Morreu o antigo presidente sul-africano Pieter W. Botha

por António Pina, Agência LUSA

O antigo presidente da África do Sul Pieter W. Botha (1978-1982) morreu terça-feira na sua residência do Cabo ocidental (sudoeste) aos 90 anos, anunciou a agência de imprensa sul-africana SAPA.

Pieter Botha morreu enquanto dormia pouco depois das 20:00 (18:00 em Lisboa) na sua residência situada perto da cidade de Wildernes, indicou à agência sul -africana um membro da sua segurança.

"Botha morreu em casa, em paz", declarou Frikkie Lucas.

Botha dirigiu a África do Sul de 1978 a 1989 durante os anos mais duros de repressão do regime do apartheid, num cenário de isolamento internacional.

Era conhecido como "Groot Krokodil (o "Grande crocodilo" em afrikaans) devido às suas posições intransigentes.

Em 1989, os seus problemas cardíacos levaram-no a passar o testemunho a Frederik De Klerk que abriu o país a uma era de transição que culminaria, em 1994, na organização das primeiras eleições multiraciais da África do Sul.

Pieter Willem Botha, o homem que não pedia perdão

O antigo presidente sul-africano, Pieter Willem Botha, ficará na História por ter liderado o "apartheid" no seu período mais brutal, mas também por recusar pedir perdão pelas atrocidades do regime.

Teimoso, provocador e orgulhoso, PW Botha, como era conhecido, disse numa entrevista em finais dos anos 90 depois de ser intimado a comparecer na Comissão da Verdade e Reconciliação: "Nunca pedirei amnistia. Nem agora, nem amanhã, nem depois de amanhã"!

Estas palavras foram a imagem de marca de Botha ao longo da sua vida de político. Entre 1978 e 1989 foi a primeira figura do regime minoritário branco na África do Sul, período durante o qual o Estado perpetrou algumas das maiores violações dos direitos humanos que despertaram o mundo para a necessidade de sanções económicas a um regime que recusava mudar.

Na sequência de um escândalo que forçou o então primeiro-ministro John Vorster a demitir-se, em 1978, PW Botha assumiu o cargo, depois de ter servido no parlamento pelo pequeno círculo eleitoral de George (na província do Cabo Ocidental) desde 1948, na primeira entrada de rompante do Partido Nacional no poder, que ditou também o início do regime de segregação racial.

O seu estilo de governação, que ficou conhecido por "Kragdadigheid", caracterizou-se pela surdez perante os protestos mundiais contra a repressão de todos os que não fossem brancos, a separação das áreas residenciais e do sistema educativo consoante as origens étnicas dos cidadãos e o símbolo supremo da segregação que viria a ser o sistema de passes.

A Comissão da Verdade e Reconciliação, constituída em 1994 para investigar os crimes do regime que ficou conhecido como "apartheid", tentou em vão levar Botha às audiências para ouvir a sua versão dos acontecimentos, muitos deles resultantes na tortura e morte de opositores e actos de terror contra instituições e organizações, como o Conselho Sul-Africano das Igrejas, que o regime suspeitava ser um "ninho da oposição".

Apesar de ter acumulado provas evidentes de que muitos dos atentados e assassínios partiram de PW Botha, a Comissão foi sempre impotente para o condenar nos tribunais comuns, apesar de ter poderes para pedir aos tribunais que julgassem aqueles que voluntariamente não confessassem os seus crimes.

Em várias ocasiões Pieter Willem Botha e o seu regime "piscaram o olho" à comunidade portuguesa no país, que considerava aliada natural dos afrikaners na manutenção do regime racista.

A partir dos anos 60, e com particular incidência a partir de 1974, depois da revolução de Abril que resultou na descolonização portuguesa, foram muitos os elementos da comunidade portuguesa que caíram na tentação de se aproximar do Partido Nacional e do regime de Botha.

O regime tinha conquistado muitas simpatias ao acolher muitos daqueles que foram forçados a abandonar Angola e Moçambique, deixando para trás tudo o que possuíam, em muitos casos atravessando as fronteiras em fuga apenas com a roupa que tinham no corpo.

Em meados da década de 80, antes de ter sido forçado a passar o poder ao "reformador" Frederik Wilem de Klerk, PW Botha, que na altura não podia pisar solo da grande maioria dos países democráticos da Europa e do mundo, visitou oficialmente a ilha da Madeira a convite de Alberto João Jardim, para desespero do governo central, que na altura tudo tentou para evitar o embaraço de acolher Botha (e o seu ministro dos estrangeiros "Pik" Botha) em solo português.

Jardim ainda hoje defende a decisão de ter acolhido Botha na Madeira, com o argumento de que acima de tudo teve em conta os altos interesses da comunidade portuguesa na África do Sul, maioritariamente madeirense.

O "Groot Krokodil" (ou em português o "grande crocodilo"), título que lhe foi imposto por vários críticos por força da sua teimosia e obstinação, Pieter Willem Botha parece ter dado um sinal, há poucas semanas, de que o seu fim se aproximava.

Depois de uma vida longa e praticamente isenta de doenças, Botha tinha sido hospitalizado com uma indisposição, mas os testes realizados nada revelaram .

Parece que a idade o traiu e morreu esta noite com as convicções intactas.
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