suas ações, tendo duplicado também a sua fatia no orçamento europeu.



Organizada por entidades como a Sea-Watch, Mediterranea Saving Humans, Iuventa10, Baobab Experience e Alarm Phone, a campanha para abolir a Frontex acusa os sistemas de controlo fronteiriço europeu de abandonarem e não assistirem as pessoas que tentam entrar na Europa à procura de uma vida melhor.

"Deixadas a morrer no Mediterrâneo, no Atlântico e no deserto, baleadas nas fronteiras, mortas por suicídio em centros de detenção, torturadas e mortas após serem deportadas", acusam.

"A UE tem as mãos sujas de sangue".
No centro desta violência, alerta a campanha, está a a Agência Europeia de Fronteiras e Guarda Costeira Frontex (a força policial fronteiriça da UE), que "garantiu agora um orçamento de 5,6 mil milhões de euros até 2027 e, até então, terá o seu próprio exército de 10.000 guardas de fronteira armados". Além disso, terá também "mais poderes do que nunca para coordenar as deportações à escala da UE inteira".

Segundo os ativistas, a Frontex tem sido "uma promotora ávida e uma executora fundamental das políticas violentas da Europa contra pessoas em movimento". E, de acordo com os organizadores da campanha, já "extensas provas expuseram a forma como a força fronteiriça da UE está, repetidamente, envolvida em recuos ilegais e violações dos direitos humanos".

"Actualmente, activistas e organizações de dentro e fora da UE estão a juntar-se a uma única exigência: abolir a Frontex e o sistema que esta encabeça". UE impede pessoas de chegarem a "solo europeu"

No início deste mês, o Tribunal de Contas da União Europea emitiu um relatório no qual expressava sérias dúvidas quanto à capacidade da agência Frontex de cumprir a missão de salvaguardar as fronteiras da UE.

As fronteiras militarizadas da UE, de acordo com a "Abolish Frontex", são sustentadas "por uma vigilância intensa e invasiva e ligadas por bases de dados cheias de informação pessoal - biométrica".

"Para impedir as pessoas de chegarem sequer ao solo europeu, os países terceiros são colocados sob forte pressão para atuarem como guardas de fronteira de postos avançados", esclarece a organização.

Em maio passado, vários ativistas levaram a agência ao Tribunal de Justiça da UE pelo alegado envolvimento na expulsão de refugiados da Grécia através do Mar Egeu para a Turquia. Já em janeiro, tinha sido promovida uma investigação anti-fraude da UE devido a acusações de assédio, má conduta e operações ilegais com o objetivo de impedir que requerentes de asilo chegueassem às costas europeias.

As organizações que lutam pelos direitos humanos acusam as políticas europeias de serem "construídas sobre uma narrativa que enquadra a migração como um problema de segurança, representando as pessoas desesperadas em movimento como uma ameaça".

"Estas políticas não protegem vidas. Colocam-nas em perigo. Elas alimentam a ascensão da extrema direita em toda a Europa, reforçam o racismo, e assentam em séculos de colonialismo, opressão e exploração", argumenta a "Abolish Frontex", acrescentando que a União Europeia "continua a contribuir para as causas profundas da migração - das exportações de armas à extracção de recursos e à sua responsabilidade na crise climática".
"A fortaleza Europa enche-nos de vergonha, suprime os direitos e impede a justiça", declaram.

A campanha para abolir a Frontex foi lançada na mesma altura em que foram anunciados os planos de expansão da agência. O orçamento cresceu mais de 7.500 por cento desde 2005 e os novos recursos vão permitir a compra de equipamentos como navios, helicópteros e drones.

"Não queremos ver mais vidas perdidas no mar ou no deserto; vidas desperdiçadas em detenções ou em campos desumanos de pessoas refugiadas. Opomo-nos a um mundo cada vez mais dividido por fronteiras fortificadas para proteger a riqueza dos ricos do desespero e da justa cólera das pessoas pobres e oprimidas", escreveram os ativistas.

A União Europeia, recorde-se, construiu já mais de mil quilómetros de muros e cercas nas fronteiras.

"A Frontex não pode ser reformada. Tem de ser abolida", exigem. "Não há desculpas, investigações ou procedimentos de reforma sem convicção que alguma vez devam justificar a existência da Frontex".

"Exigimos que as estruturas e políticas que causam violência e morte sejam desmanteladas. Em vez disso, temos de construir um sistema que garanta justiça e segurança para todos. Exigimos a abolição da Frontex e o fim do regime de fronteiras da UE que ela representa".

Além de fazer campanha pela abolição total da Frontex, os organizadores também apelam ao fim das deportações, da militarização das fronteiras da Europa, da vigilância e detenção de migrantes e refugiados, da criminalização dos esforços de solidariedade, da exportação de armas e apoio a regimes repressivos e para a regularização de migrantes, a libertação de navios de resgate de ONGs e livre circulação para todos.
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