É o caso de Natalie DiCenzo, ginecologista e membro da associação de saúde Physicians for Reproductive Health, que conta à agência France Presse que médicos e cientistas vivem "uma situação sem precedentes" desde a reeleição do presidente Donald Trump e relatam episódios de falta de acesso a dados epidemiológicos e de desconsideração de recomendações médicas.
"O que mais me intrigou foi a retirada das diretrizes sobre as infeções sexualmente transmissíveis", conta Natalie DiCenzo. "Não vejo o que há de radicalmente de esquerda no tratamento da gonorreia".
Na parte superior da página dos
Centros de Controlo e Prevenção de Doenças (CDC), uma notificação indica que algumas páginas estão indisponíveis porque estão
"a ser modificadas para cumprir as ordens executivas do presidente Trump", nomedamente as que dizem respeito às políticas de diversidade.
Jennifer Nuzzo, professora de epidemiologia na Universidade de Brown, escreveu na rede social X "espero que se trate apenas de uma pausa temporária. As doenças
infecciosas não fazem pausas. Os contribuintes americanos que pagaram
por estes dados merecem ter acesso às informações que salvam vidas
derivadas destes dados".
Nuzzo denuncia que "o congelamento das comunicações impediu os CDC de manter as autoridades sanitárias locais informadas sobre questões como a gripe das aves, que já matou uma pessoa nos EUA" e que está a circular amplamente entre as aves e gado no país.
Além da cessação das comunicações importantes, Nuzzo aponta a falta de transparência sobre as informações que foram removidas ou alteradas como uma das principais preocupações e teme que tenham sido efetuadas "não por cientistas, mas por políticas" e que "minem as políticas de saúde pública".
A especialista acrescenta que o mesmo acontece com "uma das maiores epidemias de tuberculose da história moderna do país", atualmente registada no Kansas. E explica que desde a tomada de posse de Donald Trump, a 20 de janeiro, que a publicação dos documentos de referência publicados semanalmente há mais de 60 anos, foi interrompida.
Rebecca Christofferson, investigadora da Universidade do Estado do Louisiana, questiona a veracidade dos dados fornecidos pela CDC. "Pergunto-me se poderemos confiar nos dados ou se, por uma razão ou por outra, serão ocultados elementos".
Para Natalie DiCenzo "nesta fase, não podemos contar com estas instituições para nos salvar. Penso que os investigadores e os profissionais de saúde devem inspirar-se coletivamente nos ativistas", lembrando o trabalho realizado pelas organizações de defesa do aborto e LGBT+ na preservação da informação que possa ser eliminada e alterada.
"Somos inteligentes na comunidade científica e académica e encontraremos outras formas de fazer circular a informação, se necessário", garante DiCenzo.
c/ AFP