Merkel e Schulz: lógica da coligação prevalece sobre lógica da campanha

por RTP
Fabrizio Bensch, Reuters

A chanceler democrata-cristã Angela Merkel só podia sair beneficiada num debate morno, que estava anunciado como o grande confronto da campanha eleitoral. E assim foi. O debate televisivo de ontem serviu para perceber porque estão a CDU e o SPD juntos no Governo, mas não para esclarecer o que justificaria o voto em cada um deles.

Os momentos mais intensos do debate centraram-se na política de refugiados, nas relações com a Turquia e na eventualidade de mais uma elevação da idade da reforma, desta feita para os 70 anos.

Em relação à política de refugiados, o candidato social-democrata criticou a chanceler com o argumento de não ter sabido envolver os restantes países europeus numa solução comum. Schulz evitou assim confundir-se com a crítica da extrema-direita, que acusa Merkel de ter prosseguido uma política de portas abertas e de acolhimentos indiscriminados, mas não quis deixar de atacar a chanceler num ponto que é habitualmente considerado o seu calcanhar de Aquiles.

Relativamente às acidentadas relações com a Turquia, Schulz prometeu que, em caso de ser eleito, tomaria uma posição clara a favor da interrupção das negociações com vista à integração da Turquia na União Europeia.

A crítica aponta mais à execução prática do que à definição programática dos democratas-cristãos, também eles favoráveis, em teoria, a uma interrupção de negociações com um Governo cada vez mais acusado de violações de direitos humanos e de princípios democráticos. Em todo o caso, Merkel tinha também neste tema a resposta óbvia de que toda a política da coligação, e em especial a sua política externa (sempre sob a condução de ministros social-democratas), é de responsabilidade partilhada com o SPD.

No que diz respeito à elevação da idade de reforma, reclamada por várias vozes na área democrata-cristã, Schulz supôs que poderia colocar a chanceler em dificuldades, ao exigir-lhe que se pronunciasse sobre o cenário de uma elevação dessa idade para os 70 - inaceitável, como ele próprio teve o cuidado de sublinhar.

Merkel surpreendeu-o, contudo, demarcando-se claramente dessas vozes correligionárias. Schulz teve de limitar-se a felicitar a chanceler pelo que classificou como uma adesão à posição social-democrata neste ponto.

Decepção perante um debate "sem arestas"
O chefe de redacção do rp-online.de, Michael Bröcker, não se escandaliza com a uniformidade cinzenta do debate, antes encontra nela uma garantia de que "a Alemanha tem dois democratas com uma orientação racional a candidatarem-se à chefia do Governo". E acrescenta: "À vista dos populistas e autocratas que governam noutros países, isto não é o pior que pode acontecer".

No Münchner Merkur, o chefe de redacção Georg Anastasiadis comenta que, depois de se ter insinuado a existência de diferenças políticas realmente interessantes, o debate decepcionou porque, entre a chanceler e o candidato a chanceler, era preciso procurar essas diferenças "com uma lupa". E manifesta sérias dúvidas de que um "empate honroso" no debate baste ao candidato para recuperar na recta final o atraso que tem nas sondagens.

No site do diário conservador Süddeutsche Zeitung, o editor de política interna Heribert Prantl, considerava Schulz "um orador muito melhor do que Merkel, mas menos bem sucedido no debate, nomeadamente por ter sido mais interrompido pelos moderadores do que a sua adversária.

No site do igualmente conservador Frankfurter Allgemeine Zeitung, o jornalista Oliver Georgi não poupou os dois candidatos ao reparo de que "o duelo televisivo mais pareceu uma cimeira da coligação entre parceiros de Governo do que uma viva troca de argumentos".

Também no site do diário Die Welt o chefe de redacção Ulf Poschardt considera o debate como "uma oportunidade perdida", devido ao "puré de palavras, sem arestas nem grande emoção". E considera que no balanço final Merkel "ganhou este duelo extremamente baço", ao passo que Schulz perdeu, "depois de um começo bastante forte, porque não manteve o mesmo nível intelectual".
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